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II SÉRIE-C — NÚMERO 9

As nossas crianças são aquelas que muitas vezes se acabam por entregar à prostituição, ao crime, à corrupção, ao assassínio, à droga, ao aborto, ao suicídio ou simplesmente a vida cinzenta, vazia de sentido e vazia de ideal;

As nossas crianças, Dr. Mário Soares, Dr. Cavaco Silva e Dr. Roberto Carneiro, pertencem à CEE, da qual, infelizmente, temos a tendência de copiar tanto o bom como o mau (diz-se que nos outros países a licenciosidade é ainda maior e, como somos o País dos brandos costumes, aqui parece que não é tão mau como lá, mas mesmo assim já temos matéria suficiente para reescrever a Decadência do Império Romano ... do século xx.

Para onde caminhamos?

Para o Último Tango em Paris anunciado em grandes cartazes «Para Todos!!!»?

Dia 19 de Fevereiro, terça-feira, passaram na nossa RTP o filme cheio de cenas pornográficas O Império dos Sentidos. Às 21 horas e 55 minutos.

Numa data para esquecer, a RTP chegou a passar num domingo à tarde um filme sobre a guerra de Espanha, se não estou em erro, O Tambor, o qual foi de tal ordem que até a revista Sábado brindou a RTP com uma negra e vergonhosa «lua nova», em atenção as crianças!

O próprio director da revista acima mencionada, Joaquim Letria, parece ter uma apetência especial em chocar as pessoas, tendo já trazido aos seus programas televisivos duas mulheres que, gratuitamente, exibiem o seu corpo como se de mercadoria se tratasse. Qual será a sua ideia? Fazer um pouco «o gosto ao dedo» do ladozinho animal que todos nós temos? Mostrar que é muito «livre» e até já consegue fazer aquilo que lá fora se faz corrente e civilizadamente, com toda a linha?

Sr. Joaquim Letria, esta é para si: eu fui uma das muitas pessoas que deixou de comprar a revista Sábado (o que fazia pontualmente todas as semanas) quando soube que o senhor tinha sido tão baixamente substituído por outro director, devido à consideração que tenho por si. Por favor, não tome atitudes que não estão à altura da popularidade que ganhou junto do povo português!

No entanto, nem tudo é negro, pois, verdade seja dita, em poucos anos, a RTP tem vindo a evoluir de forma bem visível no que respeita a programações infantis e juvenis. Nota-se da sua parte um esforço em melhorar a qualidade e aumentar a quantidade desses programas, muitas vezes de excepcional qualidade.

Então, porquê esta incoerência? O ser humano é feito de contradições, é certo, mas um meio de comunicação com a responsabilidade da RTP (por mais pequeno e insignificante que Portugal seja no mapa-mundi, são muitas vidas que ela atinge), não pode apresentar esse subterfúgio, nem o de que uma televisão «deve mostrar um pouco de tudo» (neste caso tem sido muitíssimo de um pouco —sexo e violência), ou de que «estas coisas existem», «as crianças não devem ser educadas em algodão em rama», ou, pior argumento ainda «elas até sabem mais do que nós», «a RTP avisou de que as pessoas sensíveis não deviam assistir a esse programa», «as pessoas.só vêem se querem» e outros argumentos primários e mentirosos.

Felizmente que temos agora a APET — Associação Portuguesa de Espectadores de Televteão.

O seu número de sócios tem vindo incessantemente a aumentar, o que prova que há muitos que acreditam na RTP, desejam-na cada vez melhor e responsável, exigem dela que cumpra a função para que foi criada: servir_o povo português.

Termino esta carta, desejando que ela não vá cair em

«saco roto» e sabendo que estou a falar em nome de muitas pessoas que não tiveram ainda a oportunidade de manifestarem aquilo que realmente sentem e pensam.

Lisboa, Fevereiro de 1991. — Raquel A., educadora.

ANEXO 2

ASSOCIAÇÃO PORTUGUESA DE ESPECTADORES DE TELEVISÃO (APET)

Ex."»0 Sr. Doutor Provedor da Justiça:

Excelência:

A Associação Portuguesa de Espectadores de Televisão, pessoa colecta n.° 501771301, com sede na Rua do Bolhão, 99, 2.°, F, 4000 Porto, vem expor e requerer a V. Ex.a o seguinte:

1 — Na sequência da queixa apresentada à Alta Autoridade para a Comunicação Social (de conteúdo análogo à exposição enviada a V. S.') foi proferida decisão de cujo conteúdo enviamos cópia.

2 — Pela mesma se verifica que a Alta Autoridade para a Comunicação Social, embora considerando incorrecto e merecedor de reparo o critério de programação seguido pela RTP, considerou sem apoio legal as queixas apresentadas.

3 — Para tanto, contribuiu o conceito legal subjectivo de «pornografia» e a sua possibilidade, ou não, de confusão com o de «obscenidade».

4 — Contribuiu ainda para tal decisão o facto de o horário nocturno de actividade televisiva começar às 22 horas.

5 — Assim, nos termos dos artigos 24.° e seguintes da Lei n.° 9/91 e para os efeitos do artigo 20.°, n.° I, alíneas a) e b), do mesmo diploma, vimos requerer a V. Ex."

a) Que dirija recomendação ao conselho de administração da RTP no sentido de evitar situações análogas ou semelhantes àquela que se verificou;

b) Que assinale as deficiências da legislação invocada na referida decisão, emitindo recomendações para a sua interpretação, alteração ou revogação no seguinte sentido:

I) Alteração do artigo 17° da Lei n.° 58/90, de 7 de Setembro, n.°* 1 e 3, no sentido de o conceito de «pornografia» e «obscenidade» serem integrados por elementos de previsão legislativa que os tornem de aplicação mais objectiva;

II) Ou pelo menos que se torne mais clara a distinção entre o conceito de «programa pornográfico» e o de «programa obsceno» — artigo 205.°, n.° 3, do Código Penal;

LU) Que sejam incluídos na previsão legal de «programas pornográficos ou obscenos» aqueles que, embora globalmente não possam ser considerados como tal, tenham no entanto sequências que mereçam tal classificação;

IV) Que seja alterado o n.° 4 do artigo 17." da Lei n.° 58/90, de 7 de Setembro, no sentido de o horário nocturno ter o seu início as 23 ou 24 horas.