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0003 | II Série C - Número 013S | 10 de Janeiro de 2004

 

Para além do que vai implícito na natureza jurídica do órgão, há todo um conjunto de indícios que apontam para a intenção do legislador constituinte de um modelo unitário de ombudsman.
Para Filipe Boa Baptista, em primeiro lugar, no que diz respeito ao fundamento jurídico do órgão, que radica na CRP e está presente na instituição de um órgão vocacionado para a prevenção e reparação de todas as injustiças decorrentes da actividade dos poderes públicos, qualquer que seja a respectiva natureza e origem.
Em segundo lugar, o fundamento material do órgão e que consiste na defesa dos cidadãos contra actos de poderes públicos e em defesa dos direitos fundamentais. A dimensão fundamental dos fins prosseguidos pelo Provedor de Justiça impõe um órgão não circunscrito.
Em terceiro lugar, a legitimidade de título, decorrente da designação pela Assembleia da República e pela maioria qualificada de dois terços dos Deputados presentes, o que representa um indício da natureza fundamental dos interesses que deve prosseguir, do perfil consensual do titular na defesa desses interesses e da deslocação da respectiva racionalidade de actuação para fora do combate político, impondo-o a qualquer defensor de interesses especiais.
Em quarto lugar, a natureza unitária do Estado admite um controlo unitário do poder por via do Provedor de Justiça, uma vez que os direitos fundamentais e a justiça são oponíveis a qualquer poder da mesma forma com idêntico critério.
Em quinto lugar, a natureza independente do Provedor de Justiça e a ausência de domínio sobre a decisão final torna-o compatível com qualquer princípio de autonomia existente.
Em sexto lugar, a identidade de poderes instrumentais do Provedor de Justiça face aos diversos poderes públicos implica que a unidade não implique quebra de eficácia.

1.2.2 Experiências europeias

Segundo Álvaro Gil Robles (In O Cidadão, o Provedor de Justiça e as Entidades Administrativas Independentes, Edição da Provedoria de Justiça, Lisboa 2002), o ombudsman depende do tipo de organização regional e territorial de cada Estado. Não há um modelo único de ombudsman, nem um só exemplo. Temos na Europa, ombudsman nacionais, regionais e municipais, no que respeita à organização territorial do Estado.
Todos estes três níveis (1) país, (ii) região autónoma, (iii) município têm competência legislativa e todos podem eleger um ombudsman. Portanto, depende em que Estado nos situamos, podendo ainda haver um quarto nível, o supra nacional, como é exemplo o Provedor Europeu. A par destes, podem ainda existir Provedores Especiais em razão da matéria, ou sectoriais.

1.2.3 -Breve esboço histórico e tendências actuais

A universalização e a generalização do ombudsman não se fez por mera reprodução do modelo original, verificando-se antes a adaptação e o enriquecimento sucessivo do modelo sueco. A variedade é actualmente tão grande que chegamos a questionar se será possível aceder à identificação de uma natureza única, a um conceito que revele a essência do órgão e o permita distinguir dos demais.
Segundo Filipe Boa Baptista in "O Cidadão, o Provedor de Justiça e as Entidades Administrativas Independentes" depois de analisar múltiplos sistemas é possível identificar quatro critérios que compõem o código genético deste órgão:

1 - O acesso dos particulares - um acesso directo e tendencialmente incondicionado;
2 - Independência face ao executivo - o ombudsman partiu na sua origem de um modelo de controlo parlamentar da Administração e este constitui o mínimo denominador comum do instituto;
3 - Critério de actuação, que é sobretudo um critério informal - o ombudsman actua segundo critérios não definidos expressamente na Constituição ou na lei, permitindo-se-lhe o poder de os definir no caso concreto, determinando o que entende por boa ou má administração, o que considera justo ou injusto, razoável ou irrazoável;
4 - A ausência de poder decisório por comodidade de expressão. Com efeito, o juízo formulado por este órgão envolve uma decisão que até produz efeitos, com a única diferença que estes efeitos não são susceptíveis de alterar directa e imediatamente a situação jurídica que é objecto de queixa.

Introduzida em Portugal na fase pré-constituinte, pelo Decreto-Lei n.º 212/75, de 21 de Abril, a figura do Provedor de Justiça ficou consignado no artigo 24.º, hoje (após 1982), artigo 23.º da Constituição.
Para o Prof. Jorge Miranda, presidiu à constitucionalização - fenómeno até então nunca verificado em Direito comparado, apesar da relativa antiguidade do instituto nos países nórdicos - o objectivo geral, assumido pela Assembleia Constituinte, de salvaguarda dos direitos fundamentais após 48 anos de regime autoritário e de defesa contra tentativas de instauração e de defesa contra tentativas de instauração de regimes análogos, fossem quais fossem as suas tendência ideológicas.

Tem-se colocado recentemente a questão da convivência e da eventual (In) constitucionalidade dos chamados provedores sectoriais.
Para o Prof. Jorge Miranda o cerne da questão não reside na forma de designação, designadamente do defensor do contribuinte, reside antes no facto de a Constituição lhe ter consagrado uma reserva de competência: "há uma reserva constitucional de competência em favor do Provedor de Justiça quanto à apreciação não contenciosa de queixas por acções ou omissões dos poderes públicos que afectem os direitos dos cidadãos. E o defensor do Contribuinte infringe esta reserva".
O autor coloca a questão inclusive sobre o que aconteceria se, além do Defensor do Contribuinte, houvessem sido criados e postos a funcionar os múltiplos Provedores que, desde 1975, têm sido propostos: Provedor para as Forças Armadas, Promotor Ecológico, Provedor do Consumidor, Provedores Municipais, Provedor da Criança, Provedor das Pessoas Idosas. Ou imagine-se que, na sequência do Defensor do Contribuinte, se retomariam algumas destas figuras ou que surgiriam outras, designadamente a nível das regiões autónomas.
O Prof. Jorge Miranda interroga-se ainda sobre a que ficaria reduzido o Provedor de Justiça? Para que serviria firmá-lo como órgão constitucional do Estado?
A Professora Lúcia Amaral sobre este assunto revela uma maior abertura (In "O Cidadão, o Provedor de Justiça e as Entidades Administrativas Independentes) sublinhando