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31 DE DEZEMBRO DE 2024

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Sucede, porém, que o programa cheque-livro exclui da sua lista de beneficiários os jovens imigrantes

residentes em Portugal que não possuam Cartão de Cidadão. Esta exigência afeta diretamente, entre outros,

jovens adultos que frequentam o ensino português, residem em Portugal e têm a sua situação regularizada, ou

seja, estão plenamente integrados na sociedade portuguesa, mas não são titulares do documento exigido.

O artigo 5.º da Portaria n.º 112-B/2024/1, de 21 de março, que aprova o Regulamento do Programa

Cheque-Livro, estabelece que apenas «as pessoas singulares, residentes em território nacional, detentoras de

Cartão de Cidadão e que completem 18 anos no ano civil definido no despacho referido no n.º 6 do artigo

anterior» possam beneficiar do programa. Ou seja, a exigência do Cartão de Cidadão como condição para o

acesso ao cheque-livro constitui uma barreira para os jovens imigrantes, uma vez que muitos destes não têm

este documento, mesmo tendo a sua situação regularizada em Portugal.

O Subdiretor-Geral da Direção-Geral do Livro, dos Arquivos e das Bibliotecas, em declarações ao Diário de

Notícias, justificou a exigência do Cartão de Cidadão com a necessidade de garantir um processo

automatizado, seguro e centralizado para a validação da elegibilidade dos beneficiários, tendo sido entendido

que o único mecanismo que permitia assegurar esse cumprimento era a utilização do Cartão de Cidadão ou

da chave móvel digital. São invocados os objetivos de facilitar o processo de inscrição e de evitar fraudes ou

erros na distribuição dos cheques. No entanto, esta explicação parece ignorar a realidade de um vasto número

de jovens que, por razões diversas, não têm o Cartão de Cidadão, mas que, ainda assim, são residentes em

Portugal e têm pleno direito a beneficiar das políticas públicas, incluindo as que visam promover a literacia e o

acesso à cultura.

É importante sublinhar que a exigência do Cartão de Cidadão não é, como algumas autoridades alegaram,

uma questão puramente técnica ou operacional. A inclusão do Cartão de Cidadão como requisito para a

elegibilidade no programa já se encontrava prevista na própria portaria que regulamenta o cheque-livro,

sugerindo que, na verdade, esta exigência constitui uma decisão política e não uma questão de viabilidade

técnica. Ou seja, foi uma escolha política que, por um lado, facilita o processo de validação automática de uma

parte dos jovens, mas, por outro, acaba por deixar de fora outros jovens residentes em Portugal, apenas por

serem imigrantes.

É também relevante destacar que em outros programas governamentais, como o cheque-dentista ou o

cheque-psicólogo, não existe a exigência do Cartão de Cidadão para a sua utilização, o que levanta questões

legítimas sobre a real necessidade desta exigência no programa cheque-livro. se outros mecanismos de

validação de elegibilidade podem ser adotados em programas semelhantes, sem recorrer ao Cartão de

Cidadão, parece difícil justificar a escolha de impor este requisito específico para um programa cuja missão é,

precisamente, fomentar a inclusão social e a igualdade de oportunidades no acesso à educação e à cultura.

Ademais, não podemos ignorar que esta exigência contraria o objetivo primordial do próprio programa, que

é incentivar os hábitos de leitura entre os jovens adultos, incluindo aqueles que pertencem a comunidades

imigrantes. O programa do cheque-livro deveria ser uma ferramenta de inclusão, acessível a todos os jovens

do escalão etário em questão, independentemente do seu estatuto de residência ou da sua origem nacional.

Excluir os jovens imigrantes do acesso a este benefício significa negar-lhes uma oportunidade de se

integrarem de forma mais plena na sociedade portuguesa, através da educação e da cultura, elementos

essenciais para a construção de uma cidadania ativa e responsável.

Por fim, há que sublinhar que esta exigência resulta numa flagrante violação da Constituição da República

Portuguesa, bem como de legislação internacional a que Portugal está vinculado. Com efeito, verifica-se,

desde logo, uma evidente violação do artigo 15.º da Constituição da República Portuguesa, que estabelece

que os estrangeiros residentes, salvo exceções previstas na própria Constituição ou em normas internacionais,

gozam dos mesmos direitos e estão sujeitos aos mesmos deveres dos portugueses. Ao excluir jovens que não

sejam portadores de Cartão do Cidadão do acesso ao cheque-livro, o Estado está objetivamente a excluir os

jovens imigrantes, o que além de inconstitucional, é inaceitável. Todos os jovens, sem discriminação, têm

direito à educação e à cultura.

Por entender que esta injustiça, uma vez identificada, deve ser corrigida, o Bloco de Esquerda apresenta o

presente projeto de resolução, assim assumindo aquilo que são responsabilidades coletivas do poder político e

do Estado.

Assim, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do Bloco

de Esquerda propõe que a Assembleia da República recomende ao Governo: