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II SÉRIE-B — NÚMERO 10
Outra tendência que parece desenhar-se é a possibilidade crescente de utilização do aparelho militar não só como instrumento autónomo de afirmação do Estado e garante
da sua integridade territorial, mas também como suporte de outros factores de afirmação no campo económico c
político, contribuindo para a salvaguarda dos interesses nacionais, onde eles sejam susceptíveis de ser afectados.
A reorganização estrutural e funcional das Forças Armadas não poderá por isso deixar de ler em conta toda esta evolução.
A existência de umas Forças Armadas modernas, convenientemente estruturadas e apetrechadas, ajustadas à dimensão e interesses do País, constituirá o suporte indispensável às opções estratégicas definidas em sede própria. Se, por um lado, elas constituirão um poderoso factor integrador da comunidade nacional, garante de estabilidade e segurança, e a mais evidente afirmação da individualidade e independência do Estado, por outro tenderão a assumir cada vez maior importância como instrumento de afirmação externa de Portugal, tanto no quadro das alianças colectivas de defesa como no contexto das relações bilaterais, onde a cooperação militar com os países africanos de língua oficial portuguesa assume especial relevo.
Mas não podemos esquecer a necessidade de assegurar a continuação de um crescimento económico compatível com as exigências que a plena integração na Comunidade Económica Europeia nos impõe. Dela dependem, em larga medida, a nossa capacidade de afirmação nacional e o grau de autonomia com que, no quadro das nossas interdependências, poderemos optar entre diferentes estratégias possíveis. E, se é um facto que a indispensável base económica da segurança e da independência é hoje bem mais sólida do que era há cinco anos atrás, importa reconhecer que o País tem recursos limitados, que há prioridades a respeitar e carências que ainda persistem na sociedade portuguesa, e que também não é possível modernizar um sistema de forças sem dispêndios avultados.
Significa isto que temos perante nós, poder político, chefias militares e militares em geral, uma tarefa árdua mas ao mesmo tempo motivadora, que desafia as nossas capacidades, mas que enfrentaremos em conjunto com determinação, com dignidade e com o sentido da subordinação permanente aos interesses da Comunidade. Teremos, em conjunto, de saber encontrar as soluções que melhor sirvam a prontidão e eficiência das Forças Armadas, prosseguindo a racionalização de meios já empreendida ao nível das infra-estruturas materiais, alargando-a aos recursos humanos e aos aspectos operacionais, organizativos e territoriais. Desta forma se obterão as poupanças necessárias para o financiamento de programas de investimento, materializados nas Leis de Programação Militar, que permitirão conciliar as necessidades de defesa com os recursos existentes e atingir níves de custo/eficácia mais consentâneos com os padrões de modernidade e eficiência que nos propomos obter.
Nesse sentido e durante o ano de 1991 foi já exercido um intenso esforço que se traduziu num conjunto de acções levadas a cabo pelo Ministério da Defesa Nacional e pelas Forças Armadas, grande parte do qual não poderia naturalmente ter produzido resultados visíveis a curto prazo. Se assim tivesse acontecido, não estaríamos na presença de medidas verdadeiramente estruturantes, mas antes a proceder a uma mera operação de cosmética, geradora de resultados tão espectaculares quanto efémeros.
Dessas acções gostaria de referir a aprovação da Lei de Bases da Organização das Forças Armadas e do Novo Sistema de Forças, incluindo aqui os estudos conducentes
à criação da Brigada Aerotransportada, a aprovação dc& Regulamentos das Academias Militar c da Força Aérea e
do Instituto de Defesa Nacional, a criação de cursos para oficiais da Guarda Nacional Republicana e da Guarda Fiscal na Academia Militar, o prosseguimento do planeamento necessário à implementação do novo conceito do serviço militar obrigatório e do serviço militar feminino, a continuação das medidas de racionalização das indústrias de defesa, o início da reestruturação dos estabelecimentos fabris das Forças Armadas e a continuação das acções de recquipamenio com a entrada ao serviço da Armada de duas fragatas da classe Vasco da Gama e de cinco lanchas rápidas da classe Argos estas inteiramente construídas em estaleiros nacionais, e a aquisição de mísseis antiaéreos Chaparral para o Exército.
No âmbito das relações externas de defesa, que vêm assumindo importância crescente no contexto da política de defesa nacional, e para além do normal cumprimento das obrigações decorrentes da nossa política de alianças, estamos a assegurar a estrutura do comando da Missão de Observadores da Comunidade Europeia na Jugoslávia, em que a presença de militares das nossas Forças Armadas assume posição de especial relevo, numa demonstração clara e inequívoca de eficácia e de capacidade de adaptação a novas situações. Trata-se de uma missão de extrema dificuldade e delicadeza, em que mais uma vez demonstramos a nossa solidariedade e a nossa adesão ao ideal europeu e cuja importância é evidenciada pela atenção e ansiedade com que a opinião pública internacional segue o seu desenrolar e aguarda os seus resultados. Deles poderá depender a capacidade de afirmação da Europa no concerto das nações, a paz no «Velho Continente», e a possibilidade de resolução dos conflitos através do diálogo político e da concertação.
Deles esperamos que resulte prestígio para a nossa diplomacia, para as Forças Armadas e para o País.
A cooperação técnico-militar com os países africanos de língua oficial portuguesa tem sido uma área que nos tem merecido uma atenção especial, por motivos de interesse nacional por de mais evidentes.
Nos últimos três anos triplicámos o orçamento que lhe é consignado, e a tendência é agora para a constituição de missões permanentes naqueles países, recorrendo, de comum acordo com os respectivos governos, a programas quadro de duração bienal, como forma de dar execução e coerência às acções definidas no quadro da política de cooperação aprovada e rentabilizar os meios disponíveis para tais acções.
Assim, e para além do sucesso obtido na mediação do processo de paz em Angola e que se traduz na presença de uma significativa missão militar portuguesa neste país, estão já em curso 27 projectos de cooperação nos PALOP, privilegiando o apoio à formação de quadros e à reorganização das Forças Armadas desses Estados.
Talvez nem todos tenham tomado ainda consciência de que hoje, em missões de paz, humanitárias ou de cooperação, cerca de 100 militares portugueses se encontram em África ou na Europa, projectando o nome do País e reforçando o prestigio internacional de Portugal.
O mundo vive uma nova era, em que a afirmação dos Estados passa muito pelo papel que possam desempenhar na gestão internacional das crises e nas tarefas da cooperação, e as Forças Armadas Portuguesas estão já nessa