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O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sem prejuízo de observações mais pormenorizadas que venham a ser feitas a propósito de cada uma das disposições, há uma questão fundamental nesta matéria que é a regulação da comunicação social, a existência de mecanismos de regulação, a sua configuração e a respectiva autoridade reguladora. É esta a questão central que está aqui em discussão e é sobre ela que me irei pronunciar.
O PCP não apresentou, intencionalmente, propostas de alteração nesta parte, embora o tenha feito na revisão constitucional de 1997. Este foi, portanto, um dos capítulos relativamente aos quais, desta feita, optámos por não apresentar propostas de alteração e reservámo-nos para a discussão das propostas que viessem a ser apresentadas, dado que tinha sido anunciado por vários partidos que esta seria uma das questões centrais dos respectivos projectos de revisão.
Quero dizer, em primeiro lugar, que consideramos de grande importância a existência de um mecanismo regulador da comunicação social. Não somos daqueles que pensam que a comunicação social se auto-regula e que essa auto-regulação é suficiente. Temos tido experiências de uma confiança, porventura exagerada, na auto-regulação e já verificámos que ela não tem funcionado, e mesmo vários esforços que foram feitos por algumas entidades de mediar tentativas de auto-regulação entre os operadores, designadamente em matéria de televisão, saíram, de certa forma, frustradas.
E, pela importância burocrática que tem o sector da comunicação social, entendemos que faz todo o sentido que exista uma entidade reguladora forte, que tenha, de facto, competências e meios para poder cumprir a suas atribuições, até porque temos exemplos, não muito recuados, em que se fez sentir com particular acuidade a ausência de uma entidade reguladora com a força necessária para poder evitar, sancionar e prevenir abusos cometidos por operadores de televisão, que, de facto, punham em causa princípios elementares de respeito pela dignidade das pessoas. Portanto, entendemos que esta discussão sobre a entidade reguladora é de grande importância.
Foi dito aqui que o modelo assente na Alta Autoridade para a Comunicação Social é falido. Aí nós, aceitando essa tese, temos de responsabilizar, sobretudo, os accionistas dessa empresa, que foram nem mais nem menos do que os dois maiores partidos, que acordaram a criação da Alta Autoridade para a Comunicação Social com uma determinada configuração, na revisão constitucional de 1989, modelo de que nós discordámos e que, quer pela composição que foi fixada no texto constitucional, quer, pior ainda, pela concretização legal que lhe foi dada, aponta para a governamentalização da entidade reguladora.
É preciso dizer que o balanço que é possível fazer do trabalho desenvolvido pela Alta Autoridade para a Comunicação Social ao longo destes anos, desde 1990 até hoje, não é tão negativo como a origem e a configuração inicial desta entidade permitiriam supor.
Sabemos que a Alta Autoridade nasceu ferida de morte devido à composição que lhe foi determinada pela disposição constitucional, que aponta para uma Alta Autoridade que é uma emanação da maioria governamental, qualquer que ela seja, pelo facto de nela não existirem representantes do próprio sector da comunicação social, dos jornalistas ou da cultura portuguesa, enfim, qualquer representação que não seja a determinada pela Assembleia da República, pelo Governo e pelos elementos que sejam cooptados pelos membros assim designados. Portanto, a Alta Autoridade nasceu ferida de morte na sua credibilidade, enfraquecida - aliás, ela era conhecida, geralmente, pela "alta autoridade contra a comunicação social".
É preciso dizer que, entretanto, as pessoas que desempenharam funções na Alta Autoridade, ao longo dos seus vários mandatos, fizeram um esforço, que importa saudar, para, apesar de tudo, credibilizarem a actuação da Alta Autoridade. Ela não se limitou a uma função sancionatória ou fiscalizadora, procurou ter uma intervenção pró-activa e promover a reflexão sobre vários aspectos relacionados com a comunicação social, em Portugal. Lembro-me, por exemplo, de várias conferências promovidas pela Alta Autoridade, designadamente sobre a violência na televisão e, enfim, sobre vários temas de grande relevância. Portanto, creio que, apesar de tudo, o balanço não é tão negativo como poderia ter sido.
O que acontece é que, em determinados momentos, se exige da Alta Autoridade para a Comunicação Social uma intervenção forte, que ela não tem condições para ter, designadamente porque ao acréscimo de competências que entretanto foi sendo dado à Alta Autoridade para a Comunicação Social não correspondeu em acréscimo dos meios e da capacidade para poder actuar em conformidade com as mesmas. Por conseguinte, exige-se um órgão forte quando se criou um órgão relativamente fraco, daí, por vezes, alguma frustração relativamente à intervenção, ou à falta de intervenção, por parte da Alta Autoridade para a Comunicação Social, em momentos de crise.
Chegados a este processo de revisão constitucional, não seremos nós a lamentar uma alteração do texto constitucional se o que for aprovado vier para melhor. Efectivamente, a Constituição prevê um modelo governamentalizado de entidade reguladora e, obviamente, teria o nosso apoio uma solução que cortasse com essa governamentalização e criasse condições para que essa entidade fosse forte e dotada de meios para funcionar de forma livre, independentemente de quaisquer pressões por parte dos poderes instituídos.
As propostas com que somos confrontados, que nos foram apresentadas para discussão, colocam-nos alguma perplexidade - e não estou a referir-me à arreliadora gralha da primeira versão do projecto do Partido Socialista mas, sim, às várias propostas que temos em presença -, porque são vazias.
A proposta da maioria limita-se a estabelecer que há uma entidade administrativa independente e, depois, que a lei define a composição, organização e competência da entidade referida no número anterior, bem como o estatuto dos respectivos titulares, devendo assegurar que a maioria dos membros sejam eleitos pela Assembleia da República ou por estes cooptados. Até aqui, nada de novo: retira-se a representação directa do Governo, continua a representação da Assembleia da República, não se sabendo como é que ela será feita, e, depois, estabelece-se que os que forem eleitos pela Assembleia da República vão cooptar os outros. Portanto, esta é uma proposta em branco e pode nada melhorar relativamente à situação existente; pelo contrário, até pode, no limite, piorar a situação actualmente existente.