1108
mettimentos e as sommas correspondentes não prendem directamente com as receitas e despezas ordinarias. Os subsidios em questão são porém apenas para attenuar os deficits, porque nem mesmo chegam para os extinguir.
Para as provincias de Cabo Verde e de S. Thomé não ha subsidio algum. Para Angola pedem-se 60:000$000 réis; para o estabelecimento de Mossamedes 30:000$000 réis; para Moçambique 52:000$000 réis; para Timor e melhoramento da barra de Goa 40:000$000 réis. E só para Timor e Goa que se pede subsidio sufficiente para cobrir o deficit. Em todas as outras provincias as despezas ficam muito superiores ás receitas.
Tendo dito o que me pareceu sufficiente para provar que não era este o momento de nos occuparmos dos subsidios applicaveis ás despezas ordinarias das provincias ultramarinas, e manifestado o receio de que não sejam sufficientes, peço comtudo á camara que me permitta retirar a proposta de adiamento pelos motivos que no principio apresentei.
Consultada a camara, permittiu que se retirasse a proposta.
O Sr. Ministro da Marinha: — Concordo com o illustre deputado em que seria muito conveniente discutir os subsidios para as provincias ultramarinas conjunctamente com o orçamento do ultramar. S. ex.ª porém reconhece a impossibilidade de tal fazer em presença das circumstancias. Não se pôde conseguir ainda, nem será possivel tão depressa, o que já indiquei no relatorio que precede o orçamento do ultramar, isto é, que este orçamento seja comprehendido no orçamento do reino. Pertencendo pois as verbas dos subsidios das provincias ultramarinas ao orçamento do continente, claro é que não podem deslocar-se d'aqui, e passar para aquelle. As reflexões justas do illustre deputado provam sómente a conveniencia, repito, já por mim tambem indicada, de incluir o orçamento do ultramar no do reino como parte que é do mesmo todo; mas essa conveniencia, para ser convertida em realidade, precisa vencer graves difficuldades, das quaes a primeira é não haver ainda communicações regulares em todas e com todas aquellas provincias. Sem a possibilidade deter colligidos a tempo os dados necessarios não é dado a ninguem effectuar essa desejavel operação. Esta a condição indispensavel para passar da doutrina á pratica.
Aproveito a occasião para dissipar uma duvida, na anterior sessão apresentada pelo illustre deputado, o sr. Matos Correia, ácerca do orçamento extraordinario da marinha para o futuro anno economico. Pareceu a s. ex.ª acanhada a verba de 200:000$000 réis em presença dos navios que ha para apparelhar, apromptar e completar. Penso que a s. ex.ª não occorreu que para esse fim, e para não pararem os trabalhos, apresentei já a proposta de um credito extraordinario de 180:000$000 réis nos limites do actual anno economico.
Tornando ao orçamento do ultramar, direi que tenho feito o possivel para cumprir strictamente a lei. Apresentei esse orçamento em ambos os annos da minha gerencia, apresentei o logo que pude (apoiados). Se não está confeccionado com perfeita actualidade, como seria para desejar, provém, como todos sabem, das difficuldades insuperaveis que já mencionei, e que impedem o colligir com a precisa antecipação os respectivos documentos. O que faço é tomar todas as providencias a fim de que o orçamento do ultramar se vá successivamente approximando ao que deve ser. Não dissimulo os seus defeitos, mas creio que ainda assim é serviço importante (apoiados), o vale mais do que sua obstinada ausencia (muitos apoiados).
Devo tambem notar ao illustre deputado que o deficit em relação a cada uma das provincias ultramarinas é mais nominal do que real. As verbas de despeza, como s. ex.ª sabe, referem-se aos quadros completos, e desgraçadamente esses quadros nunca estão completos, já por falta de pessoal habilitado, já pelos obitos occorridos. No relatorio respectivo se pondera esta grave circumstancia, e se declara como tal deficit é singularmente attenuado pelo incompleto dos quadros.
Ao deficit notado na provincia de Cabo Verde, nas circumstancias actuaes forçosamente se ha de prover com os soccorros extraordinarios, que tem de se dar aquella provincia (apoiados). Está a insta-lo a humanidade! (Muitos apoiados.)
