10 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
titutos de instrucção secundaria se trata apenas de dar inteira execução ao que, ha muito, estava legislado.
E S. Exa. sabe muito bem que os professores de instrucção secundaria, mormente hoje, com o novo regime de estudos, teem um trabalho por tal forma pesado, que se tornaria por demais odioso cercear-lhes o que por lei lhes é devido.
Ora o decreto com força de lei de 29 de julho de 1886, promulgado por um illustre estadista, que a S. Exa. deve merecer todo o affecto, qual é o Sr. Conselheiro José Luciano de Castro, estabeleceu que os professores dos lyceus, alem do ordenado de categoria, venceriam uma gratificação "na razão de um terço do mesmo ordenado"; e o decreto com força de lei de 22 de dezembro de 1894, que presentemente regula a organização do ensino secundario, na tabella n.° l manteve este principio do vencimento de exercicio na razão do terço dos vencimentos fixos.
Mas sabe a Camara como tem sido entendido o pagamento d'este terço? Dividia-se a sua importancia annual por 12, e, em vez de abonar um duodecimo em todos os meses, como se faz com o ordenado de categoria, que é percebido mesmo nos meses de férias, apenas tem sido dado nos 10 meses de trabalhos lectivos. D'este modo a gratificação não era de um terço do ordenado, como a lei expressamente ordenava, mas sim de 5/18 do ordenado.
Ora é esta cerebrina interpretação, á qual era adverso o proprio chefe da Repartição de Contabilidade do Ministerio do Reino, funccionario intelligente e zelador dos interesses da Fazenda, que a emenda da commissão do orçamento teve em vista acabar.
Folguei, Sr. Presidente, em ver que o illustre Deputado, entrando nos dominios da Guerra, nos quaes peleja sempre com muita galhardia, começasse por affirmar que o exercito não é um cancro da nação. Effectivamente, durante muito tempo, individuos de ideias jacobinas quiseram ver no exercito um cancro roedor da vitalidade do país; mas, felizmente, ha alguns annos, e sobretudo desde 1894, teem esmorecido essas declamações anti-patrioticas.
Escusado, com effeito, será lembrar que as despesas militares se impõem como uma impreterivel necessidade, por isso que são ellas que asseguram a propria existencia da nação.
Os serviços militares são mesmo aquelles que mais precisam de uma organização perfeita.
Qualquer outro serviço pode a todo o tempo ser modificado, sem outra perda, que não seja, em regra, a de alguma fazenda; mas os erros das instituições militares, quando se põem em evidencia, muitas vezes já é tarde para os remediar, porque com a má sorte das armas tem sossobrado a propria independencia nacional. (Apoiados).
Não me proponho, porem, falar agora nas necessidades fundamentaes do exercito, nem mesmo na sua benefica acção educativa, mas lembrar apenas que elle representa tambem um valor economico.
S. Exa., que conhece a physiologia social, e não tem certamente sobre economia politica as ideias estreitas da physiocracia do Quesnay, sabe que o exercito tem tambem nas sociedades uma funcção productora. Produz segurança, e a segurança é um factor de valorização de todos os productos.
Portanto, Sr. Presidente, quando vejo estar a lamentar o dinheiro gasto com o exercito, dizendo-se que não serve para nada, faz-me lembrar o cliente de uma companhia de seguros, que lamentasse o dinheiro gasto nos premios, porque a casa não lhe ardeu. (Riso).
Com respeito ao nosso exercito, nem mesmo essa affirmação se poderia com justiça fazer, porque elle, ainda ha bem pouco tempo, defendendo valorosamente os nossos preciosos dominios ultramarinos, e levantando assim o prestigio do nome português perante as nações estrangeiras, prestou um valioso serviço ao país. (Apoiados).
É certo que custam caro os exercitos, mas isso comprehende-se, porque é uma consequencia da lei eterna do progresso.
Exa. sabe muito bem, Sr. Presidente, e sabe-o a Camara, que com a velha espingarda de pederneira se fizeram todas as campanhas do seculo XVIII e da primeira metade do seculo XIX; mas, depois d'isso, veja V. Exa. que de rapidos progressos se tem feito, e como em poucos annos um armamento se pode já considerar velho: apparece primeiro a ideia do estriamento, depois o carregamento pela culatra, em seguida as espingardas de repetição, amanhã talvez as culatras automaticas. Que enormissimas differenças tambem entre a velha artilharia de Gribeauval, que representava já um consideravel progresso sobre as anteriores bocas de fogo, e as modernas peças de tiro rapido; entre os effeitos da antiga polvora negra e os dos modernos explosivos!
Mas, para dotar um exercito com todos estes productos do progresso, é preciso gastar muito dinheiro, e por isso se nota que em toda a parte os orçamentos do Ministerio da Guerra do anno para anno teem um consideravel accrescimo.
Tambem, Sr. Presidente, foi hoje feita uma justa referencia á pequenez do effectivo do nosso exercito. É isso certamente um grave estorvo para a instrucção militar e para a mobilização; e por isso julgo da maior utilidade que no espirito dos nossos legisladores se vá assim insinuando a ideia de que, para podermos ter um exercito regularmente instruido e preparado para a guerra, é absolutamente indispensavel ir augmentando a verba destinada ás tropas, até se attingir um effectivo, presente nas fileiras, de 30:000 homens. Era esta a idéa fundamental d'esse grande estadista, que se chamou Fontes Pereira de Mello, e é tambem a opinião que o nosso distincto collega Francisco Machado tem judiciosamente defendido em alguns dos seus eruditos discursos parlamentares.
Portanto, Sr. Presidente, o que se encontra no orçamento da Guerra não são esbanjamentos, são exigencias das necessidades do serviço, a que nenhum país pode furtar-se para ter o seu exercito regularmente organizado.
Muito de fugida fez o illustre Deputado Sr. Oliveira Mattos uma desfavoravel referencia ao que S. Exa. chamou ao desastre de Trajouce"; e confesso, Sr. Presidente, que isso me penalizou, porque julguei haver esclarecido suficientemente esse ponto, quando pela primeira vez tive a honra de falar nesta Camara. E, na verdade, S. Exa. tendo, como tem, talento de sobra para abranger tal assumpto num ponto de vista intelligente e justo, não carecia de recorrer apenas a uma phrase ôca e injusta.
Não repetirei, pois, nada do que sobre a questão já disse; mas, visto que novamente sou chamado a campo, referir-me-hei apenas, por a hora estar tão adeantada, ao immenso serviço que as grandes manobras, quando orientadas no sentido em que o nobre Ministro organizou as do ultimo anno, veem prestar para o desenvolvimento da aptidão do alto commando.
E um tal problema deve certamente merecer o mais vivo interesse a todos os illustres Ministros da Guerra, pois que do alto commando pode, de um momento para o outro, depender o futuro da patria. (Apoiados).
Ora a preparação do generalato para a Guerra, pelo que respeita á intelectualidade pode fazer-se só com o esforço individual, quer pelo estudo da historia militar que constitue o fundo do processo napoleonico, quer pela leitura dos grandes tratadistas modernos, como Clausewitz e Jomini, quer ainda pelos problemas nas cartas topographicas.
Pelo que respeita, porem, á habilidade profissional, essa só pode adquirir-se pelas manobras de quadros e, melhor ainda, pelas manobras de grandes unidades, e quer para umas quer para outras só requer a intervenção do Ministro, que é quem pode auctorizar os meios de realização.
Nestas manobras uma das qualidades que mais se deve