0208 | II Série C - Número 014 | 02 de Fevereiro de 2002
empobrecido e os óbitos e doenças observadas nos militares portugueses que estiveram nos Balcãs". O relatório frisa que os resultados das análises das amostras de solo, água, poeiras atmosféricas e alimentos recolhidos no Kosovo e na Bósnia indicam que não há contaminação radioactiva generalizada do ambiente. A missão científica monotorizou minuciosamente as instalações utilizadas como aquartelamento pelos militares (dormitórios, refeitórios, cozinhas, oficinas e paradas) e conclui que não existem valores anormais de radiações ionizantes. Relativamente às amostras de solo recolhidas, apenas a alguns metros de distância do sítio de impacto das munições, a equipa conclui que já não apresentam vestígios de urânio empobrecido, indicando, pois, que a contaminação é muito localizada e é, "praticamente restrita ao sítio do impacto das munições". Segundo o relatório, o único elemento radioactivo de origem artificial presente nos solos é o Césio-137, proveniente dos testes de bombas nucleares e do acidente de Chernobyl e presente em todas as latitudes do planeta, com mais incidência nos países mais próximos da antiga central nuclear.
O relatório adverte, no entanto, tal como o relatório do Programa das Nações Unidas para o Ambiente (PNUA) já tinha feito, para o perigo das "recordações de guerra". Segundo os cientistas, a exposição à radiação beta poderá ser significativa, com possibilidade de indução de lesões dérmicas, se um projéctil permanecer muito tempo em contacto com a pele ("suspenso ao pescoço, porta-chaves"). "Por isso mesmo, a população deve ser desaconselhada de guardar tais objectos como recordação de guerra", diz o relatório.
A equipa do ITN analisou também as amostras de urina recolhidas no rasteio geral efectuado pelos hospitais militares aos elementos portugueses que prestaram serviço nos Balcãs, tendo o ITN concluído que não há indícios de contaminação por urânio empobrecido.
Ainda, e também neste contexto, a Comissão Parlamentar de Defesa Nacional deliberou proceder a várias audições a personalidades indicadas pelos grupos parlamentares no sentido de se reunirem os elementos considerados relevantes para o esclarecimento possível da situação atrás citada.
Assim sendo, no dia 14 de Março de 2001 a Comissão de Defesa Nacional reuniu-se com o Presidente do Instituto Tecnológico e Nuclear, Professor José Carvalho Soares, e com o Investigador Coordenador do Instituto Tecnológico e Nuclear, Doutor Eng.º Frederico José da Silva Gama Carvalho. No dia 20 de Março de 2001 a Comissão reuniu-se com o Major Francisco Leandro e com o Tenente-Coronel José Calçada. No dia seguinte, 21 de Março de 2001, a Comissão ouviu em audição o Dr. Fernando Piedade Carvalho, do Instituto Tecnológico e Nuclear, o Prof. Doutor Delgado Domingues, do Instituto Superior Técnico de Lisboa, e, finalmente, o Almirante Junqueiro Sarmento. No mês de Abril, dia 3, a Comissão reuniu-se com o Coronel Tirocinado Médico Nunes Marques, Director do Hospital Militar, e com o Professor Doutor Mário Durval, Presidente da Associação Nacional de Médicos de Saúde Pública.
No último dia de audições, no dia 4 de Abril de 2001, o Professor José Ribera Salsedo, da Faculdade de Engenharia do Porto, e o Professor Doutor Rui Namorado Rosa foram também recebidos em sede da Comissão Parlamentar de Defesa Nacional.
Existem gravações destas audições em arquivo não classificado na Comissão de Defesa Nacional.
D - Países não membros da NATO:
Os países não-membros da NATO que participaram na KFOR, caso da Rússia, ordenaram também um inquérito sobre a relação entre a leucemia e o contacto com munições de urânio empobrecido. Entretanto, a armada russa informou que os testes à saúde efectuados aos militares, homens e mulheres, que servem actualmente no Kosovo e na Bósnia-Herzegovina,não revelam nem uma taxa anormal de elementos cancerígenos nem nenhuma ligação entre as munições com urânio empobrecido e o cancro. A Rússia aceitou participar num estudo independente, em colaboração com a França, sobre os efeitos da exposição ao urânio empobrecido. A Suécia enviou questionários de saúde a 12 000 veteranos que serviram no Golfo ou nos Balcãs, para assim permitir às autoridades militares obter uma visão conjunta do estado de saúde geral dos seus elementos. A análise de urina será feita assim que os militares regressem, na primavera, e os resultados serão então comparados, a exemplo da Bélgica, aos da população civil sueca.
O governo da Suíça foi um dos poucos a pedir a interdição total de munições com urânio empobrecido. A Suíça, desde há muitos anos, efectua testes ao urânio empobrecido, tendo colaborado nos primeiros testes científicos que foram feitos recentemente, sob o patrocínio do PNUA: entre 1960 e 1970, duas sociedades privadas suíças fizeram testes às munições com urânio empobrecido no país, e, entre os anos de 1975 e de 1980, o departamento militar federal suíço (antigo departamento federal de defesa suíço) testou, igualmente, este tipo de munições. Todos os resultados relativos aos riscos para a saúde revelaram-se, até agora, negativos. O Presidente da República Federal da Jugoslávia, Sr. Kostunica, foi ao ponto de pedir às Nações Unidas que considerasse a utilização de munições com urânio empobrecido pela NATO um crime de guerra. O Presidente Kostunica declarou que os governos se tinham concentrado nas suas próprias forças armadas e tinha sido dada uma atenção ínfima à população civil da Sérvia e do Kosovo, e à "limpeza" depois da campanha. Os efeitos sobre os civis foram a principal preocupação do governo da República Federal da Jugoslávia, nomeadamente depois de a Organização Mundial de Saúde (OMS) ter relatado que as crianças poderiam estar mais vulneráveis à exposição dos efeitos tóxicos do urânio empobrecido quando brincavam com terra.
Apesar da importância dos testes efectuados por inúmeros governos, membros e não membros da NATO, nomeadamente análises de urina aos soldados regressados da sua missão de manutenção de paz nos Balcãs, certos especialistas pensam que os métodos propostos não revelam resultados precisos. A revista New Scientist informou em Janeiro que, segundo especialistas, "os governos ocidentais não conseguem efectuar actualmente os exames necessários à avaliação do risco a que estão sujeitos os veteranos de guerra, pela exposição ao urânio empobrecido". Os críticos declararam que os testes, assim como as análises de urina, não medem com precisão a quantidade de urânio empobrecido absorvido pelos soldados. Seja como for, segundo David Meddings, do Comité Internacional da Cruz Vermelha (CICV), a análise à concentração de urânio na urina é considerado "o melhor método de avaliação da exposição ao urânio" e é, frequentemente, utilizado em pessoas expostas pela sua própria profissão (os trabalhadores de urânio) para assegurar que não sejam sujeitas a exposições superiores aos limites de segurança estabelecida. Ainda por cima, estudos científicos utilizam a concentração de urânio na urina como padrão para avaliar a exposição das populações que vivem nas proximidades de minas de urânio, ou de instalações de transformação deste mineral.