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28 DE SETEMBRO DE 1988 1121

Sabemos todos do enorme empenho que o PSD e algumas das entidades que lhe estão associadas têm manifestado em relação à questão eleitoral, e em particular ao sistema eleitoral, tal qual se encontra consagrado na Constituição da República. Não ecoa agora tudo aquilo que vertiginosamente foi dito, designadamente em torno da campanha presidencial, não tão distante como isso, sobre os malefícios do sistema constitucional instituído, nem aquilo que foi dito para fundamentar uma suposta necessidade da sua radical inversão ou da sua correcção. Aquilo que noutros tablados foi alegado como necessidade de "aproximação entre os deputados e os eleitores", de pôr "fim à oligarquia partidária" e ao "estado absoluto dos partidos" e a todos os malefícios que lhe estão associados, "terríveis" e "imensos" - tudo isso não ecoa aqui. Considero que isso é um interessante sinal dos tempos!

Em todo o caso, convém não exagerar nessa matéria e creio que o PSD vai de alguna forma ter de assumir, talvez não agora mas certamente mais tarde es-parsamente, aquilo que são os contornos globais do seu projecto neste domínio. Não por acaso algum comentarista avisava, a certa altura, logo depois das eleições de 19 de Julho, que ao Primeiro-Ministro faltava, além de uma Constituição "boazinha" (como a da V República Francesa), "uma lei eleitoral que lhe permitisse uma estabibilidade por umas duas ou três legislativas". É certamente esta preocupação que impulsiona o PSD na apresentação do seu projecto de revisão constitucional quanto a este ponto...

O Sr. Presidente: - Na passagem dos 90 para os 60, quer V. Exa. referir-se a esse ponto?

O Sr. José Magalhães (PCP): - Não, Sr. Presidente, tudo isto a propósito do facto de o PSD, ao apresentar essa proposta concreta, ter omitido toda a questão de fundo, démarche que considero simpática e fagueira, mas francamente insusceptível de passar como tal. Não poderemos ou não deveremos travar aqui todo o debate acerca da problemática eleitoral, mas ao menos deveremos ter alguma ideia de qual é o edifício eleitoral em que o PSD gostaria de mover-se. Tanto gostaria que o propõe, não apenas nesta sede, como o Sr. Deputado Rui Machete, em seu interesse próprio, alegou ao invocar a não alteração do artigo 155.° da Constituição, mas também em outras sedes: é bom relembrar que o PSD, ao apresentar à Assembleia da República o seu programa de Governo e, mais tarde, ao apresentar o seu projecto de revisão constitucional, tornou clara a sua intenção de se bater, naturalmente sem êxito se não acompanhado, por alterações traduzidas designadamente na concessão do direito de voto a cidadãos residentes no estrangeiro (em países onde não estão garantidas condições de liberdade de campanha, de igualdade de oportunidades das candidaturas e outros aspectos fundamentais para a verdade eleitoral), de reduzir o número de deputados eleitos (supostamente para conseguir uma aproximação em relação aos eleitores) e conceder um "prémio de maioria" na formação dos executivos municipais a forças políticas que não adquiram a respectiva maioria no sufrágio.

É este o projecto global. Neste artigo trata-se de acrescer a margem de intervenção do legislador ordinário na definição do regime eleitoral, encurtando, com fundamentos que estamos para conhecer, o prazo para a realização de novas eleições.

Creio que sobre esta matéria está dito o que da nossa parte, no campo interrogativo, se pode dizer. Considero, no entanto, significativo que o PSD tenha escolhido este enfoque para se aproximar a esta matéria. Não se pode, porém, discutir a questão eleitoral por retalhos. Será extremamente difícil que a questão eleitoral não seja encarada globalmente e vista em todas as suas implicações e dimensões.

Em relação à proposta apresentada pelo PRD, já vai adiantada a discussão. As dificuldades e os problemas enumerados estão correctamente identificados e trata-se de saber se é possível encontrar uma resposta azada em sede de revisão constitucional, uma vez que a operação proposta tem alguns méritos, mas tem igualmente alguns riscos e alguns deméritos, que estão devidamente situados. É evidente que no caso português o monopólio partidário das candidaturas não existe, desde logo em relação às eleições para o Presidente da República, o que suscita igualmente alguns problemas, mas tem uma razão funda que é respeitável. Não está ensejada a alteração desse princípio, não há qualquer proposta apresentada, pelo que a questão não se coloca nesta sede.

Por outro lado, a experiência de aplicação da quebra mitigada do monopólio partidário na apresentação de candidaturas em eleições autárquicas que decorre já do actual texto constitucional deveria ser objecto de alguma reflexão. Valeria a pena que procurássemos afinar os ângulos de análise em torno do que tem sido essa experiência de aplicação. É obvio que poderá ser redarguido que se a experiência de aplicação tem sido modesta, como é inegável, isso poderá dever-se também ao próprio enquadramento legal madrasto, desfavorável, e que um enquadramento legal mais favorável poderia propiciar situações e estimular, por impulso do legislador, dinâmicas de carácter social e eleitoral respeitáveis. Importará, no entanto, saber quais são os moldes e os parâmetros mais desejáveis para essas dinâmicas e, sobretudo, qual o nível mais exacto para que essas dinâmicas se possam manifestar sem efeitos indesejados.

Creio que o PRD poderia, com alguma vantagem para todos, transmitir-nos um pouco do seu património de reflexão quanto ao campo de aplicação desta solução em relação, por exemplo, às eleições regionais - refiro-me ao que diz respeito às regiões autónomas, deixando de lado a questão do que possam ser os processos eleitorais para as regiões administrativas como tais, uma vez que a sua problemática é específica e é larga a margem de conjectura. Qual poderia ser o campo de aplicação deste instituto nessas eleições em regiões autónomas e que tipo de situações é que poderia gerar, dado, designadamente, o facto de ser constitucionalmente proibida a criação de partidos regionais, por qualquer forma, directa ou indirecta. É evidente que são sempre congemináveis hipóteses de fraude à Constituição, mas, em tese geral, que campo de actuação poderia gerar-se a partir de uma solução deste género nas regiões, dados alguns dos fenómenos que numa delas se registam e o tipo de pretensões e orientações que têm sido manifestadas quanto à gestão dos processos eleitorais por certos quadrantes?

Creio que isso deveria ser objecto de alguma ponderação.