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6 ANNAES DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

foi ameaçada pelo que votou, mas pelo que falou.

Eu nunca fui ameaçado pelo que votei, mas pelo que disse.

Nunca fui ameaçado pela acção que fiz interferir em qualquer acto politico ou parlamentar, mas pelas palavras que me sairam da boca.

O que é preciso, o que é indispensavel, é que se reconheça aos Dignos Pares o direito á liberdade da palavra, quando tenham de alludir a qualquer acto da politica portuguesa.

O que é necessario é que o Governo comprehenda a necessidade e a possibilidade de viver com a Camara dos Pares, e mais nada.

Agora vou entrar na parte do meu discurso, em que eu muito especialmente quero dar á Camara a explicação do que eu supponho ser a verdadeira causa da attitude inerte dos partidos.

Qual é a razão por que não falam de partidos?

Porque não falam os chefes d'esses partidos?

Vou dizer a S. Exa. o que se me afigura ser a razão d'esta mudez.

É porque, na resposta ao Discurso da Coroa, os partidos, symbolizados nos seus chefes, preferem a commodidade do silencio ás asperezas da luta parlamentar.

Eu sou do tempo, Sr. Presidente, em que se batalhava sem receio de contundir a effeminada cutis dos adversarios.

Lembro á Camara as lutas parlamentares, vivas, intensas, poderosas, como foram as de 1887, 1888 e 1889.

Nessa epoca, excepção feita á minha modesta figura, o Parlamento Português attingiu a sua maior altura do periodo constitucional.

Sou do tempo, Sr. Presidente, em que os partidos politicos se não melindravam com qualquer accusação mais vehemente, com qualquer palavra mais áspera.

Quero prestar aqui a minha homenagem aos homens d'essa epoca, que se mantiveram sempre na luta, sem um desfallecimento, sem o menor colapso.

É necessario que todos se convençam de que o Parlamento Português se fez para a luta, sem offensa para ninguem.

Fala-se e fala-se claramente.

Poderá haver excessos?

Melhor.

Poderá haver abuso de palavras?

Melhor.

Poderá haver, excesso na maneira por que exteriorizamos os nossos pensamentos?

Antes assim, porque se vive, porque se luta, porque se mostra que somos homens.

Lutemos todos, respeitando a honra pessoal de cada um, na defesa dos interesses da nação e sem fazer intervir nos debates a mais pequena intriga politica. (Apoiados do Julio de Vilhena).

Agradeço o apoiado do Digno Par.

Vamos agora á explicação do silencio.

Em 1906, o chefe da ultima situação politica, fez na Camara dos Senhores Deputados declarações da mais alta gravidade acêrca dos adeantamentos á Casa Real.

Tendo a honra de fazer parta d'esta assembleia politica, interpellei directamente, mais do que uma vez, o então Presidente do Conselho, e não podendo obter d'esse homem de Estado resposta que me satisfizesse, appellei, como não podia deixar de appellar, para os tres estadistas, então todos vivos, que já tinham occupado a cadeira da Presidencia do Conselho no reinado de D. Carlos I.

Eu vou provar a V. Exas. que o silencio de hoje tem somente um unico fim.

E o fim de liquidar o assunto dos adeantamentos, não sobre as costas dos partidos, como elle tem de ser liquidado, mas sobre a cabeça de El-Rei.

Hei de provar esta minha asserção.

Repito: o fim é liquidar, não sobre as costas dos partidos, como tem de ser liquidado, mas sobre a cabeça de El-Rei, o caso dos adeantamentos á Casa Real e o aumento da lista civil.

Conhecem-me V. Exas. sufficientemente para não supporem que eu venho neste momento entrar na discussão d'esse projecto de lei. Venho, no uso legitimo do meu direito, como Par do Reino, e tratando-se de um debate amplo, como é, em politica, a discussão da resposta, ao Discurso da Coroa, apreciar á sua verdadeira luz a significação politica do estado actual das cousas, e a situação dos partidos.

Em 1906, não tendo eu alcançado resposta que me satisfizesse por parte do Sr. Presidente do Conselho, de então, dirigi-me aos illustres estadistas que tinham sido chefes do Governo em situações transactas. Respondeu-me o Sr. Hintze Ribeiro, infelizmente já roubado á admiração de todos nós, assim como me responderam o Sr. José Luciano de Castro, felizmente ainda vivo, e o Sr. José Dias Ferreira, já fallecido.

Eu tenho aqui na minha presença a sessão n.° 28 de 21 de novembro de 1906, e nella se vê que a forma da resposta dos dois chefes politicos — Hintze Ribeiro e José Luciano de Castro — se é inteiramente diversa nas palavras, não deixa por isso de ser absolutamente identica na sua significação.

Cada uma das respostas corresponde á maneira de ser politica e parlamentar de cada um dos oradores. Hintze Ribeiro, sempre abundante no dizer; José Luciano de Castro, como sempre no principio das suas orações politicas — e isso certamente para nunca passar do principio — de uma extrema concisão.

A intenção do Sr. Hintze Ribeiro tinha por fim explicar o que fez e excluir o que não fez, e a intenção do Sr. José Luciano de Castro dirigia-se expressamente a mostrar directamente á Camara e que não fez. No fundo ambas valem o mesmo.

A resposta dada pelo chefe do partido progressista, embora na forma seja diversa da que foi formulada pelo então chefe do partido regenerador, é-lhe, no fundo, absolutamente identica.

O Sr. José Luciano, negando que nas suas gerencias houvessem sido feitos adeantamentos á Casa Real, nem por isso invalida a affirmativa de que o facto se desse com outras administrações.

Ambos aquelles Dignos Pares confessaram, um restringindo a negativa, outro levantando a affirmação, que adeantamentos tinham sido feitos á Fazenda da Casa Real.

Depois o Sr. José Dias Ferreira, usando da palavra, collocou-se absolutamente fora das responsabilidades.

Sr. Presidente: resumindo os factos, chego ás seguintes conclusões: que os chefes politicos dos dois grandes partidos rotativos, interpellados directamente por mim, usaram da palavra, e ambos confessaram que se tinha saido para fora da dotação da Casa Real Portuguesa, e que esse excesso de despesa era de dupla natureza: despesas de representação e obras nos Paços Reaes.

Nem do chefe progressista, nem do chefe regenerador se póde obter, a mais simples palavra que pudesse significar a existencia de quaesquer adeantamentos, que não fossem exclusivamente estes. Muito bem.

Tendo nós de liquidar, como homens de bem que nos prezamos de ser, e como politicos serios e graves, as nossas responsabilidades, que temos que fazer?

Singelamente, francamente, trazer á Camara a conta completa dos adeantamentos á Casa Real. Trazida essa conta, a Camara ha de verificar o seu montante, a sua natureza e estabelecer por qualquer meio a forma da sua liquidação, não com a Corõa, que está posta, de lado, mas unicamente com os partidos.

Vamos ver o que se fez.

Eu não posso acreditar que o Sr. Presidente do Conselho tivesse trazido á Camara a proposta de lei relativa a adeantamentos e á lista civil, sem con-