O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

442 II SÉRIE - NÚMERO 15-RC

Portanto, o sistema português não é único, mas não é uma aberração. Terá sido, quando muito, pioneiro. Aquilo que devemos fazer não é desmantelá-lo, mas, quando muito, ter algum orgulho em que haja quem vá na nossa esteira - porque é verdade que há quem vá na esteira do sistema português. O que me impressiona é que haja quem se comporte neste momento como se nada disto ocorresse e como se estivéssemos a discutir virginalmente uma Constituição para Portugal em mil novecentos e setenta e qual* quer coisa - não é, estamos em 1988! -, numa espécie de batalha entre duas concepções de vida e do mundo, na qual cada um fica com a sua razão, naturalmente: nós sentados num lado da bancada, o PSD seguramente sentado no lado oposto, ou vice-versa. Isso é o contrário daquilo que deve ser um debate de revisão constitucional! A revisão constitucional não é seguramente para fazer a Constituição do chefe, a revisão constitucional não é seguramente para fazer a Constituição de um partido - é, precisamente, uma troca de pontos de vista que conduza a uma Constituição que há-de ser, obrigatoriamente, de todos numa medida partilhável.

Ora não se chega a sítio nenhum, concluindo um debate - ou procurando concluí-lo - com uma afirmação tão peremptória e tão serena como a que o Sr. Presidente fazia há pouco, em nome da bancada do PSD, presumo. Primeiro axioma: "Os tempos de antena são maçadoríssimos."; segundo axioma: "Suportar esse gravame, que seja o mínimo possível e reduzido à mais ínfima expressão."; terceiro: "O serviço público que o aguente."; quarto: "Não há qualquer possibilidade de casar concepções de vida tão diferentes - cada qual faça as práticas que quiser e se consorcie com quem entender. Eia, avante! Vamos para o artigo seguinte!" E que os cidadãos tenham o direito imorredouro a fechar o botão (o que é algo inquestionável - têm o direito inalienável a fechar o botão!)...

O Sr. Presidente: - Ah! Pelo menos, esse!

O Sr. José Magalhães (PCP): - É nossa batalha e desafio garantir que ele deseje abrir o botão à hora em que nós estamos lá. E que não tenha sempre pela frente a cara do Primeiro-Ministro, como sucede que tem, dentro do sistema que o PSD exigiu e pretende manter e perpetuar. Por isso é grave o desmantelamento do direito de antena! É que este direito é o contrário, precisamente, de tudo isso - é a possiblidade de ver na televisão outras caras que não são a cara do poder, outras vozes que não a voz do poder, sobretudo a voz do partido no poder, que está em toda a parte. Eis as razões da nossa funda oposição às propostas do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vera Jardim.

O Sr. Vera Jardim (PS): - Não queria prolongar esta discussão por tempo inaceitável e, sobretudo, não queria entrar em discussão com VV. Exas. quanto à filosofia básica de que parte a proposta do PSD. Em todo o caso, duas ou três coisas queria deixar ditas aqui a propósito disto, que mereciam naturalmente uma discussão em conjunto de todo este articulado e que certamente ainda teremos ocasião de ter. Em primeiro lugar, estou inteiramente de acordo com V. Exa. 1, o direito de antena não é o deus ex machina que vai resolver todo o problema - muito mais importante é o direito de acesso e de veicular a livre opinião das várias tendências políticas, filosóficas, ideológicas, dos vários interesses que estão em jogo na sociedade. O que me parece importante é isso, e não propriamente a forma, o direito de antena, que, temos de aceitar, tem sido até, por vezes, uma "maçadoria" e até ridículo - aparece um senhor, que é da associação empresarial de não sei quê e, como tem não sei quantos segundos, a única coisa que diz é: "Inscreve-te, depressa!", a ver quando acabam aqueles segundos; não me parece que seja isso muito importante a salvaguardar.

O que também não queria deixar em claro é que esta fúria liberalizante das propostas do PSD, que transparece em todos estes artigos que dizem respeito à comunicação social, também não se resolve com a simples chamada de atenção para o que se passa na Europa das democracias que queremos idêntica à nossa, ou que nos queremos idêntica a ela. Porque V. Exa. sabe que também nessa Europa as pessoas estão preocupadas com coisas como, por exemplo, o domínio, dos meios de comunicação social, com a concentração dos meios de comunicação social em grupos económicos; estão preocupadas com uma série de problemas que nos provam, penso eu, que não é a mera liberalização que vai resolver o problema. Não podemos desconhecer que a liberalização assenta numa certa sociedade que tem certas forças económicas, que tem jogos de poder económico, que tem, na verdade, muito mais acesso aos meios de televisão ou de rádio do que tem a generalidade dos interesses sociais e económicos nessas sociedades. Portanto, também não me parece, salvo o devido respeito, que a questão se possa resolver apenas dizendo: "Vamos alegremente para a Europa!", porque a Europa não está tão alegre como isso, nem tão calma como isso, no que diz respeito à França, à Alemanha, à própria Inglaterra da Sra. Thacher - aí temos um bom exemplo, porque, no que diz respeito aos canais do Estado na televisão britânica, vemos o que é criar as condições de acesso à opinião pública e às várias camadas da opinião pública a esses meios de comunicação social.

Temo é que a liberalizar tudo, esquecendo em que sociedade nos encontramos, que vivacidade tem essa sociedade, quais os grupos que se movimentam na sociedade portuguesa, corramos o perigo de daqui algum tempo o próprio PSD ser ultrapassado pelos acontecimentos e de a sua teoria ter não um reflexo, na prática, exactamente idêntico àquele que se visionava, numa filosofia que não discuto - não vou discutir filosofias -, mas não pode perder de vista a sociologia em que se movimenta. Era só isto o que queria dizer.

O Sr. Presidente: - Penso, Sr. Deputado Vera Jardim, que as considerações que produziu são muito interessantes, porque não gostaria que os Srs. Deputados ficassem com uma ideia errada de que pensamos que, pela mera supressão de algumas expressões mais estatizantes ou mais colectivizantes, o problema fique resolvido - é evidente que não fica. Não pensamos que a sociedade se modifique por um decreto, nem por uma revisão constitucional, isso é óbvio! Por outro lado, também é verdade que estes problemas de equilíbrio e de garantia de concorrência das forças políticas e das forças sociais, dos grupos de pressão - entendida a expressão num sentido amplo - são questões essenciais para o funcionamento da democracia pluralista. Sobretudo se tomarmos em atenção esse aspecto da concorrência entre os partidos, tão bem salientado, por exemplo, por um autor como Schumpeter que V. Exa. muito bem conhece.

Mas o que eu quiz dizer foi basicamente isto: em primeiro lugar, o nosso modelo explicativo não assenta na atitude essencial, es ta tis ta, de consignar na lei e cometer ao Estado a tarefa de resolver o problema. Pensamos que esse