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27 DE JULHO DE 1988 883

O Sr. Almeida Santos (PS): - Claro.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, a proposta do PS suscita algumas interrogações porque pressupõe uma inflexibilidade que não existe. Há uma certa assintonia entre o discurso e a proposta e uma certa dêcalage entre a fundamentação e o resultado, porque a situação que o Sr. Deputado Almeida Santos descreveu relativa à relação conturbada entre os emigrantes e a terra e outros meios de produção em abandono não é susceptível, constitucionalmente, de ser equacionada em termos penalizadores dos emigrantes, a qualquer título.

De resto, o PS não propõe sequer a alteração do n.° 1, desde logo porque a Constituição não estabelece uma obrigação de expropriação. A Constituição estabelece uma faculdade de expropriação. Isto quer dizer que a norma é susceptível não de uma só leitura e de uma aplicação, mas de muitas aplicações e até de algumas não aplicações, obedecendo a juízos de pura oportunidade política que são o resultado normal do funcionamento das instituições com a conformação que resulte, em cada momento histórico, do sufrágio. Nem mais, nem menos.

Por outro lado, o PS não me parece alterar o fito básico do preceito, ou seja, o enjeitamento da ideia de que, quanto a meios produção, o abandono possa ser tão lícito como o uso, que o aproveitamento integral possa ser tão relevante constitucionalmente como o desproveitamento integral. Essa ideia não é consagrada no preceito proposto pelo PS.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Substituímos a pena.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Exacto. Só isso. A norma actual aponta, aliás, para o dever de exploração, deixando, porém, à lei uma margem de conformação enorme, desde logo na definição do que é que sejam "meios de produção abandonados" que é que se deva entender por injustificação e justificação, quanto ao lapso de tempo necessário para que se configure um verdadeiro e próprio abandono...

O Sr. Almeida Santos (PS): - A lei ordinária tem de dizer alguma coisa, como é óbvio.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Exacto. O legislador ordinário tem um vastíssimo campo de flexibilização in itinere e na aplicação da norma, que realmente me interrogo, nesta primeira leitura, sobre o que é que se está a exorcizar com esta supressão, porque, verdadeiramente, tudo ponderado, aquilo que o PS pretende é que haja indemnização no caso de haver abandono injustificado, nos termos que a lei considere que o processo conduz a esse resultado e nos casos em que, face a essa situação de abandono, o Governo ou a entidade competente entenda expropriar.

O PS parece, portanto, configurar como impossível ou indesejável - pois talvez se situe mais nesse campo da indesejabilidade do que no da impossibilidade - a existência de casos" tão graves de abandono de meios de produção que se justifique a expropriação sem indemnização. Dir-se-ia que admite que a expropriação sem indemnização é uma espécie de "pena de morte" e que entende que as únicas penas aplicáveis aí devem ser o arrendamento compulsivo ou a concessão de exploração compulsiva. É isto? Parece ser isto, mas...

O Sr. Almeida Santos (PS): - Posso dar-lhe uma explicação, para simplificar. É que nos parece que, estando em causa o abandono, o que se quer não é que as pessoas deixem de ser proprietárias daquilo que é seu e que têm em abandono, mas que aquilo que está abandonado deixe de o estar. O mal é o abandono e não a propriedade do indivíduo que abandonou. Por consequência, ataca-se o abandono e não a propriedade, mantendo-se a expropriação no n.° 1, pois, se o Estado entender que deve expropriar, paga, seguindo a regra geral da indemnização. Se entender bastar a expropriação do uso, é expropriado o uso com indemnização. Assim, expropria-se o uso, não se expropriando a propriedade porque foi uso que foi colocado em causa pela falta e não a propriedade em si, ou seja, há aqui um reforço do direito de propriedade.

O Sr. Raul Castro (ID): - O Sr. Deputado Almeida Santos permite-me que lhe faça uma pergunta?

O Sr. Almeida Santos (PS): - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Raul Castro (ID): - Sr. Deputado, é que parece que se cria com esta fórmula que o PS sugere um estímulo ao abandono injustificado, pois, se, por hipótese, o sujeito não consegue arrendar ou ceder a exploração de um meio de produção, abandonava-o injustificadamente, e o prémio é substituir-se a isso um arrendamento compulsivo.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Só que o arrendamento compulsivo é uma faculdade e não uma obrigação do Estado. O sujeito não pode contar com isso, pois, se abandona alguma coisa que vale a pena não ser abandonada, o Estado intervém, mas, caso contrário, o Estado deixa-a ficar em abandono. Como já disse há pouco, o Estado não vai intervir no abandono de todas as folhas de cultura das aldeias, mas apenas nos casos em que se tratar de uma grande folha de cultura injustificadamente abandonada. Penso que é mais eficaz esta medida do que a outra, e digamos que é menos injusta.

É que o caso do confisco é um caso excepcional em todas as constituições. A expropriação ou a nacionalização chegam e sobram para desapropriar um bem da titularidade de alguém. Mas o confisco é odioso. Sempre o foi e sempre o será. Valerá a pena que na nossa Constituição, que é tão nobre na defesa de direitos fundamentais, permaneçam estas duas mazelas? A Constituição, sem elas ficará mais ... "bonita"!

O Sr. Raul Castro (ID): - Mas o conceito de beleza é uma coisa que não estará talvez aqui em causa. Outra coisa é o que isto significa na realidade.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Então não está em causa a beleza que há na defesa impecável dos direitos fundamentais? É uma forma de beleza como outra qualquer.

O Sr. Raul Castro (ID): - Isso é em matéria de saúde!

O Sr. Almeida Santos (PS): - Se quiser, também é mais saudável!

O Sr. Raul Castro (ID): - Mas o que aqui impressiona - e mais ainda até com a resposta que me deu - é que não se trata apenas da substituição de uma fórmula imperativa, tratando-se antes de uma fórmula facultativa.