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25 DE OUTUBRO DE 1988 1615

o justificando, podem, contudo, requerer a participação das Forças Armadas em acções de apoio às populações civis. Nesse sentido, a Constituição actual, no seu n.° 5 do artigo 275.°, refere que as Forças Armadas podem colaborar, nos termos da lei, em tarefas relacionadas com a satisfação das necessidades básicas e a melhoria da qualidade de vida das populações, pelo que entendemos que a estas tarefas, com incidência no foro civil das Forças Armadas, deve ser aditada a possibilidade de a lei prever as condições em que estas colaboram com as autoridades civis em situações de calamidade pública que, contudo, não se revistam de gravidade que justifique a declaração de qualquer estado de excepção, seja o estado de emergência ou mesmo o estado de sítio.

Trata-se, pois, de situações de calamidade pública que podem ser uma enxurrada, um dilúvio, um aluimento de terras, que naturalmente não justificarão a declaração do estado de emergência e a suspensão de direitos, mas que justificam que as Forças Armadas colaborem com as autoridades civis.

Na proposta de alteração do n.° 6 do artigo 275.° referimos que as leis que regulam os regimes do estado de sítio e do estado de emergência fixam as condições do emprego das Forças Armadas quando se verifiquem essas situações e não aquelas, como estatui o actual texto do n.° 6 do referido preceito. Trata-se de uma mera melhoria de redacção ou de um preciosismo que não tem naturalmente grande relevância. Portanto, o objecto fundamental desta proposta de alteração do artigo 275.° é somente o n.° 5.

O Sr. Presidente: - Gostaria de dizer a V. Exa., se me permitisse e só para perceber em toda a sua extensão a proposta, que não estamos em desacordo com a ideia de que haja uma colaboração das Forças Armadas. E ela tem-se efectivado em situações de calamidade pública, e em que seja necessário recorrer a todas as disponibilidades para obviar às consequências mais danosas derivadas de uma catástrofe.

A questão que lhe coloco não incidia sobre esse ponto mas, sim, sobre outro, ou seja, a consideração do uso das Forças Armadas para a melhoria da qualidade de vida das populações. É algo tão diferente do que acontece habitualmente que deveria ser relativamente episódico. Não é essa a missão normal das Forças Armadas. E, sobretudo, faz recordar algumas concepções acerca da intervenção dos militares que foram caras num período recente em Portugal e que, não obstante, são vulgares em países que advogam modelos do tipo peruano, o que nós, nem de longe, gostaríamos de ver recordado em Portugal.

O Sr. António Vitorino (PS): - Uma maior tendência mexicana!

O Sr. Presidente: - Nem mexicana! Nada de Américas, pois preferíamos, neste caso e neste contexto militar, quedarmo-nos pela Europa!

Porém, esta nossa sensibilidade não vai ao ponto de entender que se deva proibir que a engenharia militar possa, num caso ou noutro, prestar apoio numa situação ocasional. Isso é algo de diferente, devido ao facto de se consignar solenemente na Constituição uma missão que vem acrescer a outras por parte das Forças Armadas e que lhe é estranha em relação àquilo que lhe é co-natural.

Assim, pergunto-lhe o seguinte: por que é que se tenta ir tão longe de molde a consignar-se na Constituição, expressamente como uma missão, o melhoramento das necessidades básicas e a qualidade de vida das populações, para além da ideia de ser um dever imperioso até de, em situações de calamidade pública, haver uma intervenção das Forças Armadas nos termos que, aliás, estão bem acautelados na proposta do PS? E formulo esta questão porque isto, em princípio, ainda está ligado a um certo nível de vida muito baixo das populações que estamos esperançados em ver claramente melhorado. Não gostaríamos, pois, de ver perpetuada uma certa concepção com tonalidades miserabilistas, embora muito ténues.

O Sr. António Vitorino (PS): - Sr. Presidente, a pergunta que V. Exa. me colocou dá aparentemente a entender que estaríamos perante um desvio peruano do PS, de forma a aditar à Constituição qualquer coisa...

O Sr. Presidente: - Não pretendo dizer tal!...

O Sr. António Vitorino (PS): - Já lhe vou demonstrar por que é que eu não poderia pretender dizer tal. De facto, a questão que referiu não se reporta ao segmento em que o PS inova, pois essa é a parte da Constituição que já hoje se contém no n.° 5 do artigo 275.° e que o PSD no seu projecto nem propôs que fosse alterada.

O Sr. Presidente: - Tinha então caducado! Risos.

O Sr. António Vitorino (PS): - Estou até de acordo com a filosofia que está subjacente à intervenção do Sr. Presidente, como é evidente. De facto, o que está na Constituição não é o reconhecimento de que as Forças Armadas têm uma tarefa sistemática e permanente de colaborarem em tarefas relacionadas com a satisfação das necessidades básicas e a melhoria da qualidade de vida das populações.

Vozes.

O Sr. António Vitorino (PS): - Portanto, não há lugar para a recuperação de qualquer concepção que tenha a ver com uma imbricação das Forças Armadas em tarefas de satisfação das necessidades básicas de populações e de melhoria da respectiva qualidade de vida.

O nosso n.° 5 é um articulado que consagra uma possibilidade excepcional, daí que se diga que a lei definirá os termos em que as Forças Armadas podem colaborar. É uma mera hipótese!

Ora, o que seria ilegítimo era, no meu entendimento, que, sem esta previsão constitucional, a lei prevesse essas situações. Trata-se, pois, de uma norma meramente habilitadora e, portanto, não é uma imposição de missão às Forças Armadas terem essa tarefa. O exemplo da engenharia é sempre de natureza clássica e que se costuma dar nestas circunstâncias.

Quanto ao objectivo da nossa proposta, devo dizer que há somente a necessidade de admitir, e a vida já nos demonstrou isso, que pode haver situações práticas em que o recurso às Forças Armadas se justifica para auxiliar populações civis em caso de calamidade