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19 DE MAIO DE 1988 347

meramente interpretativo a sugestão de redacção que há pouco fiz. No entanto, se quisermos fazer uma leitura das realidades que estão subjacentes a esta norma e à forma como ela tem sido o álibi para certo cerceamento de direitos dos jornalistas, compreenderemos então que a clarificação do texto constitucional ajudaria, porventura e muito, a resolver certas interpretações indevidas deste preceito constitucional.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Eu compreendo, Sr. Deputado Jorge Lacão, mas, como sabe, em sede de revisão constitucional as propostas podem ser aprovadas e podem não sê-lo e considero eminentemente negativo que se façam as chamadas clarificações abortadas em matérias em que a clareza é completa. Isto ó, não vou adiantar nenhum texto cuja rejeição possa ser objecto - e digo isto com toda a franqueza e com a máxima transparência que é possível - de interpretações perversas em matérias em que a interpretação sustentada através de tal proposta é dificilmente controvertível. E, neste caso concreto, não conheço ninguém que sustente que o facto de um órgão ser detido por entidades deste tipo acarrete uma supressão dos direitos dos jornalistas, salvo se eles forem para a realização da sua estrita finalidade. É óbvio que seria absurdo que o órgão central de um partido político fosse regido por princípios ou por regras que conduzissem à inversão das suas finalidades. Eu não pretendo, de maneira nenhuma, que um comunista seja jornalista do Povo Livre - é óbvio - e, seguramente, o contrário também será verdade.

Por outro lado, em relação às confissões religiosas, é evidente que o xintoísta não aspira a dirigir ou a participar na definição da orientação de um jornal católico...

O Sr. Costa Andrade (PSD): - E daí não sei!

O Sr. José Magalhães (PCP): - ... a não ser que entremos em teses ecuménicas e de comunhão geral, em que o xintoísta abraça o budista e o budista o católico, querendo todos dirigir o mesmo jornal e intervir na definição da linha do respectivo, o que será, seguramente, uma grande confusão. Isso será diferente da liberdade religiosa e está fora do alcance do artigo 38.º

Portanto, Sr. Deputado Jorge Lacão, fiat lux, mas onde haja trevas!

O Sr. Almeida Santos (PS): - Não há defesas contra interpretações estúpidas!

O Sr. José Magalhães (PCP): - O Sr. Deputado Almeida Santos acabou de sublinhar que não há defesas contra interpretações estúpidas. É óbvio! A grande tragédia do legislador e das pessoas em geral e essa. Agora, no quadro da revisão constitucional e quanto a interpretações clarificadoras, creio que há que ter a atitude que enunciei. Estamos, obviamente, disponíveis para estudar, com detalhe e com a preocupação que o Sr. Deputado Almeida Santos agora também enumerou, a proposta agora adiantada pelo Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, suponho que não devemos ter sempre necessariamente uma visão trágica da vida - para parafrasear um título célebre -, e já de manhã tive a oportunidade de expressar, com grande franqueza, as razões que justificaram a proposta do PSD. No entanto, gostaria ainda de fazer duas observações muito sucintas.

A primeira, que é dirigida particularmente à intervenção do Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca, é que me parece importante termos sempre em atenção - e não estou a dizer que a não tivesse tido, mas apenas para o sublinhar e para que fique registado - que uma coisa é a legislação ordinária e outra é a legislação constitucional.

Ora, quando se suprimem determinadas matérias em termos constitucionais isso não significa que na legislação ordinária se reproduzam necessariamente as mesmas supressões ou se façam as mesmas alterações. Há problemas de rigidez, de garantia e de obrigatoriedade, e sobretudo de sentido axiológico ao nível da Constituição - isso é óbvio-, mas quando fazemos a revisão da Constituição não deveríamos estar a proceder ou a julgar que procedemos à alteração da legislação ordinária e a regulamentar nesses termos de legislador comum, pois são ópticas completamente diferentes.

A segunda observação que gostaria de fazer, que tem também um carácter muito geral, é que, apesar de não terem tido o benefício de um artigo como o n.° 2 do artigo 38.° da Constituição, os súbditos de S. M. Britânica, os nacionais dos EUA, os Franceses, Alemães ou Belgas não dispõem de uma imprensa onde a liberdade seja, segundo parece ao observador, menor do que aquela que existe em Portugal. E, sobretudo, há muitos anos que não se registam, como se registou em Portugal, casos como o caso República.

Consequentemente, não façamos - na minha interpretação - uma correlação necessária entre os progressos que têm de ser feitos e os dispositivos constitucionais deste género, muito embora isso não signifique também, necessariamente, que o n.° 2 do artigo 38.° seja nocivo, pois isso é matéria de opinião. Penso que - e alguns de VV. Exas. entenderão que não - a análise dos sistemas comparados em matéria de direitos fundamentais não é de molde a justificar uma visão para utilizar uma terminologia cara a um Sr. Deputado aqui presente abracadabrante.

Tem a palavra o Sr. Deputado António Vitorino.

O Sr. António Vitorino (PS): - O Sr. Presidente fez uma observação carregada de razão, mas que vê apenas algumas árvores. Não está a considerar a floresta toda, porque nós também poderíamos invocar que, nesses regimes que o Sr. Presidente referiu, a questão do estatuto da informação é considerada como uma questão de regime político fundamental onde existem acordos alargados quanto às regras fundamentais do jogo que não estão sujeitos as trampolinices em que temos vindo a viver em Portugal nesta matéria, apesar do n.° 2 do artigo 38.° O que não significa nem nunca poderá significar, portanto, que a forma de preservar o respeito pelos princípios seja a eliminação das normas constitucionais que os consagram. Não há uma tradição legicista em Portugal no sentido de que a lei resolve todos os problemas.

O Sr. Presidente: - Por acaso, acho que há.

O Sr. António Vitorino (PS): - Sr. Presidente, o que não há é a garantia de que o facto de se verter um determinado princípio numa norma escrita da lei por si só resolva todos os problemas práticos que se podem colocar. Todos nós, uma vez ou outra, temos lido essa ilusão, mas não há nenhuma garantia prática de que assim seja e o ónus da prova é: em que medida é que se garante melhor o respeito pelos princípios que nos são comuns, não estando contidos numa norma constitucional. Por isso é que, Sr. Presidente, me parece, com o devido respeito, que o