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474 II SÉRIE - NÚMERO 16-RC

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Sottomayor Cárdia.

O Sr. Sottomayor Cárdia (PS): - A condenação do fascismo está bem no preâmbulo e está sobretudo bem na Constituição enquanto sistema normativo. A memória histórica é útil e justificável também quanto a este ponto. Mas não só quanto a este. Porque não a memória histórica da regeneração? Estamos um pouco na regeneração, quem sabe se a caminho do cabralismo. A memória histórica é justa, é útil e é necessária. Todavia, a memória das ditaduras e da resistência às ditaduras não se protege através de proibições; a memória revigora-se na polémica e a polémica supõe o interlocutor.

Quanto à proposta do CDS, do meu ponto de vista - indo um pouco mais além do que o Sr. Deputado Vera Jardim -, trata-se de uma proposta que, muito embora seja proveniente de um partido plenamente democrático que preza os valores democráticos tanto como aqueles que entre nós mais os prezam, não é apenas excessivamente perigosa, é exclusivamente perigosa.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, damos por encerrado este debate, que foi aliás muito interessante, passando de seguida à apreciação dos n.ºs 5 e 6 da proposta de alteração o artigo 46.°, apresentada pelo PCP.

Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): - A proposta de aditamento de um n.° 5 ao artigo 46.º visa dar resposta a uma questão que nos parece actual e flagrante no panorama da realidade associativa portuguesa. Se podemos constatar que a liberdade de associação em Portugal sofreu, precisamente com o derrube do fascismo, um florescimento decorrente da supressão das numerosas peias que administrativizavam a sua própria possibilidade de expansão, que tolhiam a criação, - que estabeleciam entraves à organização e ao funcionamento, é, no entanto, verdade também que, no plano legal, se fez o conjunto de avanços que todos podemos constatar. Subsistem porém, muitos anos decorridos sobre o 25 de Abril, problemas de acautelamento - e garantia material até, já não digo de incentivo - ao pleno exercício daquilo que constitui uma liberdade eminente dos cidadãos e das pessoas.

A fórmula que escolhemos para sublinhar a ideia de que devem ser suprimidos ou de que não podem ser invocados regimes de carácter administrativo ou fiscal para afectar a liberdade de associação, tolhendo-a impedindo-a, buscou claramente inspiração no próprio articulado da Constituição, noutra sede, noutro passo. Refiro-me concretamente ao facto de, no artigo 38.°, n.º 6, a Constituição ter tido a preocupação de sublinhar que a liberdade de imprensa não deveria ser tolhida por nenhum regime administrativo ou fiscal, aditando neste caso "nem política de crédito ou de comércio externo". Eis pois o que fizemos. Essa fórmula tem a mesma preocupação e a mesma matriz da fórmula do dispositivo que citei, tendo o cuidado de apontar para a supressão de certos entraves de carácter administrativo subsistentes e, naturalmente, para a proibição de criação de entraves de carácter fiscal que onerem ou agravem a possibilidade de criação de associações. Em meu entender, os limites de uma fórmula deste tipo são patentes, isto e, o legislador ordinário não está manietado de estabelecer regras e formas de enquadramento para o exercício da liberdade de associação. A criação de associações não leria que ser obrigatoriamente gratuita, e não obstante poderem definir-se, caso seja obtido consenso, diferenciações de regime, seria, porém, estabelecido um critério, um princípio enquadrador e uma limitação genérica à criação de limitações à liberdade de associação.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vera Jardim.

O Sr. Vera Jardim (PS): - (Por não ter falado ao microfone, não foi possível registar as palavras iniciais do orador)... justificar os n.ºs 5 e 6.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Só o n.° 5, Sr. Deputado.

O Sr. Vera Jardim (PS): - Só o n.º 5. Sr. Presidente, não sei se não valeria a pena justificar os n.ºs 5 e 6.

O Sr. Presidente: - Eu tinha posto à discussão ambos os números; o segundo é um natural prolongamento do primeiro, é uma espécie de concretização do princípio.

Sr. Deputado José Magalhães, talvez seja melhor justificar também o n.° 6.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Não vejo razão nenhuma para não adiantar essa justificação, uma vez que é desejo e legítima pretensão do Sr. Deputado Vera Jardim.

O n.º 6 contempla um outro problema que nos parece bastante grave, assumindo uma dimensão que, inclusivamente, se nos afigura preocupante no contexto da nossa vida associativa. Está fora de questão que o Estado possa atribuir a associações isenções e benefícios. A nossa lei ordinária é uma montra de criação de isenções e benefícios dos mais diversos tipos. Recentemente, a Lei das Associações de Estudantes pôde contemplar uma panóplia de benefícios desse tipo, respeitantes quer a tarifas especiais, quer a facilidades diversas, quer a apoios de carácter técnico e logístico, etc. E, em nosso entender, seria extremamente benéfico que se clarificasse que a atribuição pelo Estado de isenções de qualquer natureza e de outros benefícios tivesse de respeitar desde logo o princípio da igualdade. Trata-se de um critério inarredável cuja violação traduziria uma grave perturbação de um elemento de equilíbrio basilar, que nesta esfera deve ser respeitado.

Mas há uma outra face de tudo, sendo, neste caso, a outra face do apoio, a sujeição. É extremamente grave que o facto de uma entidade de carácter privado beneficiar de um qualquer regime de apoio implique a sujeição a uma gama de deveres que não sejam senão aqueles que possam qualificar-se como necessários, adequados e proporcionados. Não adoptámos uma formulação pela positiva, mas sim uma formulação pela negativa, proibindo os deveres desnecessários ou desproporcionados. Naturalmente ao fazê-lo, não pudemos deixar de ter em conta a elaboração legal entretanto adquirida ao longo destes anos. Durante muito tempo, cogitou-se entre nós se seria legítima e se teria cobertura constitucional a atribuição pelo Estado a determinadas associações de um estatuto que as distingue das demais pelo facto de lhes propiciar determinados benefícios. Questionou-se se esta situação não introduziria uma fortíssima distorção, uma violação da própria regra que deve presidir ao florescimento do tecido associativo e uma ingerência indébita do Estado na esfera de actuação própria das entidades que se movem neste campo.

Essa dúvida, qualquer que seja a sua natureza e pertinência, não deverá senão levar-nos a procurar estabelecer certas cautelas: ou enveredaríamos por uma proibição absoluta de apoio, que é uma posição que não vejo