Emquanto á provincia de S. Thomé, o deficit resulta apenas do atrazado e incompleto das informações a que foi necessario recorrer, porque a sua receita vae augmentando, e cada vez ha de augmentar mais, porque esta provincia, em caminho de larga prosperidade, não precisa senão de braços para produzir copioso rendimento.
Quanto ao atrazo dos pagamentos, que se nota em algumas provincias, lembrarei aos illustres deputados, que o lembraram, que achei esse atrazo em grande escala. Tenho empregado todos os meios para o fazer desapparecer, sem contar o melhoramento de posição de varias classes de empregados. Estes longos e anteriores males não se curam de repente. No ultramar não é possivel saldar contas fazendo ponto, nem eu o proporia. Para remover é necessario pagar mezes dobrados. É preciso fazer o que se fez, no districto de Mossamedes por exemplo, onde se deviam 14 mezes, e onde em 5 mezes se pagaram 9.
De muitas cousas precisa o ultramar, mas de duas sobretudo. Moralidade e capital. Moralidade primeiro, capital depois. Para obter isto é indispensavel pagar bem e castigar melhor (muitos apoiados). Para moralisar emprego tambem os meios legaes, empregarei os mais energicos; espero com elles conter os funccionarios de todas as ordens nos limites dos seus deveres; não me accusa a consciencia, para isso tenho feito quanto posso (apoiados): Se os meios que me dá a actual legislação forem insufficientes, desassombradamente declaro á camara que estou resolvido a pedir-lhe as reformas necessarias, a fim de acabar promptamente os abusos terriveis, que são a verdadeira origem de todas as calamidades. Não hesitarei na severidade, e conto com o auxilio do parlamento (muitos apoiados). D'esses abusos inveterados (apoiados), tem nascido o descredito para a administração, e males incalculaveis para aquellas provincias (apoiados). É preciso acabarem, e hão de acabar (muitos apoiados).
De outra cousa precisam tambem, como disse, as provincias ultramarinas, é de capitães, mas de capitães que se traduzam em movimento, em actividade, em industria. O capital dos subsidios, attesta-o a experiencia, é um incitamento á indolencia. Essas provincias tomam assim o logar de pensionistas do estado, logar humilhante para a sua categoria, para a sua importancia, para o seu futuro. O capital que se troca em valor de trabalho é o unico que lhes convem, porque é o unico fecundo. (Vozes: — Muito bem). Para alcançar este apresentei a devida proposta tão bem auspiciada já. É o melhor e o maior subsidio! (Apoiados — Vozes: — Muito bem.)
O sr. F. L. Comes (sobre a ordem): — Em observancia do regimento vou ler a proposta que mando para a mesa (leu). Ha sete annos que por esta camara foi votada uma verba para o supprimento das despezas publicas de Solor e Timor e melhoramentos da barra de Goa.
Devo dizer á camara, que até hoje a fazenda de Goa não recebeu um real, e por isso os melhoramentos da barra não se têem feito.
Este anno tenho maiores esperanças, pelas palavras animadoras da commissão de fazenda, e por algumas providencias que o illustre ministro tem adoptado em relação aquella provincia. Refiro-me á draga que s. ex.ª tinha mandado comprar.
O meu fim, fazendo esta proposta limita-se a separar a verba do subsidio para a barra de Goa, da verba destinada a supprimir o deficit na provincia de Timor.
Nada mais digo sobre este assumpto, porque me parece que a minha proposta é simples e não faz senão tornar a promessa mais solemne e segura a garantia. Quero ter direito para a reclamação.
Quanto á discussão do orçamento do ultramar, estou de accordo com o sr. ministro da marinha, em que elle deveria ser discutido juntamente com o orçamento do ministerio do reino. Mas isto é difficil conseguir-se, e já muito tem feito o nobre ministro em apresentar em dois annos consecutivos regularmente o orçamento das provincias ultramarinas.
Tenho a pedir a s. ex.ª uma cousa, que é igualmente necessaria e muito importante para a apreciação clara da despeza das mesmas provincias. E vem a ser — a publicação das contas da gerencia e exercicios das juntas de fazenda no ultramar, depois de serem julgadas pelo conselho ultramarino.
