649
DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
encontrar modo que difficultasse mais essa apreciação, nem que excedesse o systema que emprega agora...
(Interrupção do sr. Lopo Vaz, que não se ouviu na mesa dos tachygraphos.)
Não desejo queixar-me do illustre relator da commissão, cujo notavel talento e amor ao trabalho, sou o primeiro a apreciar e louvar devidamente.
A explicação do illustre deputado, permitta-me que lhe diga, não me explicou cousa alguma.
Eu sei que é facil comparar cada uma das verbas com as verbas da legislação de 1873, e é isso o que estou fazendo para discutir este projecto, porque tenho de um lado o projecto, e do outro a legislação de 1873.
Talvez a difficuldade para mim provenha de ser pouco conhecedor da legislação do paiz, e de não estar habituado a este genero de trabalho.
É possivel que não seja difficil para o resto da camara este modo de apreciação, de que eu me queixo, e que é extraordinariamente facilitado talvez pela circumstancia de possuirmos apenas um exemplar da legislação vigente.
De certo, emquanto eu estou examinando a legislação, os meus collegas podem ter trazido cada um de sua casa um exemplar da legislação de 1873 para procederem ao mesmo exame.
E eu creio que era facil obviar á falta de volumes da legislação, sem o illustre relator ter excesso de trabalho.
Para isso bastava copiar ao lado de qualquer alteração consignada n'este projecto, a disposição do regulamento de 1873, e assim, ao passo que no projecto se via a disposição que se substitue, via-se ao mesmo tempo aquella que era substituida.
Declaro a v. ex.ª, que para mim, advogado, ha quasi vinte annos, habituado a examinar a legislação portugueza, é difficil discutir um projecto em similhantes condições; para os mais póde ser facil o que para mim é quasi impossivel de conseguir.
Eu esperava, quando se leu o projecto, que o illustre relator da commissão se levantasse para fazer uma reclamação contra os erros typographicos que tivessem alterado o artigo 2.°; mas vejo que este artigo, como se acha impresso, tem todos os vizos de que se acha conforme com o que foi redigido.
Ver-me-hei, portanto, forçado a dizer a s. ex.ª e á camara que estimarei muito que me seja provado que, ou não sei ler, ou não sei entender aquillo que leio.
Eu leio na redacção d'este artigo 2.°: «São sujeitos em qualquer parte da monarchia ao imposto do sêllo os titulos de divida publica emittidos por governos estrangeiros, e as acções ou titulos e obrigações dos bancos, companhias ou associações mercantis estrangeiras de qualquer natureza.»
Esta disposição generica, ou eu não sei ler ou não sei entender o que leio, tributa o facto da emissão de titulos de divida publica estrangeiros, ou de acções e obrigações dos bancos, companhias ou associações mercantis estrangeiras. Tributa o facto da emissão em absoluto sem exigir requisito algum, em virtude do qual se reconheça que os titulos de divida publica tributados, ou acções e obrigações dos bancos, companhias ou associações mercantis estrangeiras, são apenas aquelles que por qualquer principio ou por qualquer disposição venham procurar em Portugal um meio de negociação.
(Interrupção.)
Torno, pois, a ler.
(Leu.)
Não tem Portugal, nem Inglaterra, nem Hespanha. O que está aqui é isto.
(Leu.)
Por este facto, logo que se dá uma emissão qualquer n'um paiz estrangeiro, em qualquer parte da monarchia essa emissão está sujeita ao imposto do sêllo.
Digam os illustres deputados o que quizerem, entendam como quizerem; mas o que está aqui é isto.
(Leu.)
(Interrupção.)
Ainda assim havia muito que discutir a esse respeito. Pelos principios de direito internacional que eu aprendi, as nações tributam os valores ou titulos de sua propriedade, mas respeitam as propriedades alheias. (Apoiados.)
Creio que tudo isto está esquecido; ninguem trata d'este assumpto.
O artigo tributa em absoluto; e é para isto que chamo a attenção de v. ex.ª e da camara. Tributa em absoluto a emissão de titulos de divida publica estrangeiros, ou de acções e obrigações dos bancos, companhias ou associações mercantis estrangeiras.
Faço justiça á illustre commissão do que não é isto talvez o que queria dizer; mas é isto o que se diz aqui.
A explicação que se dá no § unico, vou eu mostrará illustre commissão que não melhora muito o defeito que eu n'este momento trato de arguir.
O § unico diz o seguinte: — «Os titulos, as acções e as obrigações de que trata este artigo, que não tiverem sido devidamente sellados, não podem ser mencionados por seu dono, possuidor ou detentor, ou por qualquer corretor, official ou funccionario publico em documentos de partilha, emprestimos, deposito, compra ou venda, penhor ou caução, ou n'outro qualquer acto ou documento, nem empenhados, expostos á venda, negociados ou transmittidos por qualquer modo.»
Sei, e sei praticamente, e a illustre commissão ha de saber muito melhor do que eu, que muitos cidadãos portuguezes têem titulos de divida publica estrangeiros, e tenho-os eu, e apesar d'isso os individuos donos d'elles nunca os viram. (Apoiados.) E naturalmente, por muito tempo que ou os conserve, nunca os vejo; porque esses titulos ficam depositados no paiz a que pertencem e d'onde os individuos recebem apenas os juros ou os dividendos. (Apoiados.)
Como imaginou a illustre commissão de fazenda a possibilidade de cada individuo, possuidor de apolices de divida publica do Brazil, apolices que estão no Brazil, que não saem de lá, poder vir sellar em Portugal esses titulos, impondo-se a pena de multa aos donos d'esses titulos que não foram aqui negociados? Por fórma alguma podem ser multados aquelles, que não imagina mesmo a possibilidade de serem os titulos negociados aqui quando os não possuam em Portugal, quando não mandam vir para Portugal, porque não podem mandar vir, porque não os podem retirar de lá, e é injusto que soffra uma penalidade grande, quem não póde sujeitar ao sello aqui os titulos que lhe pertencem, mas que os não tem.»
Creio que alguns paizes têem, e com muita rasão, estabelecido um imposto sobre as negociações, nas suas bolsas publicas e officiaes, de titulos e valores estrangeiros, que em regra não podem ser negociados fóra dos paizes a que pertencem, e que quando sollicitam a garantia de poderem ser negociados e vendidos em paizes estrangeiros, podem muito bem soffrer o encargo de pagar o imposto, que ao mesmo tempo que é uma como que compensação do favor que lhes é concedido, permittindo-se-lhes a livre negociação, é uma especie de garantia que assegura aos paizes estrangeiros a validade d'esses titulos. Acho, por consequencia, até certo ponto esta disposição racional e justa. (Apoiados.)
Mas uma disposição generica, que parece á primeira vista, que vae tributar os emprestimos estrangeiros de modo que alguem que fosse bastante credulo a respeito da nossa omnipotencia parlamentar, podesse crer que iriamos receber impostos pelo ultimo emprestimo russo; (Riso.) uma disposição, digo, redigida n'estes termos e tão larga, que mesmo quando se restrinja pelo § do artigo que se discute, vem
Sessão de 16 de março de 1878