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II SÉR1E-C — NÚMERO 15
Ora, nos termos desse acordo, os accionistas privados, ainda que em posição minoritária, têm garantido o direito de se fazer representar no respectivo conselho de administração por três elementos, no total de sete, desde que tenham
uma participação de pelo menos 40% no capital social. É o que acontece com o referido grupo privado francês, accionista da empresa.
Quanto à escolha do presidente do conselho de administração, aponta-se aí, preferencialmente, para a sua designação por acordo entre a Caixa Geral de Depósitos e a Anjo Wiggins, S. A., admite-se que, na falta desse acordo, esta última poderá vetar os dois primeiros nomes que lhe forem propostos por aquela, mas já se impõe que a Anjo Wiggins, S. A., terá de aceitar o terceiro nome que a Caixa Geral de Depósitos indicar.
Nestas condições, porém, a maioria dos membros do conselho de administração da SOPORCEL, incluindo o seu presidente, serão sempre pessoas de confiança da Caixa Geral de Depósitos e por esta indicados.
Igualmente está fixado no acordo em referência que compete ainda à Caixa-Geral de Depósitos designar a maioria dos membros:
Da mesa da assembleia geral; Do conselho fiscal; Da comissão de vencimentos; e Até do conselho executivo, no caso de não ser possível nomear por acordo um administrador-delegado.
Ou seja, na constituição de todos os órgãos sociais da SOPORCEL (executivos, deliberativo e fiscalizador), afinal a Caixa Geral de Depósitos tem perfeitamente assegurado o direito de indicar representantes seus ou pessoas da sua confiança, quê formarão maioria sempre que o quiserem fazer.
Apenas em relação a algumas matérias, que são da competência exclusiva da assembleia geral da SOPORCEL, é que a maioria de que a Caixa Geral de Depósitos é titular no capital social da empresa não basta para suportar as respectivas decisões.
É o caso das decisões a tomar sobre a política de dividendos, aumentos de capital, aquisições e fusões que, nos termos do acordo parassocial e ou do pacto social, se exige sejam aprovadas pelos representantes da maioria qualificada de 60% do capital, de que a Caixa Geral de Depósitos na situação actual efectivamente não dispõe.
Sobre tais matérias terá, pois, de haver sempre acordo entre o accionista maioritário e o accionista minoritário.
V — A primeira abordagem do problema em causa
A SOPORCEL está, pois, sujeita às regras gerais contidas no Código das Sociedades Comerciais.
Consequentemente, nos termos do artigo 405.° desse Código, competirá sempre ao seu conselho de administração gerir as actividades da sociedade com autonomia e só deverá subordinar-se às deliberações dos accionistas reunidos em assembleia geral ou às intervenções do conselho fiscal apenas nos casos em que a lei ou o contrato da sociedade o determinarem.
Tem, pois, razão o Sr. Deputado Álvaro Barreto quando na sua exposição afirma que a gestão corrente da empresa é, do ponto de vista legal, da exclusiva competência-do seu conselho de administração, não podendo o Governo interferir nessa gestão.
Mas isto afinal é o que se passa em relação a todas as sociedades anónimas submetidas ao normativo do Código das Sociedades Comerciais — independentemente da natureza pública ou privada dos seus capitais.
Os respectivos conselhos de administração gerem-nas com a autonomia própria que a lei atribui a esses órgãos.
Simplesmente, como acontece com a SOPORCEL, sociedades há em que a maioria das pessoas que compõem
qualquer dos órgãos sociais são designadas para o efeito por um só e o mesmo accionista (o maioritário, que aqui é a Caixa Geral de Depósitos).
Nestas condições poderá, pois, perguntar-se se, para além daquilo que a lei estabelece, não haverá poderes de facto (que não de jure) desse accionista e de quem porventura esteja por detrás dele, que coarctem ou limitem essa autonomia, fazendo que essas pessoas, até por uma questão de defesa de interesses ou de posições pessoais, se sintam obrigadas a respeitar e ou a cumprir instruções que esse accionista, que as nomeou ou em quem confia, porventura lhes vier a transmitir.
Normalmente a resposta será afirmativa.
O Sr. Deputado Álvaro Barreto igualmente terá alguma razão quando alega que o Estado não tem participação accionista directa na empresa e que esta não tem qualquer dependência financeira do Orçamento do Estado.
Mas, quanto ao primeiro destes aspectos, não será despiciendo lembrar que nb artigo 545." daquele Código ainda se preceitua que, para os efeitos nele previstos, a Caixa Geral de Depósitos é equiparada ao Estado.
Tem ainda razão quando salienta que os gestores da SOPORCEL não são considerados gestores públicos; efectivamente, não o são, pois não se enquadram na moldura fáctica que a lei define para estes últimos (Decreto-Lei n.° 464/82, de 9 de Dezembro).
No que respeita aos membros do conselho de administração, com excepção do seu presidente, é também de aceitar que eles não são «titulares de altos cargos públicos», já que efectivamente não são designados por qualquer entidade pública [artigo 3.°, alínea b), da Lei n.° 64/93, de 26 de Agosto].
Quanto ao presidente desse órgão, porém, já a situação pode ser controversa, pois este diploma legal estatui, na alínea a) do seu artigo 3.°, que deverão sempre ser considerados «titulares de altos cargos públicos» ou equiparados, os presidentes [...] de sociedades anónimas de capitais, exclusiva ou maioritariamente, públicos, qualquer que seja o modo da sua designação.
Estamos, assim, reconduzidos ao ceme do problema: afinal a SOPORCEL é ou não é uma sociedade anónima de capitais maioritariamente públicos?
Da resposta, positiva ou negativa, a esta questão dependerá pois, como é evidente, a decisão a tomar quanto à existência ou não da incompatibilidade que poderá afectar o Sr. Deputado Álvaro Barreto.
Nesta perspectiva, não se trata, portanto, de saber se a SOPORCEL é ou não uma empresa pública; também não se trata de saber se o Governo a tutela ou não, se tem poderes legais para interferir na sua gestão ou se pode impor-se na designação do presidente do seu conselho de administração.
Tão-pouco se trata de saber se os seus gestores devem ou não ser considerados «gestores públicos» ou se o seu presidente é ou não «titular de um alto cargo público» tal como estas figuras são caracterizadas nos diplomas legais específicos que as definem.
Aliás, esta última questão poderia até ter algum interesse para o caso vertente, já que, nos termos da Lei n.° 64/93, de 26 de Agosto, os titulares de altos cargos públicos em sociedades anónimas de capitais maioritariamente públicos não podem exercer outras funções remuneradas, salvo se para o