Está estabelecido em lei que estas contas devem ser julgadas pelo conselho ultramarino, mas tão excellente disposição não se tem tornado uma realidade. Eu insisto n'este ponto, porque tenho apprehensões sobre o modo como se fazem as despezas no ultramar.
Não digo mais nada para não tomar mais tempo á camara.
A proposta é a seguinte:
PROPOSTA
Proponho que dos 40:000$000 réis, propostos para supprimento das despezas publicas de Timor, e melhoramentos da barra de Goa, sejam destinados 5:000$000 réis para esta ultima obra. = Francisco Luiz Gomes.
Foi admittida.
O sr. Ministro da Marinha: — Unicamente para declarar que aceito completamente a proposta do illustre deputado.
O sr. A. J. de Seixas: — Pedi a palavra para mandar para a mesa a seguinte proposta (leu).
O motivo por que pedi a palavra sobre este assumpto foi por ver que no orçamento da provincia de Angola apparece um deficit de 155:000$000 réis, e este deficit provém das crises por que aquella provincia tem passado desde 1859, em que tem estado constantemente em guerra.
Felizmente esta guerra acabou, e n'este logar devo render homenagem ao illustre governador (apoiados) que se acha á testa daquella provincia e que empregou todos os meios de prudencia e ao mesmo tempo de dignidade; para que ella tivesse um termo. E não posso, na qualidade de deputado pela provincia de Angola, deixar tambem de darem nome dos meus constituintes os meus agradecimentos ao sr. ministro da marinha pelas instrucções que deu para que a guerra, que felizmente acabou sem o estrondo das armas, mas em harmonia com os interesses economicos mui importantes, em harmonia com as forças de que dispomos, e que só com grandes sacrificios acabaria de outro modo, acabasse com dignidade para o estado; por tudo isto; sr. presidente, pronuncio n'esta camara honrosamente o nome do sr. José Baptista de Andrade; actual governador de Angola, que levou aquella colonia ao ponto em que estava em 1859, senão á completa prosperidade; a um estado de paz (apoiados).
Sr. presidente, os 120:000$000 réis que peço para a provincia que tenho a honra do representar, só deixarei de instar por elles, se acaso são de todo verdadeiras, como supponho, as informações que o sr. ministro acaba de dar ao nobre deputado, meu amigo, o sr. Matos Correia; ficando-me comtudo a impressão de que o subsidio de 90:000$000 réis, pedido pelo nobre ministro da marinha, é insuficiente para Angola no anno de 1864 a 1865.
Disse o sr. ministro que espera que com a continuação da paz o deficit desappareça. Não duvido que assim aconteça, mas tenho sempre a dizer a s. ex.ª que ha em Angola dividas provenientes do estado de guerra em que O paiz se tem achado. Ha fornecedores que não têem recebidos os creditos que o estado lhes deve. Ha mesmo dividas, segundo me consta, ao cofre dos orphãos, as quaes o estado não tem pago por falta de recursos, e ha igualmente muitos empregados do estado a quem se estão em divida dos seus vencimentos.
S. ex.ª mesmo acabou de dizer que no districto de Mossamedes ha cinco mezes de atrazo.
O sr. Ministro da Marinha: — O districto de Mossamedes tinha quatorze mezes de atrazo e em cinco mezes têem-se pago nove.
O Orador: — Em Loanda consta-me que ha quatro mezes de atrazo. Emquanto a Mossamedes aceito a rectificação do nobre ministro da marinha.
Ora sendo o deficit de 155:000$000 réis (e eu não quero tomar este ponto de partida), entendo que os 120:000$000 réis, apesar de serem attenuados por falta de preenchimento dos quadros, não são de mais; mas se o illustre ministro julgar que não precisa d'elles para acudir ás necessidades financeiras d'aquella provincia, eu retirarei a minha proposta, e a retirarei porque não sendo ella apoiada por s. ex.ª a camara não a votará, e a responsabilidade não me ficará pelo futuro.
