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II SÉRIE-C — NÚMERO 9

8.3 — De resto, e também como a lei lhe impõe, só

exibiu o filme após as 22 horas, ou seja, no legalmente

designado «horário nocturno»;

8.4 — Em conclusão, a RTP, através do director do seu Canal 2, conclui pela total licitude da sua conduta.

9 — Importa ainda referir que a RTP, antes de se pronunciar sob o conteúdo objectivo da questão, invocou a ilegitimidade e a falta de representatividade da APET

(Associação Portuguesa de Espectadores de Televisão).

Todavia, a Alta Autoridade para a Comunicação Social considera irrelevante tal arguição, já que, se por um lado a cópia da queixa que a APET apresentou foi enviada à RTP apenas a título exemplificativo, por outro lado esta Autoridade não está obrigada a exercer as suas funções apenas a requerimento dos interessados.

Com efeito, a Alta Autoridade para a Comunicação Social, nos limites das suas competências, actua a requerimento de qualquer pessoal (singular ou colectiva) ou espontaneamente.

Portanto, ainda que a referida APET não tivesse legitimidade ou representatividade para apresentar a queixa, não estava, por isso, inibida esta Autoridade de desencadear o presente processo e de deliberar como se fará, a final.

De resto, e como já se disse, este processo teve o seu início instrumental antes de dar entrada a queixa da Associação Portuguesa de Espectadores de Televisão.

III — Audiências concedidas pela Alta Autoridade para a Comunicação Social também relacionadas com a questão era apreço

Com o objectivo de dar a conhecer as suas opiniões sobre a programação que a RTP tem vindo a desenvolver nos últimos tempos, a Associação Portuguesa de Espectadores de Televisão e um autodenominado e espontaneamente criado «Grupo Aberto» solicita audiências

à Alta Autoridade para a Comunicação Social.

Dando satisfação a tais solicitações, esta Autoridade recebeu dois representantes da APET, no dia 1 de Março de 1991, e dois representantes do já referido «Grupo Aberto», no dia 22 dos mesmos mês e ano.

Em tais reuniões, a Alta Autoridade para a Comunicação Social ouviu múltiplas queixas sobre a programação da RTP, no sentido de que esta vem violando a lei, ultrapassando os limites que ela lhe impõe, ao exibir filmes violentes e pornográficos.

Com efeito, quer a APET quer o referido «Grupo Aberto» entendem que a programação da RTP, para além de ser genericamente má, não cumpre a sua missão educacional, ao promover a exibição de filmes demasiadamente realistas e violentos, em detrimento de espectáculos de recreação e diversão.

Sendo assim, a APET e o «Grupo Aberto» consideram que a RTP deveria ter mais responsabilidade, atendendo ao aumento da criminalidade .e da marginalidade que ultimamente se vem verificando em Portugal.

Estas são, no essencial, as principais conclusões que esta Autoridade retira das reuniões de trabalho anteriormente relatadas com aquela Associação de Espectadores e com o grupo confessamente organizador de uma pequena concentração popular ocorrida no passado dia 26 de Fevereiro em frente das instalações da RTP (à Avenida de 5 de Outubro, em Lisboa), concentração que, de resto, foi profusamente noticiada petos jornais e que teve como

objectivo criticar ãs direcções de canal da RTP e reagir

contra os critérios programáticos que aquelas direcções têm

vindo a seguir.

IV — A dimensão da questão em apreço

É indiscutível que a exibição televisiva do filme O Império dos Sentidos gerou um indeterminado número de

críticas, umas favoráveis, outras desfavoráveis àquela exibição, de tal forma que se pode concluir, ainda-hoje, que o assunto foi polemizado a nível nacional. '<>

Com efeito, o assunto em causa desencadeou manifestações de opinião de inúmeros cidadãos anónimos, de jornalistas, de críticos cinematográficos, de políticos, de partidos políticos, de Deputados à Assembleia da República, de membros da Igreja e, até, de membros do Governo.

O assunto mereceu tão grande relevância pública que por causa dele foi desencadeado um processo de inquérito para esclarecimento, pelo Sr. Ministro da tutela, e até serviu de motivo para debate parlamentar, que culminou, inclusivamente, com um protesto (o voto n.° 187/V, de 22 de Fevereiro de 1991), apresentado por um dos partidos ali representados.

Não quis a Alta Autoridade para a Comunicação Social emitir imediatamente uma sua deliberação sobre o assunto, em primeiro lugar devido às responsabilidade que sobre ela recaem, em segundo lugar porque a precipitação e a prematuridade dessa hipotética deliberação seriam inimigas da prudência e cautela necessárias e, por fim, porque uma deliberação desta Autoridade no contexto temporal imediato à exibição daquele filme apenas serviria para acender a polémica e criar ainda mais atritos e conflitos do que aqueles que ocorreram.

Numa palavra, seria pasto para querelas, porventura insanáveis, que não se desejam...

No entanto, e atendendo às competências que legalmente lhe são atribuídas, não podia a Alta Autoridade para a

Comunicação Social deixar de emitir um parecer deliberatório sobre a questão, o que se fará nos pontos seguintes.

V — O filme e sua análise

O filme O império dos Sentidos é, como se disse, de origem nipónico-francesa e data de 1976.

Foi realizado por Nagisa Oshima, considerado pela crítica como um dos mais notáveis representantes do cinema japonês.

O filme descreve uma terrível paixão entre uma serva e o seu amo, ocorrida em 1936, na capital japonesa, e baseia-se, porventura, num acontecimento verídico.

Com efeito, O Império dos Sentidos traça o percurso desses dois amantes, que, em progressão desmedida vai culminar num final de sofrimento e morte, aliás previsivelmente detectado.

É uma história escandalosa sobre um relacionamento humano trágico, onde se esgotam e ultrapassam os limites do desejo, do erotismo e do sexo.

É um filme incómodo e gerador de profunda tensão.

Mas, apesar de grande número de cenas sexualmente ousadíssimas, o filme O Império dos Sentidos só aparentemente poderia ser interpretado como uma história irracional de sexo que vise estimular sexualmente o espectador.

É sobretudo a história de um drama emocional terrível, onde uma paixão exacerbadíssima, um prazer desmedido e a morte se confundem.