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2 DE SETEMBRO DE 1988 1031

tem de ser feita não pode ser uma política de liquidação da reforma agrária. Mais: na parte que diga respeito á reforma agrária - que é um instrumento da política agrícola - a política a realizar não pode deixar de obedecer a certas regras, enquadramentos e directrizes constantes da Constituição, na parte respeitante especificamente à reforma agrária, designadamente no que diz respeito à eliminação dos latifúndios, no que diz respeito à entrega das terras, ao estatuto dos que beneficiem da terra...

O Sr. António Vitorino (PS): - Não lhe passou despercebido o facto de que, embora o PS no artigo 81.° suprima como incumbência do Estado a realização da reforma agrária, substitui a alínea h), lá colocando claramente como incumbência do Estado a eliminação dos latifúndios. Toda a argumentação dos Srs. Deputados do PCP em relação às propostas do PS passou discreta e distraidamente sobre a alínea h) do artigo 81.° da proposta do PS. Pelo que a conclusão extraída pelo PCP de que nós, na nossa própria proposta, permitíamos que a política agrícola pudesse levar a reforma agrária ao zero, isto é, à supressão da incumbência de eliminar o latifúndio, é uma acusação injusta.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Deputado António Vitorino, agradeço a precisão, porque lança um elemento adicional para um esclarecimento indispensável. Lembro, porém, que estabelecer-se uma incumbência mas deixar-se na dependência do legislador ordinário a realização de tudo aquilo de que depende o cumprimento dessa incumbência pode significar - se a definição dos meios ou das obrigações for flébil - a impossibilitação da realização dessa incumbência, reduzindo-a ao grau zero. Se V. Exa. escreve: "tu, legislador, 'deves' expropriar" - isso é totalmente diferente de escrever: "tu legislador, 'podes' ordenar a expropriação". É diferente! É a diferença entre a faculdade e a obrigação. Não vale a pena entrarmos nisso, porque é elementar.

O Sr. António Vitorino (PS): - Mas, em termos práticos, V. Exa. reconhecerá que, nos últimos dez anos, em que não houve expropriações no âmbito da reforma agrária, o resultado prático do texto puro, duro, maduro e seguro que V. Exa. defende é exactamente o mesmo que V. Exa. identifica como resultando da proposta que o PS apresenta. Nesse aspecto, a prática desmente-o.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Não, Sr. Deputado. Por isto: por causa da questão do retorno e da proibição do retorno. Como V. Exa. sabe, à data da entrada em vigor da Constituição, expropriações tinha havido - e tinha havido em montante substancial. Havia ainda, e há, áreas por expropriar, mas havia um acervo de expropriações realizado, um adquirido que foi consagrado constitucionalmente. Se se entender que os Srs. Deputados do PS vêm sustentar - agora, em 1988 - que, afinal de contas, não há proibição de retorno, que, afinal de contas, é possível transformar uma obrigação constitucional numa faculdade, incluindo com aplicação de cláusulas de retorno, é evidente que não só o Estado e os órgãos de soberania ficam libertos da obrigação de andar para a frente, como poderiam alcançar um estatuto que lhes permita, até, andar para trás. E andar para trás, constitucionalmente, com cobertura constitucional - admitindo que o artigo 290.° é ultrapassável neste ponto. É isso que nos preocupa e, em relação à questão do enquadramento, é isso que eu gostava de deixar bem excluído.

Não fui eu que disse - foi outrem, e consta do Diário da Assembleia da República, 2.a série, n.° 18, de 21 de Novembro de 1981, p. 419:

Quando se diz que algo pode ser objecto de expropriação, é evidente que isso significa que também pode não ser. É uma alteração essencial [essencial sublinho eu, agora, José Magalhães], que [diz o mesmo deputado] viola o artigo 290.°; não é aceitável.

E mais adiante:

Há aqui uma alteração essencial [na proposta da AD, de então] que é o facto de as terras expropriadas poderem ser entregues em propriedade sem limitação de dimensão. Devo dizer que, para nós, é o princípio em si e não o problema da limitação de dimensão que é importante.

E adiante:

O facto de a terra expropriada poder ser transferida em propriedade sem qualquer limite, nomeadamente quanto à sua penhorabilidade ou posterior venda, é, nalgumas zonas do País ou em determinadas circunstâncias, o mesmo que prever a recriação de grandes explorações privadas, designadamente a reconstrução do latifúndio ou da grande exploração capitalista - porquê? Porque o processo de concentração da terra se fez e se faz exactamente por este processo: o pequeno proprietário que não tem condições para conseguir aguentar a exploração da terra começa por hipotecá-la e acaba por vendê-la. Esta transferência de propriedade que é aqui prevista é uma experiência historicamente conhecida: são as reformas agrárias capitalistas feitas no século XIX na Europa e que não foram feitas em Portugal - excepto no que respeita à terra das congregações religiosas; em Portugal não foi feito, nomeadamente no Sul do País. Aqui, trata-se de tentar fazer agora a reforma agrária capitalista que foi feita noutros países no século XIX - substituir a reforma agrária que temos hoje na Constituição por este tipo de reforma agrária não é, de facto, a nossa posição, e não podemos assistir a este terramoto, a este sismo constitucional [sic]. Este é o problema decisivo, que implica, de facto, questões de filosofia - foi reconhecido na subcomissão que eram estas as questões decisivas; foi reconhecido na subcomissão pela própria AD. Não se pode esperar que nestas questões nós possamos estar de acordo.

Tudo isto foi dito pelo Sr. Deputado Luís Nunes de Almeida e pelo Sr. Deputado Almeida Santos em 1981, a propósito desta mesmíssima matéria. Devo dizer que uma das coisas que me impressionam mais é a ambiguidade do PS - já que o Sr. Deputado António Vitorino quis colocar a questão nestes termos - em relação à questão do não retorno e à proibição do não retorno. Entende o PS que esta proibição do não