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17 DE OUTUBRO DE 1992 155

Refiro este aspecto para explicar que as nossas perspectivas também, nesse capítulo, têm de diferir, o que se compreende, mas a contribuição dos juristas qualificados, tomo V. Exa. é extremamente útil porque nos obriga a submeter a uma crítica cerrada as opções que tomamos, por forma a vermos se são consistentes até com os nossos próprios propósitos.

O Sr. Prof. Doutor Fausto Quadros: - Sem dúvida que todas estas observações são muito pertinentes. Estou de acordo com algumas, que não são propriamente divergentes do meu ponto de vista, e vou telegraficamente, se me e permitido, inalar-vos mais alguns minutos.

O Sr. Presidente: - Maçar-nos não, deliciar-nos!

O Sr. Prof. Doutor Fausto Quadros: - Muito obrigado. Sr. Presidente

Os Srs. Deputados Alberto Costa e Luís Pais de Sousa, de uma forma diferente, colocando-me a questão de saber se esta revisão devia ou não englobar o artigo 8.° - aliás, o Dr. Alberto Cosia foi mesmo mais longe e disse que desta vez só se quis nesta revisão extraordinária permitir as alterações da Constituição que viabilizassem a ratificação.

Sei que isso é assim, mas julgo que não se teria saído do quadro excepcional da revisão extraordinária se se pensasse da seguinte forma: não nos compele a nós, apenas, fazer o Tratado de Maastricht entrar pela porta da ordem interna portuguesa; interessa-nos também, e creio que isso é complementar do primeiro aspecto, criar condições para a sua plena vigência na ordem interna. Portanto, julgo que não seria extravasar do mandato constituinte da Assembleia ela aproveitar esta oportunidade para rever esta última questão.

Quero dizer que tive em conta este aspecto nas observações que fiz, porque não fui para as questões que estão conexas com esta, diria, em segundo grau, e dou como exemplo a subsidiariedade. Para mim, a subsidiariedade é tão importante num regime democrático que, se esta não fosse uma revisão extraordinária, eu teria proposto muito mais, ou seja, que ela ficasse como princípio fundamental do ordenamento constitucional português muito para além das relações do listado Português com as Comunidades.

Como sabem, toda a descentralização assenta na subsidariedade em direito administrativo. Portanto, a subsidariedade é um princípio básico de direito constitucional e de direito administrativo, porque é ela que vai legimitar, mais do que os artigos 238.º e 267.° da Constituição, a descentralização e a regionalização, da qual eu sou grande defensor - aliás, já trabalhámos, o Sr. Presidente e eu, numa comissão, conjuntamente com outros juristas, em que esta questão foi discutida e teríamos já feita a regionalização se, entretanto, um governo não tivesse dado lugar a outro...

O Sr. Presidente: - Velhos tempos!...

O Sr. Prof. Doutor Fausto Quadros: - Exacto, velhos tempos!

E, pois, a subsidiariedade que impõe a descentralização e a regionalização mais do que os preceitos constitucionais que dizem, nos artigos 266.º e seguintes, que ela é indispensável. Numa revisão ordinária, então diria que a subsidiariedade devia passar a figurar no elenco dos princípios fundamentais da Constituição, mas não vou tão longe, porque isso talvez fosse pedir demais, embora também isso se prendesse com a matéria da integração europeia.

Quanto ao artigo especial para as Comunidades, penso que ele não é necessário Além disso não há tradição nesse sentido reparem que há um preceito sobre a soberania, sobre as questões da vigência na ordem interna já existe o artigo 8.º e esta Constituição já é tão longa que se se puder reconduzir esta matéria aos artigos já existentes, isso seria, creio, metodologicamente melhor do que criar um artigo especial.

Quanto às propostas do PS e do PSD relativas à redacção do artigo 7.º, posso dizer que em matéria de reciprocidade eu cedo, embora subsista o problema de interpretação que referi. No entanto, não sufrago integralmente uma afirmação do Sr. Presidente, que disse tratar-se a Constituição de um texto sobretudo político. A Constituição é também, claro que sim, um texto político, mas nesta questão, que está dogmaticamente por elaborar e é doutrinai lamente controversa, é bom que o juiz português, para além de ler uma orientação política, tenha também, e sobretudo, critérios jurídicos.

Sejamos realistas: apesar de todos os cursos que há, nas Faculdades de Direito e noutras, de Direito Comunitário, a maior parte dos actuais juizes não estudou, na Universidade, Direito Comunitário, tal como nós não estudámos - e se o fizemos foi, depois, por autodidactismo. Portanto, para um juiz, nas questões políticas controversas, é conveniente, se não mesmo necessário, dar-lhe, não só as opções políticas, mas cunhem, e sobretudo, um critério jurídico de exercício dessas opções políticas. O juiz não vai fazer (e não pode fazer) política, ele vai ler de saber concretamente decidir isto: o Tratado de Maastricht está ou não em vigor na ordem interna?; se sim, de que maneira e com que grau hierárquico?

Quanto à partilha ou não da soberania, penso que estamos todos de acordo sem formalmente o estarmos, pois, no fundo, o que se passa é o seguinte: a soberania na sua raiz continua nos Estados, pelo menos enquanto o poder comunitário legiferante for exercido pelo Conselho, que é composto por delegados dos Estados. Aliás, os trabalhos preparatórios dos Tratados de 1051 e 1957 dizem que o Conselho de Ministros das Comunidades está estruturado pelo sistema do mandato imperativo do Bundesrat alemão, e não segundo o modelo do Senado norte-americano, que torna os senadores independentes dos Estados federados. Não, os membros do Conselho das Comunidades são delegados dos Estados, portanto estão sujeitos às ordens e instruções dos Estados e até à fiscalização parlamentar pelos respectivos parlamentos.

Por conseguinte, a soberania, na sua raiz, continua a pertencer aos Estados, mas os poderes soberanos, esses, são delegados. Bom, mas a minha tese é a da defesa dos interesses nacionais, e, nesse aspecto, ela vai mesmo para além dos projectos de revisão do PS e do PSD, porque neles não está, mesmo cm regime de "compartilha", a defesa da congruência democrática: aí não está que a compartilha pára perante a necessidade de assegurar maior protecção aos direitos fundamentais na ordem interna portuguesa.

Voz inaudível do Deputado do PS Alberto Costa.

O Sr. Prof. Doutor Fausto Quadros: - Não, uma coisa é a democracia, outra é o aspecto concreto dos direitos fundamentais, quando haja oposição entre o direito comunitário e a constituição de dado Estado membro.