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2 DE SETEMBRO DE 1988 1037

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, como assinala o relatório da Subcomissão sobre este artigo, o PS propõe, realmente, a eliminação da segunda parte do preceito e a reinserção sistemática da parte primeira como n.° 2 do artigo 96.° Fui autor deste relatório, mas ele "evaporou-se-me" da memória, o que torna incorrecta a qualificação que fiz anteriormente - facto que fica agora, obviamente, assinalado.

O Sr. Presidente: - Não há problema.

O Sr. António Vitorino (PS): - Não há problema. Se fosse a única incorrecta!

O Sr. José Magalhães (PCP): - Lamentavelmente, desconfio que é a única!

O Sr. Presidente: - Temos aqui uma proposta do PCP, sobre o artigo 103.°-A, no sentido de que a lei estabeleça "as condições em que, por motivos de defesa nacional, de ordem pública ou de protecção do património, deve ser limitada a apropriação ao solo nacional por parte de estrangeiros".

Relativamente a esta proposta, só pergunto: porquê na política agrícola? E porquê só a propriedade do solo? Não seria esta uma daquelas normas que, a consagrarem-se, deviam começar por sê-lo na lei ordinária - até a título de alguma discrição e de alguma eficácia - em vez de a colocarmos no frontispício do edifício constitucional? Parece-me que é uma norma deslocada no capítulo da política agrícola. Seria, quando muito, uma norma genérica relativa a todos os valores imobiliários, e não apenas ao solo.

Por outro lado, "defesa nacional", "ordem pública" e "protecção do património", penso que os verdadeiros valores não são estes. É capaz de ser antes a "independência".

De qualquer modo, queria dizer que há aqui uma preocupação que também perfilho. Com efeito, penso que devemos preocupar-nos com fenómenos que estão na base desta proposta, mas não me parece que a Constituição deva ser a moldura de uma proposta deste tipo. Isto é apenas uma opinião pessoal. Pode ser que o PCP me convença com a sua justificação.

Tem a palavra a Sra. Deputada Maria da Assunção Esteves.

A Sra. Maria da Assunção Esteves (PSD): - Pensamos ser claramente desnecessária esta definição. É desnecessária e tem algumas perversidades, porque o artigo 103.° tem por destinatários directos os estrangeiros e tem em conta a eventual limitação da apropriação do solo por estrangeiros, limitação essa que, a ser aqui inscrita, pode, eventualmente, colidir com a interpretação de algumas regras e princípios constitucionalmente consagrados. Por exemplo, como é que se vai interpretar de modo conjugado o artigo 103.° com o princípio da reciprocidade consagrado no artigo 15.°, n.° 1, para os estrangeiros residentes?

Outras questões se podem pôr.

Já o artigo 86.° da Constituição refere a necessidade de a lei disciplinar a actividade económica de estrangeiros, sendo sabido que essa actividade económica inclui, para além de outras componentes, o direito de adquirir bens para essa mesma actividade. As referências que aqui são dadas como causas dessa limitação de apropriação são suficientes em sede própria para arredarem quer a ilimitada apropriação do solo por estrangeiros quer quaisquer outras causas que contendam com a sua própria razão de ser.

Quanto à defesa, entendo, tal como o Sr. Deputado Almeida Santos, que o PCP terá pretendido aqui - mais do que referir-se à defesa - referir-se ao problema da independência nacional na acepção que lhe é comummente assinalada.

Quanto às outras referências, "ordem pública" e "protecção do património", relativamente a esta última já o artigo 9.°, na alínea e), a indica como uma das tarefas fundamentais do Estado; relativamente à "ordem pública", ela é um limite normal do exercício de qualquer direito. É-o já na teoria civilística como limite que demarca a própria figura do abuso de direito, e, por maioria de razão - dado que na ordem jurídico-política pública não se trata relativamente ao exercício de direitos de uma esfera de licitude como se passa com os particulares, mas de âmbitos mais delimitados, isto é, de esferas de possibilidades legal e constitucionalmente conformadas -, o limite de ordem pública haverá de ser um limite natural decorrente dos princípios gerais de direito e da interpretação conjunta desses princípios e de direito público. Parece-me, portanto, que em sede própria quer a defesa nacional, quer a ordem pública como princípio genérico de limitação de exercício de direitos, quer a protecção do património requererão tanto esta medida como outras medidas. Portanto, seria também, de certo modo, criar com este artigo a necessidade de ligar a estes fins a exclusividade de um meio e o fechar de portas a outros meios. Tem a ver com o atingir mais facilmente ou não esse mesmo fim. Era apenas isto.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Rogério de Brito.

O Sr. Rogério de Brito (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quer se queira quer não, o solo, a terra constitui um elemento que não é indissociável daquilo a que se denominará, e penso que bem, a soberania e a independência nacional de um país. Dificilmente se conceberá a soberania de um país se, por exemplo, o seu território for todo ele propriedade de estrangeiros. Por outro lado, o conceito de defesa nacional não é uma mera questão de estratégia geográfica. Defesa nacional passam também pela própria política alimentar. A garantia de salvaguarda de recursos fundamentais à própria sobrevivência do Estado, tal como, por exemplo, o património cultural, é, também ela, uma forma de exercício de soberania e da independência de um país, devendo, por isso, ser acautelada. É evidente que quando se criam reservas naturais o próprio conceito de reserva natural constitui um travão claro.

Mas nem sempre esta realidade se verifica. Ainda não há muito tempo, salvo o erro, em Silves, um estrangeiro pôde dar-se ao luxo de destruir vestígios da presença da arte, da realidade social, etc., de povos que outrora aqui estiveram. Tratava-se de um património cultural que deveria ter sido protegido e que, por falta de medidas legislativas que permitissem travar a destruição daqueles bens, pura e simplesmente foi destruído porque não estava integrado numa zona de protecção.