Portanto, é uma reprodução da lei ordinária por razões de mera cautela e, como sabem, a mera cautela muitas vezes é importante. Todos nós sabemos isso.
O Sr. Dr. João Paulo Rodrigues (Representante do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público): - Eu iria só referir alguns tópicos essenciais dos nossos comentários aos projectos, começando referir três aspectos entre os vários analisados.
Parece-nos extremamente saudável a inclusão de um novo n.º 5 no artigo 205.º, proposto pelo Sr. Presidente António Cluny, relativo à constitucionalização da dependência funcional relativamente às autoridades judiciais. O tema também tem dado lugar a discussão no âmbito da legislação ordinária, apesar de aparentemente o nosso sistema processual penal depender exactamente deste princípio. Por outro lado, a extinção dos tribunais militares ou a limitação da sua existência para o chamado tempo de guerra, também nos parece um dos aspectos, da forma como funcionam os tribunais militares, que levanta algumas dúvidas quanto à sua constitucionalidade, designadamente quanto à representação do Ministério Público nesses tribunais.
Parece-nos também ser meritória, entre outras propostas, a inclusão de eventuais provas públicas no concurso de acesso ao Supremo Tribunal de Justiça. Como é destacado em documentos comunitários da legislação actual, é muito duvidosa a constitucionalidade da lei ordinária, os tribunais sociais, nesta matéria, designadamente uma ideia de prevalência do mérito como único critério. Não obstante outros requisitos, na verdade, na prática e mesmo na lei, o critério essencial que tem vigorado é a antiguidade e, no fundo, a ideia de o Supremo Tribunal de Justiça ser um lugar de carreira e não tanto um topo da organização judiciária. Daí que, na nossa perspectiva, seria saudável, além da inclusão de provas públicas, pelo menos a um nível, a inclusão de outros princípios que resolvessem algumas dúvidas que têm sido colocadas designadamente na interpretação da lei ordinária. Depois, deveria ser explicitado que a selecção deve ser baseada exclusivamente no mérito. A ideia seria a do concurso curricular com provas públicas, como já expliquei, e, eventualmente, a da possibilidade de um júri que não seja tão corporativo como, na prática tem existido, mas que possa envolver o conjunto dos mundos judiciário e universitário, para evitar qualquer neo-corporativismo.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, têm a palavra para comentar esta pequena proposta de revolução da Constituição judiciária.
Sr. Deputado José de Magalhães, faça favor.
O Sr. José Magalhães (PS): - Se o Sr, Presidente nos permite, vamos, agradecemos desde logo as contribuições que são trazidas e vamos considerar cuidadosamente as que dirigem ao projecto de revisão constitucional que apresentamos, às propostas concretas que são analisadas uma a uma no texto bem elaborado que nos foi dirigido por escrito e agora complementadas pelas soluções orais.
Nas circunstâncias em que estamos a fazer esta discussão, eu iria, por um lado, registar que a linha de revisão constitucional quanto ao estatuto do Ministério Público se distingue tecnicamente da que apresentamos, mas não na filosofia, ou seja, usamos uma atitude de prudente omissão de alterações que pudessem ser interpretadas por uma transposição para o terreno da revisão constitucional de uma atitude de conflito entre magistraturas contrária à ideia de paz constitucional e paz entre magistraturas, que deve preconizar por todos os meios e que queremos assegurar na parte que nos cabe, naturalmente.
Por isso mesmo não cuidamos, por exemplo, de reformular o conceito de autonomia, que, aliás, impulsionamos e que ficou consagrada na segunda revisão constitucional em termos que, do ponto vista da exacta formulação constitucional, poderia ter encontrado outras formulações mas que naquela que ficou consagrada permitiu boas e positivas concretizações no terreno da legislação ordinário. Outra coisa é saber se se deve aditar, por exemplo, qualificações, elementos de densificação como aqueles que aludem à exclusiva vinculação da Magistratura a critérios de legalidade, objectividade e imparcialidade, por considerar essa hipótese de densificação parcial quanto a outras projecções que procuram corporizar conquistas do terreno da legislação ordinária mas que fluem de soluções constitucionais já, inequívocas. Suponho que é preciso ter um prudente cuidado e uma prudente medida, não vá a eventual ausência de consenso nessa matéria criar perturbações, ou dúvidas, ainda que eu entenda que é legítimo extrair ilações negativas da não aprovação de certas propostas. Estou a referir-me à que adiantou agora em relação ao n.º 3, ao eventual n.º 3 ou n.º 4.
Outra coisa diferente é, no que respeita a obras de cirurgia arquitectónica que visem precisar a Constituição no que diz respeito à forma de organização interna dessa entidade que tem a designação de Procurador-Geral da República ou, como dizia o Sindicato, quebrar a não referência ao Conselho Superior do Ministério Público como entidade a quem compete o exercício de acção disciplinar, solução cujas origens é de todos muitíssimo bem conhecida e dos magistrados em particular.
A mesma razão nos levou a não propor obras de fundo em relação à composição do Conselho Superior do Ministério Público. Veremos que impacto é que a vossa proposta granjeia junto dos nossos colegas igualmente e, em função disso, teremos ocasião de definir oportunamente uma posição.
Gostaria de vos perguntar como é que encaram duas questões, sendo a primeira a seguinte: o PSD adianta uma proposta, a propósito do artigo 221.º, que vejo criticada no vosso documento, tendente a aditar um inciso em matéria de definição das competências do Ministério Público à participação da instrução da política criminal definida pelos órgãos de soberania. É esta a expressão do PSD, mas é mais a vossa análise do que a proposta do PSD que me merece este pedido de declaração.
No vosso documento refere-se o seguinte: "a expressão pode vir a ser objecto de interpretações no sentido de envolver o Ministério Público na execução do pedido de segurança do governo, o que se afigura incompatível com a função do Ministério Público como órgão de justiça." E depois diz-se: "é necessário clarificar o regime de definição dos crimes, penas", etc. - remeto para o documento por brevidade. Ora, isto coloca-me alguma interrogação sobre o lugar que imaginam que deva ter cada uma das estruturas.
Como costuma dizer o Prof. Gomes Canotilho nesta matéria, "há aqui um problema constitucional". Há um problema constitucional porque, não sobrando dúvidas que o Ministério Público goza de autonomia, não sobrando dúvidas que o governo tem determinadas competências e