O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

3 DE JUNHO DE 1988 441

mas, evidentemente, são concepções diversas, estão clarificadas, e não penso que se justifique muito estarmos a discutir opções filosófico-políticas radicalmente diferentes. Tem a palavra o Sr. Deputado Herculano Pombo.

O Sr. Herculano Pombo (PEV): - Queria fazer-lhe uma pergunta, no seguimento do que V. Exa. acaba de dizer. De facto, as pessoas hoje em dia tem essa possibilidade, até técnica, de mudar para outro canal.

O Sr. Presidente: - De fechar o botão! Não há o "Big Brolher", é uma vantagem.

O Sr. Herculano Pombo (PEV): - Mas não lhe parece que seria melhor solução se na generalidade dos tempos de antena - não digo em todos, porque não se pode obrigar ninguém a ter qualidade - o cidadão comum encontrasse qualidade, na maneira como a mensagem é veiculada, como se verifica com alguma frequência nos spots publicitários, e isso até justifica a existência de cadeias de televisão a viver exclusivamente de spots publicitários? Se resolvêssemos esse problema, em vez de pegarmos nessa justificação para tentar restringir o direito ao tempo de antena, não lhe parece que determinado tipo de entidades, como por exemplo, uma estação de rádio privada, poderá até rentabilizar, em termos económicos, o seu espaço com a utilização do tempo de antena e de direitos de resposta devidamente bem feitos e respondendo, de facto, a questões de actualidade?

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Herculano Pombo, eu dir-lhe-ía muito simplesmente o seguinte: que eu saiba, não houve nenhuma imposição constitucional que obrigasse as rádios e a televisão a transmitir spots publicitários. Portanto, não é por essa circunstância que os tempos de antena são tão maçadores como habitualmente são - não é pela circunstância de não estar na Constituição a obrigatoriedade de todo o cidadão ouvir das tantas às tantas horas; isso depende da iniciativa e da capacidade das pessoas. O exemplo que deu é a prova manifesta da inutilidade dessa consignação para se obter esse resultado - não há consignação constitucional nenhuma a propósito de spots publicitários.

Mas a minha razão não é puramente sociológica; é mais profunda. O que eu disse foi que, como já se tem visto a outro propósito, há aqui um afloramento de uma concepção diferente acerca do papel que cabe ao Estado, às entidades públicas e à imposição, pela via da sua consignação constitucional, de direitos e naturalmente de deveres, e acerca daquilo que pensamos dever ser um espaço de liberdade onde joga a concorrência e a livre iniciativa. Não da iniciativa privada, propriamente dita, mas da sociedade civil, entendida como contraposta ao Estado, e aqui incluindo os partidos políticos, que são, justamente, uma zona de ligação entre a sociedade civil e o Estado. São concepções diferentes, repilo, não se justifica estarmos a impugná-las; não estou a contestar a sua e não se justifica que venha impugnar a minha, não a aceita, diverge dela - tem todo o direito disso, como naturalmente eu também tenho. Escusamos, porventura, de estar sempre a reiterar as mesmas coisas com uma adjectivação tersa.

O que eu sugeria era passarmos agora ao n.° 4.

Antes, porém, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, não pretendo adjectivar mais...

O Sr. Presidente: - Penso que já está bem adjectivado.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Queria só exprimir uma preocupação. A ninguém sobrará dúvidas de que não há, entre os partidos com assento na Assembleia, uma identidade de pontos de vista, não só quanto à forma como se pode dar vida a tempos de antena, como quanto ao modo de lhes dar morte - em todo o caso, se morte for, é suicídio, praticado pelas próprias mãos (em certo sentido, será merecido ou imerecido). Mas há formas objectivas de apurar essa sentença e esse julgamento. O que me preocupa, não é isso.

O Sr. Presidente: - As eleições têm servido para isso, não é verdade?

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente Rui Machete, as eleições têm servido para muita coisa e o PSD está bastante preocupado com esse fenómeno, por isso está a tratar de alterar as regras do jogo nessa matéria. O que se passa em relação aos tempos de antena é outra coisa - é que é realmente possível, a partir de uma concepção como a que aqui foi expressa, imaginar um sistema inteiramente diferente e até oposto ao que vem consignado na Constituição.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Magalhães há pouco esqueci-me de referir um ponto importante: pareceu-me, da exposição de alguns dos Srs. Deputados, que país onde não haja direito de antena, consignado nestes termos, não tem democracia. Ora, se V. Exa. percorrer os diversos países de democracia pluralista, verificará que esses países não têm direito de antena, portanto, esse argumento não é invocável a vosso favor. Peço desculpa pela interrupção.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Creio que é muito pertinente fazer uma reflexão aberta, portanto sujeita ao princípio do contraditório, sobre essa matéria, precisamente porque é possível imaginar um sistema em que cada qual tenha a antena que possa. Se alguém quer - imaginemos isto à americana - um spot em que diga que é o melhor do mundo, paga obviamente não sei quantos milhares de dólares por esses spot, coloca onde pode e nisso fará assentar os seus esforços de campanha, as suas fontes de financiamento, as suas sessões de brain storming, e por aí adiante - é essa a regra! Agora que se diga que essa é "a regra mais democrática de todas", que essa não deixa de fora do direito de antena grupos sociais e gentes cujas ideias políticas não serão propriamente irrelevantes nem imerecedoras de consideração e de veredicto, através de sufrágio, isso parece-me, francamente, sem o mínimo fundamento. Mais ainda, a própria prática dos sistemas políticos em que isso ocorre revela a formação de correntes de opinião, precisamente no sentido de estabilizar e garantir formas de expressão para as minorias, formas de expressão para todos, para qualquer, independentemente da sua procedência ideológica, política e por aí adiante - o que será, sem dúvida, um caminho para o futuro e não um caminho involutivo. Mais, nos países das Comunidades, os esforços no sentido de conseguir na trincheira pública, na esfera pública, a aquisição de posições susceptíveis de serem desfrutadas por todos, em função da corroboração pelo eleitorado da sua representatividade, é -como o Sr. Presidente e os Srs. Deputados sabem perfeitamente - uma das tendências dos últimos decénios, e uma tendência seguramente positiva. Não por acaso se avança para soluções como o reembolso das campanhas, não por acaso se avança para fenómenos como o acesso gratuito a estações de rádio e de televisão, através de fórmulas variáveis.