80 II SÉRIE - NÚMERO 5-RC
capacidade eleitoral sem qualificativos comporta por si, em termos genéricos e definitórios, a capacidade eleitoral activa e passiva nos termos a definir pelo legislador ordinário.
Naturalmente que a definição dos contornos desta possibilidade seria sempre remetida para a lei específica, e aí radica a razão de não termos avançado desde logo com uma definição mais rigorosa do que é que se entende por estrangeiros. Posso até adiantar-lhe, a Ululo pessoal, que entendo que os estrangeiros a quem poderia ser concedida desde já capacidade eleitoral seriam os residentes no território nacional portadores de bilhete de identidade de cidadão estrangeiro oriundos dos países da CEE, e, portanto, observando as regras vigentes de fixação de residência em Portugal previstas na lei. Exigir-se-ia sempre uma fixação no território e uma certa familiaridade com os problemas que são colocados numa eleição deste âmbito.
Quanto à questão de a exigência da cláusula de reciprocidade ser um elemento enfraquecedor das justas aspirações dos emigrantes, devo dizer-lhe que, salvo melhor opinião, o facto de não se exigir a reciprocidade não constituiria em si, e não por si, nenhum reforço dessas justas aspirações, porquanto a circunstância de se definir logo à partida e em termos unilaterais por parte do Estado Português na Constituição a disponibilidade para aceitar um tal princípio é que reforça precisamente essas aspirações e essa reivindicação dos emigrantes portugueses. Aliás, esta orientação insere-se, naturalmente, num movimento que existe no âmbito das Comunidades Europeias no sentido de conceder esse direito sem excepção.
Portanto, o que em última instância este artigo pressupõe são acordos bilaterais neste sentido. Sc, entretanto, o Parlamento Europeu vier eventualmente a adoptar recomendações nesse sentido e a Comissão perfilhar mesmo directivas nestas matérias que tenham de ser acolhidas pelos Estados membros na sua origem jurídica interna, a ressalva da cláusula de reciprocidade cairá por natureza.
O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Sr. Deputado, penso que com essa formulação resultará daí uma lei regulamentadora ou não.
O Sr. António Vitorino: - É claro, Sr. Deputado, que pode sempre o Governo, ou melhor a Assembleia da República, que tem reserva exclusiva de competência legislativa sobre esta matéria, entender que não deveria num dado momento usar dessa faculdade constitucional, que não apresenta uma obrigação de facere. Porém, o que se passa no meu entendimento é que sem esta norma constitucional a Assembleia da República nunca poderia, por lei ordinária, conceder essa capacidade eleitoral (activa ou passiva). O que pretendemos e que se consagre uma faculdade constitucional que a Assembleia da República poderá usar ou não, consoante melhor o entenda.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Macedo e Silva.
O Sr. Miguel Macedo e Silva (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em relação a esta matéria, o Grupo Parlamentar do PSD, apesar de a entender e compreender, não tem uma posição preconceituosa. De facto, repilo, entendemos e compreendemos esse movimento que perpassa pela Europa, nomeadamente pelos países da Comunidade Económica Europeia. Julgo que, por exemplo, em França já existe um dispositivo legal similar, embora abrangendo só a capacidade eleitoral activa, pelo que, ainda que não tomemos posição neste momento em relação a esta matéria, estamos abertos a discutir este ponto de vista do PS e a tomar a posição que na altura conveniente julgarmos mais própria no que concerne a este ponto.
Era esta a posição que queríamos expressar relativamente a esta proposta de aditamento ao artigo 15.°
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Santos.
O Sr. Almeida Santos (PS): - Sr. Presidente, desejo apenas fazer duas precisões, pois o Sr. Deputado António Vitorino já disse tudo, e bem.
Assim, chamo a atenção para dois pormenores, que passo a referir.
O primeiro pormenor é o de que a lei pode atribuir "a estrangeiros" e não "aos estrangeiros" e, portanto, pode discriminar alguns de entre os estrangeiros, no sentido de ver a quais interessa atribuir uma faculdade ou impor uma obrigação. Aliás, já se disse que, ao mencionar-se a capacidade eleitoral sem se distinguir se é activa ou passiva, essa é uma opção que se deixa ao legislador. De facto, ela abrange as duas e não compromete nenhuma das soluções.
O segundo pormenor é o de que se não tomarmos esta atitude pode acontecer que, quando exista uma norma da CEE nesse sentido, encontre uma norma de sentido inverso na Constituição, porque hoje só os cidadãos portugueses podem eleger e ser eleitos para as autarquias. Vale, pois, a pena eliminar uma ocorrência dessa ordem.
O terceiro pormenor prende-se com o facto de eu julgar, sinceramente, que deveríamos colocar toda a ênfase na reciprocidade. Isto é, que não podemos deixá-la cair pela razão simples de que, sendo Portugal um país de emigração e não de imigração, os estrangeiros são muito poucos no território nacional. Como é óbvio, não há entre nós muitos imigrantes estrangeiros, pelo que, tendo Portugal muitos emigrantes no exterior só podemos ganhar com o "negócio". (Entre aspas, como é óbvio.)
De facto, temos 3 ou 4 milhões de cidadãos no exterior que ganharão o direito de votar e, em troca, muito poucos estrangeiros ganharão igual direito em regime de reciprocidade. Portanto, a reciprocidade e um tópico fundamental da razão de ser deste dispositivo.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, creio que as respostas às perguntas colocadas pelo Sr. Deputado Herculano Pombo adiantaram já um conjunto de observações que, de outra forma, teria gostado igualmente de propiciar.
Ora, julgo que está de facto subjacente a este normativo uma grande opção e também muitíssimos pormenores. A discussão destes é, porventura, supérfula neste momento, mas a da grande opção também origina demarcações bastante simples de fazer. De facto, o PS coloca-se numa postura de vanguardismo europeísta, que é, no fundo, um estandarte possível e perceptível. O PS foi aparentemente com essa redacção para além do próprio vanguardismo motivante. As correcções já adiantadas procuram naturalmente reajustar a alma e a forma, que, aliás, têm a vantagem de estar casadas.
Entretanto, creio que ficaram em aberto algumas questões que são talvez as mais motivadoras para o debate a estabelecer e que ficará em fermentação. Refiro-me ao acto de pensarmos na Câmara de Vila Real de Santo António, presidida pelo Mr. Smith, que é uma possibilidade real neste cenário.