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13 DE JULHO DE 1988 733

justamente, neste preceito, de fazer ressaltar a possível menor congruência entre a alínea a) e a alínea e) suponha que se trata de - pelo nosso caminho e pela nossa via - dar uma interpretação mais exacta a esta alínea e) e não aquela interpretação que V. Exa. também admitiu como possível e que aos seus olhos também se antevê como recusável, que é a de gratuitidade geral, absoluta e obrigatória. Portanto, suponha que no domínio das hipóteses nós queremos modificar esta alínea e). Estaria V. Exa. aberto, do ponto de vista pessoal, não à sua eliminação, mas à sua modificação no sentido de que falou?

O Sr. Presidente:-Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): -Sr. Presidente, eu creio que facultaria ao Sr. Deputado António Vitorino um elemento situado nos antípodas daquele que acaba de ser lançado pelo Sr. Deputado Carlos Encarnação. Suponho que não precisaria de tal para poder fazer uma interrogação ou uma resposta complementar. Em todo o caso pareceu-me que a interpretação que fez do artigo 74.°, n.° 3, alínea e), é susceptível de um elemento de equivocidade. Sobre esse, e só sobre esse, gostaria de lhe fazer uma pergunta.

É evidente que a Constituição estabelece um objectivo último e obriga a um caminho para esse objectivo último. Não estabelece nem os modos, imperativamente, nem os tempos, nem obriga o Estado àquilo que os recursos de todo em todo lhe proíbam. Isto toda a gente sabe. Ninguém viu, até agora, nesta norma a instauração da felicidade na Terra e da gratuitidade para todos desde o Creso até ao indigente. Foi o Sr. Deputado Pacheco Pereira o primeiro, para os meus ouvidos pelo menos.

O Sr. Deputado António Vitorino, ao sublinhar o carácter tendencial e instrumental da norma constitucional, deixou-me uma preocupação apenas, e que é esta: a norma constitucional com o sentido que tem não deixa de implicar para o período curto uma certa obrigação de fixação de prioridades. Em quadro de escassez de recursos é evidente que o Estado tem de fazer opções, e portanto deve fazê-las à luz desse princípio, que o vincula a um determinado caminho, a um determinado objectivo. Deve começar por proteger os que mais carecem de protecção, deve começar por garantir gratuitidade em relação aos primeiros graus de ensino. Não faz sentido seguir outra política. O meio pode variar. A garantia do nobre objectivo de apoiar os filhos dos trabalhadores pode ser conseguido de muitas formas e, pela nossa parte, como V. Exa. sabe, temos preconizado o aumento da acção social escolar. Nunca se viu na nossa boca "não se dêem bolsas aos filhos dos trabalhadores"! É precisamente o contrário. Agora, o que isso implica é que se dê ao preceito constitucional um mínimo de sentido também em relação à fixação de prioridades e também em relação à protecção daqueles que mais carecem dela neste momento. Estará V. Exa. de acordo com esta razoável interpretação?

Gostaria de sublinhar também que me pareceu extremamente positivo que o Sr. Deputado António Vitorino procurasse deslocar a conversa e o debate para o terreno da plausividade e da razoabilidade. Realmente, discutir isto em lermos de saber quem está a favor ou quem está contra os trabalhadores a partir da degradada composição social da universidade no momento actual é delirante. Por isso, é urgente deixar de desconversar. Nesse sentido, a intervenção do Sr. Deputado António Vitorino é um regresso à discussão. Isso saudamos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Pacheco Pereira, ainda para formular uma pergunta.

O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Quero perguntar ao Sr. Deputado António Vitorino se esta norma constitucional não impede, por exemplo, o Ministro da Educação de alterar radicalmente a política da universidade, encarecendo drasticamente as propinas, no sentido de assentar na capacidade a política de acesso à universidade através das bolsas de estudo, que é, de facto, o princípio que penso estar na base da alínea d). Será que o Tribunal Constitucional remeteria a legislação que correspondesse a esta intenção? O que é que aconteceria se um ministro decidisse alterar radicalmente a política de financiamento do ensino universitário, aumentado drasticamente as propinas, e com o dinheiro que daí adviria conduzisse uma política de acesso ao ensino superior essencialmente assente em bolsas de estudo, por ser essa a forma de premiar a capacidade?

O Sr. Presidente: -.Tem a palavra o Sr. Deputado António Vitorino.

O Sr. António Vitorino (PS): - Sr. Presidente, muito rapidamente para dizer o seguinte: não creio que haja um problema de congruência entre a norma da alínea a) e a norma da alínea e), na medida em que são normas de natureza jurídica distinta. A norma da alínea a) e para mim, clara e tipicamente, uma norma de garantia; a norma da alínea e) é uma norma programática. Por outro lado, têm campos de aplicação distintos, pois enquanto a norma da alínea a) tem um campo de aplicação restrito e diz respeito ao ensino básico, a norma da alínea é) diz respeito aos demais graus de ensino, porque, por exclusão de partes, se a alínea a) garante a gratuitidade até ao ensino básico, a alínea é) tem de estar para além do ensino básico. Creio que a interpretação conjugada das duas normas permite chegar a essa interpretação com alguma segurança.

Quanto à questão levantada pelo Sr. Deputado José Magalhães, é evidente que uma norma como a da alínea e) justificará o alargamento progressivo da gratuitidade do sistema de ensino, por exemplo em função do alargamento dos critérios definidores da escolaridade obrigatória. Nesse sentido, é lógico que em função do disposto na alínea e), como orientação programática, o alargamento da escolaridade obrigatória vá produzindo a progressiva gratuitização dos graus de ensino, que vão sendo integrados nesse conceito de escolaridade obrigatória. Só assim faz sentido que o Estado imponha aos jovens a obrigação de frequentarem a escola, isto é, apenas se lhes forem concedidas as condições para cumprirem essa imposição estadual.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Mas isso é linear, Sr. Deputado.

O Sr. António Vitorino (PS): - Não, o que estou a dizer é que à medida que se for alargando a escolaridade obrigatória...

O Sr. José Magalhães: (PCP): - Mas isso é um efeito estrito da alínea a)...

O Sr. António Vitorino (PS): - Mas, se se alargar a escolaridade obrigatória para além da alínea a) vale a norma programática da alínea e). Não sei se me faço entender. Parece-me tão evidente que quase tenho dificuldade em explicar.