O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

22 DE DEZEMBRO DE 1994

51

a audiência conjunta do Dr. Miguel Beleza e do Dr. Braga de Macedo, dada a desconexão de algumas afirmações por ambos proferidas — foi com certeza a da surpresa manifestada pelo Dr. Braga de Macedo quando nessa mesma reunião com o Sr. Mario Conde, um representante da Banca Morgan e o Dr. José Roquette, sem a presença do Dr. Elias da Costa, o então Ministro das Finanças se deparou com a situação por si qualificada como «paradoxa», de verificar que os interesses espanhóis se manifestavam com uma desenvoltura decisória superior aos da sua posição accionista.

Tudo isto comprova a miopia política e a inocência conceptual com que o Dr. Braga de Macedo acompanhava o assunto, sendo ainda sintomático que após o impacte a que a verdade dos factos o forçou pouco ou nada fez para accionar os mecanismos de segurança. De facto, nenhum dos depoentes, nem ò então Secretário de Estado das Finanças, nem o governador do Banco de Portugal ao tempo, nem o presidente da CMVM, nem o presidente da Comissão de Acompanhamento das Reprivatizações, nem o presidente da comissão executiva do BTA encontraram indícios de uma diferenciada atitude do Ministro das Finanças, que se refugiou sempre na comodidade da sua auto-classificação de «supervisor da entidade supervisora».

Aliás, a proposta de relatório esquece igualmente o atribulado comportamento do então Secretário de Estado das Finanças, Dr. Elias Costa, que ora nos aparece, no conjunto dos depoimentos, como um entusiasta do esquema concebido e defendido pelo Dr. José Roquette, como nos surge timorato, mas sem nunca assumir a postura de Estado e a frontalidade exigidas face à acumulação de indícios preocupantes. É certo que, já após saber que ia ser afastado do Governo, assinou um despacho de topo de página sugerindo ao sucessor que se remetesse o processo para a Procuradoria-Geral da República a fim de o Ministério Público actuar nos termos da lei.

Poder-se-ia dizer, assim, mais vale tarde do que nunca, se não tivesse ficado a convicção de que nesse momento o Dr. Elias da Costa já sabia que o Primeiro-Ministro dera expressas instruções à nova equipa das finanças para uma intervenção voluntarista que esclarecesse posições que por não terem sido evitadas, ou corrigidas na devida ocasião, estavam a atingir uma dimensão política tão negativa como justificada para o Governo.

O comportamento do Primeiro-Ministro, Dr. Cavaco Silva, foi enaltecido por muitos dos depoentes, sendo certo que os mesmos ou pertenciam, ou haviam pertencido aos seus governos, ou eram entidades de designação pelo Governo. Mas não custa a crer que o chefe do Governo tenha manifestado em todo o processo, inclusivamente quando este esteve duas vezes com o Sr. Mario Conde, a sua preocupação de que se salvaguardasse o respeito pela legislação portuguesa.

Só que, mesmo a ter sido assim, não poderá nunca o Primeiro-Ministro ficar imune de responsabilidades pela insuficiência de visão política e enfraquecida capacidade decisória do Ministério das Finanças, especialmente durante todo o mandato do Dr. Braga de Macedo, embora possam ter pesado no seu critério tais insuficiências quando decidiu substituir o Ministro, o Secretário de Estado e a política,

recomendando ao Dr. Eduardo Catroga e ao Sr. António de Sousa que assumissem frontalmente o controlo da situação. Anote-se que este último, nomeado Secretário de Estado das Finanças, conhecia bem o processo da privatização do BTA por em fase curricular anterior ter sido administrador da Valores Ibéricos, S. A., e do BTA, e haver analisado com o ICEP um significativo pedido de investimento estrangeiro com a finalidade de acorrer ao aumento de capital do BTA, quando Secretário de Estado do Comércio Externo.

Por tudo isto, se é um facto que, durante o processo de privatização do Banco Totta & Açores, ocorreram alterações legislativas e que se exigiu um esforço de compatibilização, nem sempre fácil, das medidas legislativas internas com o direito comunitário, com a mesma objectividade sou levado a concluir que o Governo, em período decisivo do processo, esteve longe de tomar as medidas necessárias, no plano administrativo e político, para a conveniente salvaguarda da raiz e cultura portuguesas do Banco Totta & Açores.

E se não me custa acompanhar o' Sr. Deputado Relator na sua proposta de recomendação ao Governo «para que proceda a uma reponderação do quadro legal concebido para o processo de privatizações, de modo a melhorar a articulação entre a Comissão de Acompanhamento das Reprivatizações, a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários e o Banco de Portugal, e destas entidades com o Governo», embora torne expressamente extensiva essa recomendação à própria Assembleia da República e, logo, aos Grupos Parlamentares que a compõem, igualmente me parece justificado concluir que a melhoria desta articulação teria facilmente sido assegurada por uma equipa das finanças mais perspicaz, determinada e actuante.

Direi mesmo que, a não ter o Banco Totta & Açores contado com uma gestão competente e firme, sob a orientação do Sr. Dr. Alípio Dias, que soube preservar o Banco como português e ao serviço da economia nacional, como a generalidade da Comissão Eventual de Inquérito Parlamentar sempre reconheceu, teríamos visto uma das nossas mais válidas instituições bancárias descambar para ínvios caminhos, pondo em perigo a imagem e os interesses do País, a posição dos seus numerosos pequenos accionistas e dos seus numerosíssimos clientes, tanto mais que a trajectória do Sr. Mario Conde no Banesto nos faz hoje avaliar melhor a dimensão desses perigos e o peso dessas ameaças.

A internacionalização do Banco Totta & Açores pretendida pelo Sr. Mario Conde, seus colaboradores espanhóis e aliados portugueses, passava por uma intolerável ingerência do Banesto nos destinos do Banco Totta & Açores, o que seria sempre uma opção muito discutível, e em minha opinião, com certeza errada, para se assegurar a presença mais activa da nossa economia no mercado exterior, para não falar já da conveniência, quanto a mim evidente, de privilegiar a cooperação europeia, sem todavia a confundir com uma excessiva convergência ibérica.

Lisboa, 16 de Dezembro de 1994. — O Deputado, Joaquim da Silva Pinto.

A Divisão de Redacção e Apoio Audiovisual.