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Creio que este é um problema incontornável, a partir do momento em que o PS evoluiu dos referendos regionais para o referendo nacional nesta matéria e a partir do momento em que o referendo diz respeito à instituição em concreto. É que na proposta do PSD, no referendo nacional, haverá já também um voto regional implícito. A Lei de Criação das Regiões estará aprovada, estará definida uma região do Algarve, uma região de Trás-os-Montes, uma ou duas regiões do Alentejo, etc., estarão definidas todas as regiões do país, depois de feito o debate público e a consulta às assembleias municipais que está em curso, e colocar-se-ão, incontornavelmente estes problemas, pois todos vão querer saber o resultado do referendo nacional, mas vão também confrontar o eventual resultado do referendo nacional com o resultado em todas e cada uma das regiões. Isto é: aquilo que o PSD quer evitar, que é o problema político criado por uma contradição entre a vontade regional e a vontade nacional, existe igualmente no referendo nacional, que é, também ele, passível de uma leitura regionalizada dos respectivos resultados.
Daí que tenha interesse averiguar mais em pormenor o que justifica, da parte do PSD, uma posição de proibir, no fim de contas, a simultaneidade dos referendos. Não é apenas a de remeter para o legislador ordinário uma escolha nesta matéria; é a de proibir a simultaneidade dos referendos - é algo cujas intenções é difícil descortinar. Este problema é inerente a este esquema que foi acordado e verifica-se, quer haja um referendo nacional apenas, anterior ao referendo regional, quer haja uma simultaneidade dos referendos. É uma questão incontornável, é inerente a este esquema, é um problema político que está criado: se houver um "não" nacional, ele vai seguramente contrariar vontades regionais e vai criar-se aqui um problema, porque o referendo nacional tem exactamente a característica de ser marcadamente centralista, enquanto o referendo regional, os referendos orgânicos ou indirectos, remetem para a vontade regional a determinação ou não da decisão de regionalizar. A partir do momento em que é feito um referendo nacional, as partes têm de se submeter ao todo e, se houver contradição entre as partes e o todo, esta contradição é um problema político incontornánel por qualquer dos esquemas aqui propostos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, naturalmente, a proposta que o PSD nos traz hoje, um pouco a destempo relativamente ao ritmo do nosso debate, é uma proposta que configura, no essencial, os argumentos já expendidos pelo PSD na reunião anterior. Ela não consiste, portanto, em nada de inovador ou em nada que nos pudesse ter surpreendido por evolução das posições do PSD, que, de facto, não são traduzidas de maneira significativa nesta proposta que temos à nossa frente.
Gostaria de sublinhar, em primeiro lugar, que ela é, do ponto de vista da sua formulação como técnica constitucional, relativamente omissa e é-o se tivermos em linha de conta que estamos a tratar com um artigo da Constituição que sugere a especificidade de uma consulta popular directa e que, como tal, aconselharia - pelo menos o PS assim reteve dos debates anteriores - a uma formulação relativamente completa no texto constitucional das várias implicações do regime referendário específico no processo de regionalização. E, por isso, o PS cuidou de garantir regras de simultaneidade com o regime geral do referendo nacional em tudo aquilo que não for especificidade do referendo no processo de regionalização - matéria que se contém no n.º 3 da proposta apresentada pelo PS na reunião anterior -, bem como configurar, sem margem para ambiguidades, as características da natureza vinculativa que os referendos regionais devessem obter, matéria também constante do n.º 4 da proposta do PS e que são aspectos omissos na proposta que o PSD hoje nos apresenta.
Para além disso, que era certamente matéria contornável, as questões políticas nucleares subsistem relativamente às nossas reservas. O PSD, por um lado, entende que este tipo de referendo, que se reporta à criação de autarquias locais, deveria ser alargado a todo o universo eleitoral e não apenas ao recenseado no território nacional. Já expliquei a razão do nosso diferente ponto de vista neste ponto e não voltaria a repisar agora o argumento. Mas, por outro lado e sobretudo, o PSD entende, na sua proposta, duas coisas com as quais não concordamos, a primeira das quais é: que o referendo deve recair directamente sobre a lei de criação das regiões administrativas. Tal aspecto torna inevitável a possibilidade de uma rota de colisão na vontade expressa pelo soberano, por via representativa e por via directa, o que não é, do nosso ponto de vista, uma solução aconselhável do ponto de vista da salvaguarda do prestígio e da própria eficácia das deliberações democráticas. Nesse sentido, a proposta que o PS apresentou é bastante mais cautelosa, do ponto de vista da compatibilização entre a vontade do soberano, expressa por via representativa, e a vontade do soberano susceptível de se exprimir por via de consulta popular directa. Aliás, é curioso verificar que, no n.º 1 do artigo 256.º, tal como o PSD o apresenta, não está definido o efeito de um eventual referendo negativo sobre a lei de criação das regiões. Tudo leva a deduzir que esse efeito não poderia deixar de ser o de uma consequência de revogação integral, por efeito directo, de um referendo negativo. Seria um aspecto a regular necessariamente e também está omisso na proposta do PSD, o que evidencia como a rota de colisão na expressão da vontade do soberano é alguma coisa de latente nesta proposta e que não consideramos aceitável.
Por outro lado, quanto à controversa questão da simultaneidade, tivemos ocasião de dizer, por uma e outra vez, aos Srs. Deputados do PSD que entendíamos que a questão da simultaneidade não deveria ser dirimida pelo legislador constitucional e que não deveríamos exigir ao texto da Constituição uma regra de rigidez nessa matéria. Qualquer solução de rigidez excessiva é sempre condicionadora das opções democraticamente sufragadas pelos eleitores e, como não está em causa nenhum princípio essencial na defesa das concepções estruturantes do Estado de direito, garantir uma opção política rígida em sede de texto constitucional é alguma coisa que não favorece o próprio pacto de regime em termos constitucionais. Por isso, volto a sublinhar que não poderemos aceitar uma solução que configure uma rigidez quanto à obrigatoriedade da não simultaneidade dos referendos.
Ao contrário desta proposta do PSD, a proposta do PS acautela tanto a possibilidade de os referendos poderem ocorrer em simultaneidade como de poderem ocorrer em regime de não simultaneidade. E esta maior flexibilidade, que resulta da proposta do PS, é aquela que, a todas as luzes, nos continua a parecer a mais defensável, razão pela qual - todas as razões foram já expressas nos debates