Sr. presidente, devo dizer em relação á provincia de Angola que, é verdade que os subsidios para as provincias ultramarinas fazem má impressão n'esta camara, porque se pensa geralmente que uma colonia, que tem de ser subsidiada pelo estado e que não póde viver dos seus rendimentos proprios, merece pouca consideração; mas devo dizer que estes subsidios têem sido dados em tempos anormaes, em estado completamente anormal, porque até 1859 não precisou a provincia, que tenho a honra de representar, de subsidio algum para poder fazer face ás suas despezas.
Esta necessidade veiu com as occupações militares do Ambriz, do Bembe e do Congo (e com guerras sobrevindas á provincia por causa d'estas occupações, e pelas sublevações do Cassange e outros pontos, promovidas em parte pelos maus governos do interior), porque até ahi ella não se tinha feito sentir, e isto é rasão de sobejo para diminuir a má impressão que geralmente faz na camara quando se pedem subsidios para as provincias de alem mar, em que Angola figura com uma maior cifra.
Devo tambem declarar que até 1837 a provincia de Angola forneceu mais de 1.500:0001000 réis á metropole, e em 1837 ainda vieram 137:000$000 réis, governando aquella provincia o sr. M. B. Vidal, como governador geral de Angola.
Portanto isto é um adiantamento que a provincia ha de satisfazer um dia largamente, ou é uma quantia que se desconta em um valor que ella já deu em outras epochas mais felizes para os seus interesses, eu entendo que não é uma esmola que se lhe faz. Direi mais em relação á provincia de Angola que, tendo-se achado desde 1859 affectada por uma crise commercial, proveniente de desastrosas guerras com os indigenas que embaraçavam o desenvolvimento das suas relações commerciaes, e não a deixava prosperar, ha alguns mezes a esta parte, desde outubro para cá, tem remettido para o porto de Lisboa treze carregamentos, no valor de mais de 800:000$000 réis. Tem-se isto effectuado depois da paz que o actual governador, o benemerito sr. Andrade, conseguiu, cumprindo as instrucções acertadas que o sr. ministro da marinha lhe deu, na execução auxiliada pelo patriotismo de muitos particulares. De modo que aquella provincia está hoje num estado, senão de prosperidade, pelo menos lisongeiro.
O illustre deputado e meu amigo, o sr. Sá Nogueira, que pertence a uma familia que tem prestado serviços ao ultra mar, e tem concorrido para que se tenha feito ali alguma cousa na ordem de todos os interesses, fallou aqui em colonisação. Sinto não poder alongar me sobre este assumpto por ir adiantada a hora.
A hora, repito, vae adiantada, e eu poucas observações poderei fazer até que a sessão se levante. E, ainda que assim não acontecesse, não seria eu quem tratasse este assumpto de uma maneira satisfactoria, porque não sou orador, e me acho incommodado.
Mas, sobre colonisação, eu direi unicamente á camara e ao illustre ministro que a verdadeira colonisação é a que for livremente promovida pelo governo. Emquanto se não tratar de civilisar os pretos, emquanto não se mandarem para Angola o para as nossas provincias do ultramar boas auctoridades, ellas não podem prosperar (apoiados).
E direi mais, não como advertencia a s. ex.ª (longe de mim similhante pensamento, porque sei o zêlo que emprega nos negocios da repartição a seu cargo), que um dos maiores males que soffre Angola provém da má administração, não da primeira auctoridade da provincia e de muitos outros funccionarios que são honrados e cuidadosos, mas da má administração militar e judicial no interior da provincia, as quaes produzem as guerras que collocam geralmente a metropole na necessidade de remetter para ali soccorros pecuniarios e de gente (apoiados).
Eu, como deputado d'aquella provincia, preciso fazer esta declaração franca e lealmente; quaesquer que sejam as inimisades que me acarrete.
Acham-se em Loanda, capital da provincia, nove officiaes mettidos em processo por corrupções; mas é preciso que o nobre ministro da marinha e a camara saibam que a lei que actualmente existe é impotente para punir taes corrupções (apoiados), porque os officiaes têem o fôro de ser julgados pelos seus camaradas.
Não quero, sr. presidente, lançar insinuações sobre nomes e sobre quem está ausente. O que quero é fazer ver a maneira por que os processos correm em Angola perante os conselhos de guerra e a maneira como as sentenças são pronunciadas concedendo quasi sempre a absolvição aos que commettem estes crimes de corrupção e ve-