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982 II SÉRIE - NÚMERO 32-RC

O Sr. Presidente: - Mas ainda estamos dentro do horário; portanto, poderemos pelo menos ouvir o Sr. Deputado Pacheco Pereira.

O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Tenho muito gosto, aliás, pelas expectativas que a minha intervenção causa.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Não há expectativa nenhuma. O conteúdo é de chapa. Prediz-se linha a linha...

O Sr. Almeida Santos (PS): - Eu tenho uma hora prefixa para me retirar.

O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Vou pronunciar-me o mais rapidamente possível sobre algumas questões e centrar-me, principalmente, no que penso ser o problema posto pela discussão à volta do latifúndio. Ou seja, observei com atenção que, na intervenção do Sr. Deputado José Magalhães e, mais tarde, na do Sr. Deputado Lino de Carvalho, começava a esboçar-se a seguinte posição: que seria possível retirar, ou eliminar, das partes iniciais da Constituição as disposições programáticas sobre o socialismo, mas que a pane respeitante ao latifúndio poderia permanecer por seu mérito próprio, na medida em que - isto foi dito textualmente - o conceito de reforma agrária não tem nada de ideológico, portanto, as posturas sobre o latifúndio são isentas de qualquer entendimento ideológico sobre a Constituição; portanto, valeriam enquanto descrição de uma realidade e enquanto intenção programática sobre essa realidade. Gostaria de dizer que é exactamente o contrário. Se há parte em que o entendimento da Constituição é inteiramente ideológico - isso foi abundantemente revelado pelas intervenções dos Srs. Deputados do PCP nesta matéria -, é naquilo que diz respeito ao latifúndio e à reforma agrária. Não vou pronunciar-me com muito pormenor sobre os detalhes, mas apenas gostaria de chamar a atenção para o facto de que esse entendimento ideológico sobre a questão do latifúndio e da reforma agrária é evidente no próprio entendimento da história do processo alentejano.

Não vou entrar em pormenores, mas não gostaria de deixar que ficasse registado em acta que a compreensão da história do processo de criação do latifúndio e do seu desenvolvimento e das tentativas de reforma agrária é completamente ideológica. Esse entendimento ideológico da história começa, evidentemente, desde a génese do latifúndio no período contemporâneo, em que todos os estudos sobre a venda dos bens nacionais relevam um processo um pouco mais complexo do que aquele que aqui é referido, até à própria história do processo da reforma agrária.

Não queria deixar de registar não só que as tentativas de reforma agrária na I República não conduziram necessariamente à queda do regime - isso é também uma interpretação ideológica -, como também que, quando mais tarde foram reactivadas no período do salazarismo, mereceram a oposição do PCP. Bem sei que os Senhores do PCP, normalmente, não conhecem muito bem a história do seu próprio partido, mas a expressão "reforma agrária" começou por ser combatida pelo próprio PCP e só muito tardiamente veio a ser aceite como formulação, retomando o velho programa republicano de reforma agrária que vinha da I República. Mais: até 1975, o entendimento do PCP sobre reforma agrária era a divisão das terras pelos camponeses e pelos trabalhadores rurais, individualmente considerados; só posteriormente é que foi aceite a fórmula colectivista.

Estas coisas convém que fiquem registadas, na medida em que os Senhores fazem, em muitos casos, uma reconstrução a posteriori das suas próprias posições e do próprio processo histórico.

O Sr. Rogério de Brito (PCP): - E ainda dizem que somos conversadores! Afinal, temos mutações!

O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Não, não é isso que estou a dizer.

O próprio entendimento do processo histórico é ideológico. A segunda coisa que é também ideológica na formulação do PCP é, evidentemente, a descrição da realidade. O PCP faz uma descrição da realidade alentejana, quer antes do processo da reforma agrária, quer depois, que é completamente mirífica, ou seja, que não entra em conta com nenhuma das complexidades da realidade existente. Descrevem o Alentejo como se, em 1974. estivesse nos anos 30; 40 ou 50. como se fosse percorrido por trabalhadores rurais cheios de fome, à procura de emprego, quando havia falta de emprego sazonal; quando, de facto, no momento em que se deu o processo de reforma agrária a própria realidade social alentejana era muito diferente e não correspondia a esse modelo. O mesmo é verdade em relação à ideia do latifundiário, que não é o homem do charuto, com cartola, o que é também uma reconstrução inteiramente ideológica de uma realidade que já estava num processo de transformação acentuada.

Isto para chamar a atenção para que, quando VV. Exas. falam do latifúndio e da sua recuperação ou reconstrução, querem opor-se a uma realidade inexistente, ou seja, é completamente mirífico e ideológico pensar que se pudesse reconstituir em 1988, numa situação política e social como a actual e após os acontecimentos de 1974-75 e do processo de integração europeia, a figura do velho latifundiário absentista que vinha gastar o dinheiro no Casino do Estoril. Este era o modelo que se utilizava nos anos 30, 40 ou 50.

Ora, o que os Senhores não querem é outra coisa: em primeiro lugar, que haja um processo de transferência de poderes em relação às realidades de facto que foram criadas desde 1975, que são essencialmente as UCP's, as formas de gestão e de controlo político, social, sindical e económico que existem sobre as pessoas que nelas trabalham, o facto de elas ocuparem o espaço de uma agricultura moderna, desenvolvida, com uma produtividade e técnicas de exploração completamente diferentes e com uma relação distinta com a economia nacional e com a integração europeia...

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Deputado, V. Exa. fala noas UCP's como um instrumento de controlo político. Como é que então explica que em zonas onde não há UCP's o PCP tinha a maioria e a perca onde existem?

O Sr. Pacheco Pereira (PCP): - Sr. Deputado, não estou a fazer referências ao processo e implantação eleitorais. O que me limito a dizer é que os senhores têm uma susceptibilidade muito particular em relação às questões da reforma agrária. Em grande parte, porque,