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19 DE NOVEMBRO DE 1997

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O Sr. José Calçada (PCP): — Sr." Presidente, Sr. Ministro da Cultura, V. Ex.° acabou de dizer que o orçamento para a Cultura teve — e cito — um reforço claro. Lembro ao Sr. Ministro que, no conjunto do Orçamento do Estado, a percentagem reservada ao orçamento para a Cultura passou de 0,5% para 0,6%, o que mostra uma subida relativa importante, mas que só se entende no quadro da fragilidade do ponto de partida. Isto é, a verba anterior era tão baixa que qualquer subida teria de ser significativa em termos relativos. Era impossível que o nãò fosse, a menos que, de todo em todo, nada aumentasse. Mesmo assim, continuamos muito longe da aspiração anunciada — chamar-lhe-ia mais isso do que outra coisa — que seria a de atingir a percentagem de 1% neste peso relativo. Portanto, é dentro deste quadro que as coisas devem ser entendidas e não dentro do quadro puro e simples dos valores absolutos, pelos quais pouco se percebe.

Sr. Ministro, vou colocar-lhe uma série de questões que se prendem com matérias que já foram abordadas em sede de comissão e com outras que o não foram.

Na linha do Sr. Deputado do Partido Socialista que. falou antes de mim, tenho grandes dificuldades em mexer--me nesta «floresta de números», o que não é uma vantagem.

Assim, gostaria que o Sr. Ministro me dissesse onde é que, em sede orçamental, se encontra o reflexo da necessidade de expansão da rede de orquestras regionais, caso esta se efective.

Onde é que aparece no orçamento a defesa da expansão, nem que seja apenas um sinal, dos centros regionais de arte e espectáculo?

Onde é que aparece o reforço dos circuitos de produção descentralizada — e, mais adiante,.voltarei a esta questão?

Também gostaria de saber — e, para nós, esta parte é muito significativa — onde é que. aparece o reforço dos mecanismos de apoio ao associativismo cultural de base e à actividade artística amadora.

A nível do relatório do Conselho Económico e Social, relatório este de natureza muito mais técnica do que política, quero lembrar ao Sr. Ministro que o Conselho Económico e Social referiu que «no orçamento do Ministério da Cultura faltam programas específicos com objectivos e prioridades bem definidos, nomeadamente visando o conhecimento e a defesa da nossa língua e da nossa História e a descoberta e recolha dos elementos da nossa cultura popular, nomeadamente nas músicas, nas artes, nas tradições, como 'defesa' [...] — e ponho 'defesa' entre aspas porque julgo que se trata mais de uma política de agressão do que de defesa — [...] contra a internacionalização, a globalização e a imposição de padrões dominantes com origem externa».

O Conselho Económico e Social também refere outros dois aspectos, com os quais concordamos em absoluto, relativamente ao orçamento do Ministério da Cultura. Diz que falta o incremento — isto é fácil de verificar e o Sr. Ministro já o reconheceu aqui, há pouco — do inventário do património construído e o apoio às colectividades de raiz popular.

Estas são questões fundamentais, de natureza estratégica, que não se vêem suficientemente contempladas em sede orçamental.

Aproveito para inquirir o Sr. Ministro sobre outras questões que também se relacionam, directa ou indirectamente, com o Orçamento do Estado.

Desde logo, é visível o adiamento da formação técnica do pessoal do Ministério da Cultura e julgamos que esta é uma área fundamental para tudo o que queira fazer-se, nomeadamente a reestruturação de carreiras que não foi feita.

Finalmente, o já muitas vezes anunciado — e, há pouco, mais uma vez anunciado pelo Sr. Ministro — «pacto do património nacional», a ser firmado com autarquias, com a Igreja Católica, com associações sócio-profissionais e culturais, universidades, escolas, etc.

Esse «pacto do património nacional» continua a «patinan> — perdoe-se-me o plebeísmo da expressão —, pelo que gostava que o Sr. Ministro nos desse o ponto da situação, se bem que sintético, sobre esta matéria.

Por outro lado, embora estando completamente de acordo — e quero deixar bem claro este nosso acordo, embora alguém tenha pretendido pôr em contradição uma coisa e outra — com a instituição descentralizada, no Porto, do Centro Português de Fotografia e considerando que tal deve ser relevado, não posso deixar de suscitar aqui um problema de algum modo a jusante e a montante. Trata-se de saber qual o destino a dar ao acervo do Arquivo Nacional de Fotografia, que tem o peso e a importância que o Sr. Ministro sabe e que, mesmo a pretexto da eventual criação, no Porto, do Centro Português de Fotografia, não pode ser menorizado. Aliás, creio ter lido na comunicação social — corrija-me se assim não foi —, há já algum tempo, que o Sr. Ministro tinha pensado na criação de arquivos de fotografia descentralizados. Admito que possa não ter sido exactamente isto que li, mas foi mais ou menos.

Ora, se, porventura, o Sr. Ministro pensa na criação de arquivos de fotografia descentralizados, então, digo-lhe que conhece tão bem quanto nós próprios as questões técnicas que surgem — necessidade de câmaras frigoríficas, de instalações de ar condicionado etc. —, que dificilmente tornam defensável a descentralização de arquivos de fotografia. E que, se assim fosse, tal implicaria a descentralização de meios técnicos muito sofisticados o que, em termos de optimização de meios e de pessoal, dificilmente pode ser feito. Pelo contrário, caso se avançasse por essa solução, poderia até ser uma maneira de colocar em grave risco a descentralização neste domínio porque julgamos que se trata de uma área que, por razões técnicas, não é mesmo passível de descentralização.

Passo agora a algumas questões que são importantes para nós, em termos de presente e de futuro imediato.

Começo pelo anteprojecto de decreto-lei, a apresentar a esta Câmara, que determina a substituição do IPACA pelo ICAM.

Parece-nos não haver, no Ministério, uma visão estratégica muito clara sobre o que deve ou não fazer-se. É porque, por um lado, autonomiza-se a arqueologia, o que nos parece perfeitamente correcto, e,' por outro lado, misturam-se numa única instituição coisas radicalmente diversas que, só aparentemente, são semelhantes.

O Sr. Ministro sabe perfeitamente que, por exemplo, vídeo é uma coisa e cinema outra. Embora pareça, nada têm em comum nem quanto à produção, nem quanto à distribuição, nem quanto aos valores estéticos. São, de facto, coisas que de comum apenas têm a imagem, o que é pouco para que se permita misturá-las. É que uma coisa é fazer uma política integrada nessa área, outra é fazer uma política misturada; misturar é uma coisa, integrar é outra.