então, porventura, mais sentido deslocar aquilo que a Constituição inicialmente possa admitir em sede de disposições finais para mais tarde, então sim, haver uma plena integração ao nível dos princípios fundamentais que estão espelhados no artigo relativo às relações internacionais.
Como os Srs. Deputados podem compreender, estas argumentações são mais de oportunidade do que de princípio e, como tal, argumentos de oportunidade não admitem, certamente, opções dogmáticas. Estamos por isso, desde já o declaro, disponíveis para ponderar as outras razões que em sentido diferente possam ser explicitadas para, num espírito de síntese e de consenso, virmos a optar pela solução que, tudo visto e ponderado, nos pareça a mais aconselhável.
Dito isto, se me permitem, passaria agora a dizer algo sobre o tema do espaço jurídico europeu.
O projecto do PS levanta esta questão - porventura, é o único que o faz -, aí sim, em sede de artigo 7.º, ponderando a possibilidade de a norma que já se contém no artigo 7.º, relativamente à admissão por Portugal da sua participação no exercício em comum dos poderes necessários à construção da União Europeia (os requisitos do exercício em comum desses poderes necessários à construção da União Europeia, fundamentalmente os que se reportam à realização da coesão económica e social), ser alterada, tendo em vista que se a dinâmica da construção europeia serve, por um lado - e deve continuar a servir -, a realização da coesão económica e social, por outro lado, desenvolve-se noutros âmbitos igualmente significativos, sendo um deles o do "espaço de liberdade, de segurança e de justiça".
O conceito de cidadania europeia interpela-nos justamente para a compreensão de que esse espaço de liberdade, de segurança e de justiça se abre à nossa frente como um espaço de progressiva harmonização de muitos princípios e regras de procedimento em matéria de espaço judiciário comum aos Estados da União.
Sabemos, aliás, que esta matéria tem merecido bastante reflexão no próprio processo de aprofundamento da União. Começou por ser inserida, ao nível do Tratado de Maastricht, como matéria do segundo pilar, em termos que a compreendiam numa lógica de intergovernamentalidade; com o Tratado de Amesterdão, muitas das normas que inicialmente tinham sido concebidas nesse plano foram comunitarizadas e são hoje matérias da competência plena dos órgãos da União Europeia, como é o caso do regime do asilo, das políticas de imigração, do controlo das fronteiras externas da União, dos problemas da liberdade de circulação, designadamente de acordo com o adquirido pelos Acordos de Schengen.
Existem, contudo, outras vertentes, vertentes essas que se reportam, no Título VI do Tratado da União, a outros domínios igualmente do maior relevo. Refiro-me à cooperação policial e judiciária em matéria penal e à prevenção do combate do racismo e da xenofobia, o que implica um amplo leque de situações em que tenderá a haver uma acção comum cada vez mais estreitada no domínio da cooperação judiciária, designadamente em matéria penal.
Como resulta dos próprios artigos do Título VI do Tratado da União, essa cooperação judiciária em matéria penal passa por criar, designadamente: formas de harmonização na tramitação processual; formas de cooperação e de harmonização quanto à execução das decisões judiciais; formas de cooperação e de "facilitação" relativamente ao regime da extradição praticado entre os Estados membros e por assegurar as normas de compatibilidade aplicáveis entre esses mesmos Estados. Consequentemente, este conjunto de situações deve merecer a nossa ponderação, e deve merecê-la, aliás, de maneira a termos em linha de conta o que se tem vindo a passar no quadro da própria União.
Sabemos, desde logo, que as conclusões de Tampere, de Outubro de 1999, criaram uma significativa ênfase em torno destes domínios. Aí se referiu que o reforço do princípio no domínio da cooperação penal deveria contribuir não só para facilitar a cooperação entre autoridades como também para melhorar a protecção judiciária dos direitos individuais, e que muito disto está associado às ideias que implicam uma possibilidade de reconhecimento recíproco das decisões judiciais, quer em matéria civil quer - o que é dito explicitamente - em matéria penal. Esta é, aliás, a conclusão actualizada das posições da presidência do Conselho Europeu de Tampere, como referi, mas também do chamado Score-board, que vai fazendo a avaliação dos progressos realizados na criação do espaço de liberdade, de segurança e de justiça na União Europeia, com permanente ênfase nestes domínios. Eles vão tendo, aliás, tradução prática.
Ainda esta semana, se me é permitido recordar, o Governo decidiu enviar para a Assembleia da República, para aprovação e posterior ratificação, a convenção relativa ao auxílio judiciário em matéria penal entre os Estados membros da União Europeia. E, se verificarmos o âmbito normativo que integra essa convenção e que prevê, designadamente, a constituição de equipas de investigação conjuntas entre os Estados membros, soluções normativas para a intercepção de telecomunicações relativamente às investigações encobertas ou entregas vigiadas, relativamente aos métodos de combate à criminalidade organizada transfronteiriça, relativamente à possibilidade de entrega, ainda que circunstancial, de detidos para poderem ser investigados ou inquiridos em tribunais de jurisdição de outros Estados membros.
Compreendemos que estamos perante uma realidade em processo significativo de mutação que nos leva a ponderar o seguinte: se não fizermos uma reflexão com incidência constitucional sobre todo este conjunto de tópicos, de um dia para o outro poderemos correr o risco de estarmos confrontados com um problema de desconformidade de medida normativa, por via de algo que tenha a ver com directivas, com decisões-quadro ou com a aprovação de uma convenção, que nos coloque numa situação semelhante àquela em que estivemos relativamente ao Estatuto do Tribunal Penal Internacional. Com uma diferença, todavia: a decisão voluntarista de criação do tribunal internacional penal resultou de uma conferência expressa, sob a égide das Nações Unidas, visando justamente a criação desse novo órgão na ordem internacional, enquanto que, em sede da União Europeia, o espaço jurídico, o espaço judiciário europeu e a problemática da liberdade, da segurança e da justiça é algo que está no nosso horizonte, uma vez que está inscrito no texto dos tratados, e cujo aprofundamento, portanto, está ao nosso alcance poder compreender e, em consequência, desde já antecipar relativamente às suas possíveis implicações em sede constitucional.
Estas implicações podem, designadamente, situar-se relativamente a artigos da nossa Constituição que tenham a ver com as matérias penais e do processo penal e, particularmente, quanto ao próprio regime da extradição.
Assim sendo, também nos pareceu que uma esperança/previsão de que o contributo português para o aprofundamento