SESSÃO NOCTURNA N.° 45 DE l DE ABRIL DE 1902 11
procurar desenvolver é o espirito de decisão e iniciativa os chefes, e para tal fim de pouco servem os exercidos com manobra obrigatoria, que são os que geralmente se teem executado entre nós, pois que nesses todas as phases do combate estão previamente determinadas, tratando-se portanto apenas da adaptação conjugada de schemas tacticos a dadas formas de terreno.
Por isso muito bem andou o Sr. Conselheiro Pimentel Pinto ordenando que as ultimas manobras tivessem a forma de semi-livres, nas quaes só são dadas as directrizes geraes da luta, deixando aos commandantes dos partidos adversos, a ordenação dos pormenores.
É indispensavel que passemos a esta categoria de manobras, e, mais ainda, que cheguemos breve ás manobras livres, nas quaes apenas é indicado o objectivo que cada partido deve ter em vista, pois que são estas ultimas as que eficazmente servem para a preparação profissional do alto commando.
Mas é claro que uma tal aprendizagem, sobretudo no periodo de iniciação, não pode fazer-se sem erros. É a ordem natural das cousas, a que ninguem pode subtrahir-se. E então para que tanta estranheza?
Bem insignificantes foram os erros, para o que seria licito esperar do nosso anterior apego á manobra obriga teria. (Apoiados).
Peço a V. Exa., Sr. Presidente, e peço á Camara me desculpe por ter entrado nestes pormenores technicos. Eu bem sei que os Parlamentos, sempre avidos da questão politica, nunca perdoam este delicto; mas, já agora que tanto incorri em falta, completarei o crime, dizendo que modernamente, no intuito de aproximar ainda mais as grandes manobras das condições reaes da guerra, se procura fazer intervir tambem nelle o imprevisto, para obrigar os generaes a tomarem de prompto uma resolução adaptada ás circunstancias supervenientes.
Nas ultimas manobras francesas de oeste, o generalissimo Brugère, quando o 11.° e o 18.° corpos de exercito manobravam livremente um contra o outro, reservou como neutra uma brigada de infantaria colonial, a qual ficou á sua disposição para, nas phases finaes do combate, a fazer intervir, como elle julgasse mais conveniente, do lado de ataque ou do lado da defesa, modificando de subito as condições da luta.
É assim que, por toda a parte, se procura desenvolver o espirito de iniciativa, tão necessario no alto commando. O illustre Deputado, que tanto interesse tem pelas questões militares, certamente conhece a historia militar, contemporanea, e sabe bem que foi esse um dos mais importantes factores das victorias das tropas allemãs na guerra de 1870.
Só nas grandes manobras, com liberdade de execução, é que o generalato se pode preparar para exercer efficazmente o cominando na guerra.
O Sr. Oliveira Mattos: - Eu já vi em França uma revista de 80:000 homens.
O Orador: - Eu tambem já alguma cousa tenho visto não só na França, mas na Allemanha, na Italia e em outros países da Europa.
Sr. Presidente: vae por demais adeantada a hora, e, por maior que seja a benevolencia da Camara, deve certamente estar já fatigada de ouvir-me.
Vou, pois, concluir; mas, antes d'isso, desejava completar um judicioso pensamento, que no outro dia aqui formulou o meu dilecto amigo e collega, Sr. Conselheiro Eduardo Villaça, cuja palavra eloquente, sincera e erudita é sempre ouvida com o merecido agrado. (Apoiados).
Disse S. Exa. que era preciso que houvesse espirito de sequencia nas reformas militares.
Folgo immenso em estar plenamente de acordo com S. Exa.
É da mais absoluta necessidade; e tanto assim, que as instituições militares mais perfeitas, como, por exemplo, as prussianas, são sempre a obra methodica dos longos periodos de paz.
É preciso que as diversas medidas reformadoras, não só sejam harmonicas e coherentes, mas tambem, e sobretudo, que se lhes dê tempo para se consolidarem.
Mas, Sr. Presidente, para haver sequencia, é indispensavel criar um orgão que a assegure, através das fluctuações da politica.
Precisamente agora se está debatendo em França este momentoso assumpto, por entender-se que os variaveis pontos de vista dos diversos Ministros teem prejudicado a consolidação das suas instituições militares.
Em seguida á guerra franco-allemã, o illustre Ministro da Guerra, o General Cissey, em 1872, com o fim de dar unidade aos trabalhos de reorganização do exercito, criou o Conselho Superior de Guerra; mas, a breve trecho, com a tendencia tão peculiar nos povos latinos, de cuidarem mais da palavra do que da acção, o conselho estava transformado em um pequeno Parlamento, onde o tempo era largamente desperdiçado em bellos discursos.
Em 1890, M. Freycinet, que era então o Ministro da Guerra, tentou insuflar-lhe vida, dando-lhe funcções mais activas e ligando mais directamente a sua responsabilidade á preparação da guerra, pois que o Vice-Presidente era o generalissimo designado, e faziam parte do conselho os generaes escolhidos para commandantes dos diversos exercitos.
O resultado, porem, não tem correspondido aos intuitos da instituição, e, por isso, está largamente lançada a ideia de criar uma especie de commando em chefe, como nós outr'ora tivemos, tornando ostensiva a investidura do generalissimo, a qual, como se sabe, até agora tem sido meramente secreta e sem os correspondentes poderes.
Repugna a medida ao espirito democratico da nação francesa; e é curioso que, no intuito de tornear a difficuldade, se aventou agora um alvitre analogo ao que, com applicação a nós, emitti no começo d'este anno em um jornal technico.
Consiste esse, alvitre na criação, de um inspector geral do exercito, que igualmente seria o director designado das operações de campanha, e que assim, preso por tão grave responsabilidade pessoal, não deixaria de cuidar assiduamente em tudo o que interessa á preparação para a guerra, objectivo fundamental do exercito.
É, pois, indispensavel o espirito de sequencia, como muito bem disse o Sr. Villaça; mas essa sequencia só poderá tornar-se effectiva, estabelecendo um órgão que a assegure.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem.
(O orador foi cumprimentado por muitos Srs. Deputados).
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado João Augusto Pereira pediu a palavra para explicações de facto: mas, como a hora vae adeantada, consulto a Camara sobre se devo ou não dar a palavra a S. Exa.
Consultada a Camara, resolveu affirmativamente.
O Sr. João Augusto Pereira (para explicares): - Sr. Presidente: comprehende V. Exa., e a Camara tambem, que não é nesta altura da sessão, a tão altas horas da noite, que eu poderia usar da palavra para responder ao discurso do illustre Deputado Sr. Frederico Martins.
A parte politica d'esse discurso terá resposta, que espero será cabal, quando se realizar a interpellação ha muito annunciada ao nobre Presidente do Conselho, acêrca do modo como na Ilha da Madeira se realizaram as eleições dos Deputados e as districtaes, e sobre os motivos que levaram o Governo a adiar a realização das ultimas.
Manifestou o illustre Deputado desejos de que essa interpellação se realize, porque tenciona tomar parte nella. Junto os meus aos desejos de S. Exa. e faço ardentes votos por que o nobre Presidente do Conselho, que é um notabilissimo parlamentar, se apresse a declarar-se habilitado para responder a ella. (Apoiados).
Será essa a melhor opportunidade para apurar e apre-