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II SÉRIE-C — NÚMERO 16

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Contexto das Políticas

A Sociedade Portuguesa tem uma longa História de relação com comunidades etnicamente e culturalmente

diversas. Séculos de colonização, a descolonização e a imigração dos Países Africanos de Língua Oficial

Portuguesa após 1974, levou a que hoje existam muitas pessoas portuguesas afrodescendentes que não são

imigrantes. Entre 2007 e 2017, com a alteração à lei da nacionalidade de 2006, cerca de meio milhão de pessoas

tornaram-se portuguesas, entre elas muitas de origem africana e brasileira.

Às legítimas expectativas de igualdade de oportunidades das pessoas afrodescendentes, juntam-se as

necessidades imperiosas de inclusão, em áreas como a habitação, educação e emprego, das comunidades

ciganas, a única minoria étnica autóctone, radicada em Portugal desde o século XV.

Acresce ainda o facto do atual contexto social e político, nacional e europeu, diferenciar-se daquele que se

vivia na década de 90 do século XX, quando em Portugal foi desenvolvido um forte investimento nas políticas

de integração de imigrantes.

A realidade atual das minorias étnico-raciais, nomeadamente a existência de cada vez mais pessoas

afrodescendentes portuguesas e de haver uma maior consciência por parte destas pessoas, mas também das

comunidades ciganas da sua condição de discriminação com base na sua origem étnico-racial, exige da parte

das políticas públicas uma diferenciação clara entre imigração e estas comunidades de portugueses e

portuguesas.

Esta perspetiva esteve muito presente nas audições a especialistas.

Diz Miguel Vale de Almeida, Professor do ISCTE, “A primeira premissa que precisa de ser esclarecida já foi

aqui repetida várias vezes e tem a ver com a necessidade de nós, conceptualmente, distinguirmos migração de

racismo e distinguirmos as questões que afetam as populações migrantes — e que são questões absolutamente

importantes, nenhum de nós está a diminuir isso — mas que, conceptualmente, se separam, embora às vezes

se sobreponham, mas nem sempre, das questões que têm a ver com o racismo na sociedade portuguesa, com

a existência de afrodescendência em Portugal e com o facto de a tal comunidade que imaginamos dever ser

imaginada como uma comunidade que é também afrodescendente”.

Cristina Roldão, Professora da ESE (Escola Superior de Educação) de Setúbal afirma, “Acho que esse é um

dos grandes desafios, quer do ponto de vista da forma como concetualizamos as desigualdades na sociedade

portuguesa, quer do ponto de vista da formulação de políticas. Uma distinção clara e efetiva entre políticas de

imigração e políticas de combate ao racismo. (…) Precisamos de uma estrutura independente e autónoma da

pasta das migrações e do combate à pobreza, que se debruce especificamente sobre a questão do racismo e

das desigualdades étnico-raciais na sociedade portuguesa e que seja liderado por pessoas e por representantes

das comunidades que sofrem mais discriminação em Portugal”.

Maria do Rosário Carneiro, Professora da Universidade Católica, diz: “Não compreendo como é que as

questões da comunidade cigana portuguesa estão incluídas no Alto Comissariado para as Migrações. É

qualquer coisa que eu não consigo compreender. Não são estrangeiros, são portugueses. Portanto, as suas

questões e a tutela das políticas públicas que dizem respeito a esta comunidade não pode depender de um

organismo que se ocupa com questões como sejam as das migrações. Não são migrantes! É uma comunidade

residente em Portugal há mais de 500 anos. É portuguesa, não é? É portuguesa!”

O Alto-comissário para as Migrações, Pedro Calado, na sua intervenção, refere programas e políticas no

âmbito do racismo, da discriminação étnico-racial e da interculturalidade na estrutura orgânica do Alto

Comissariado e que se foram perdendo, ao longo dos anos, no seu nome, as referências a esses contextos,

sendo hoje designado Alto Comissariado para as Migrações.

Este aspeto, não é só relevante para uma melhor eficácia das políticas públicas, mas é também um fator

muitíssimo importante para que não haja radicalização do discurso étnico-racial, quer da comunidade maioritária,

quer dos que são alvo de discriminação, e que todos possam ser e sentir-se parte da construção de uma

sociedade inclusiva e tolerante.

Durante as audições realizadas há um aspeto recorrente em todas elas, o facto de não haver dados

estatísticos de caracterização étnico-racial em Portugal e de estarmos a trabalhar com dados de imigração que

não incluem as e os nacionais que fazem parte destes grupos da população.

Esta constatação foi muito evidente, não sobre a forma como os dados devem ser recolhidos, apesar de

haver referências a este tema, - uma vez que os trabalhos do relatório foram coincidentes com o Grupo de

Trabalho que estudou a opção de inclusão de uma pergunta sobre origem étnico-racial nos Censos de 2021 e