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22 DE ABRIL DE 1988 169

A ideia fica aqui expressa e o debate provavelmente não ficará por aqui, mas o que nos importa não é propriamente ver aprovada uma proposta nossa, pois não é essa a nossa glória. A nossa glória e o nosso prazer seriam que, de facto, os cidadãos em Portugal, através deste processo ou de outros mais justos que se venham a descortinar, exerçam em cada dia o dever e o direito que têm à salvaguarda da qualidade de vida e do ambiente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, como ainda não me pronunciei sobre a proposta de aditamento apresentada pelo Partido Ecologista Os Verdes, vou fazê-lo agora, o que será extremamente fácil, porque me impressionou apenas um aspecto: o tem com que foram à partida consideradas inaceitáveis ou, pelo menos, merecedoras de uma não benevolência algumas das ideias de criação de novos mecanismos institucionais para a realização de certos fins de tutela da legalidade e, no fundo, da constitucionalidade da actuação da Administração Pública. Assim, creio que é preciso actuar nesse campo, naturalmente não no sentido da pulverização inextricável, infindável e incriteriosa dos mecanismos existentes, conhecidas que são até as carências de afinamento dos mesmos, mas julgo que seria útil ter alguma humildade na consideração de que, face ao panorama das carências, o "fechamento" da reflexão sobre o afinamento de meios institucionais é pelo menos prematuro.

Por outro lado, o atirar de pedras nesta matéria não é recomendável pela experiência e pelas responsabilidades políticas de cada um de nós. Por exemplo, o Provedor de Justiça é uma entidade que pode desempenhar um papel extremamente relevante no combate à corrupção, mas isso não impediu que alguns dos que aqui se sentam tivessem entendido na altura apropriada - o que seguramente não lhes pode ser censurado - que era relevante criar a Alta Autoridade contra a Corrupção (AACC). Dir-se-á: "Mas porquê, senhores, se há a Polícia Judiciária, o Ministério Público, os Tribunais, o Provedor de Justiça e tantos outros meios?" Poderia terçar armas, se estivéssemos em hora de fazer caricaturas ominosas, utilizando todos os argumentos que aqui foram usados contra o promotor ecológico. "Mas porquê? Quantas queixas contra a corrupção foram feitas ao Provedor de Justiça?" - diria eu, como disse o Sr. Deputado Vera Jardim. Pulverizar é abalar, é invadir a esfera privada. Pensem bem como este argumento se aplica maravilhosamente, se assim houver intenção, ao caso da referida Alta Autoridade. Ou seja, o argumento que o Sr. Deputado Alberto Martins utilizou seria facilmente torneável na redacção do preceito, se fosse caso disso.

Quero, portanto, dizer que naturalmente haverá ou poderá haver inconveniente na excessiva proliferação de meios utilizados. Por exemplo, há panoramas um tanto alucinantes em matéria de provedorias e ouvidorias em determinados países; inclusivamente, os nossos colegas brasileiros ponderam neste momento - já lá iremos - a criação dos mais diversos ouvidores, nomeadamente municipais e federais, de toda a espécie de ouvidores com competências latas semelhantes às detidas por típicos Ombudsman. Assim, é necessário ter cuidado nesta matéria, mas creio que esse cuidado não deveria ser tão terminante num país caracterizado por carências tão agudas em áreas básicas e em que precisamente as acções de massa, no sentido técnico, são tão infrequentes, dadas as nossas debilidades. Ouço falar aqui, com um tem orgulhoso, das acções grupais, num país que não as tem, e de que romper com o conceito tradicional de legitimidade consistiu num sonho constitucional em 1976, inconcretizado, até à data, em todas as esferas fundamentais. Bateu-se o PCP, anos a fio, por que se instituísse o direito à acção popular em relação a aspectos fulcrais, designadamente no tocante à defesa do sector público nos diversos domínios, mas infelizmente sem êxito. Também nos batemos pela instituição desse direito em esferas essenciais, incluindo a da defesa do consumidor, aqui com algum êxito parcial, mas não concretizado no terreno da lei ordinária, porque a Lei de Defesa dos Direitos do Consumidor é, em grande parte, letra morta.

Ora, traçarmos um panorama exaltante dos nossos milhões de consumidores e dos nossos milhões de atingidos por delitos ambientários os mais diversos, num país que não tem essa estrutura e, portanto, depende em grande medida da acção institucional organizada e de topo, a qual não vemos como resultante de modelos ou vontades de Minerva, mas como uma coisa importante para os cidadãos, parece-me francamente defeituoso. Neste sentido, a nossa posição é de prudente interesse por todas as manifestações, nomeadamente pelos 10 milhões de consumidores referidos pelo Sr. Deputado Almeida Santos e pelo promotor ou provedor ecológico.

Quanto a este último caso, penso que poderemos convergir todos na apreciação de que a respectiva designação pode até ser outra. Isto é, baptizar a "criança" trata-se de algo próprio da fada madrinha, mas realmente a palavra "provedor" é em português mais expressiva do que "promotor". Talvez os proponentes tenham pretendido - e o Sr. Deputado poderá esclarecer depois essa questão - não estabelecer qualquer confusão em relação à figura do Provedor, dizendo que Provedor só há um, etc. De qualquer modo, creio que essa prudente benevolência para a consideração de tudo poderia ter alguma utilidade.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Vitorino.

O Sr. António Vitorino (PS): - Apenas pedi a palavra porque, como o Sr. Deputado José Magalhães fez apelo a uma manifestação de consciência e de humildade, mas não deu bem provas disso na sua intervenção, julgo que não deveria deixar passar esta intervenção sem algumas observações.

Na realidade, poderemos lançar aqui um grito ou uma palavra de ordem "guevarista" ("criar um, dois ou três Vietnames") e criar um, dois ou três provedores para várias coisas, mas o que o Sr. Deputado José Magalhães não explicou - e isso é uma questão de política central - é a razão pela qual se propõe apenas criar o provedor ecológico, ou seja, considerar que deveremos retirar do Provedor de Justiça a área da ecologia e deixar na sua mão, a título residual, todas as