SESSÃO N.º 18 DE 29 DE FEVEREIRO DE 1896 171
parte electiva d'esta camara? Houve conflictos, o governo encontrou attritos na camara dos pares? Não. Então se os não encontrou porque a dissolveu? Para crear o numero fixo? Mas o numero fixo é um absurdo.
O sr. ministro do reino ameaçou-nos dizendo:
«Juizo, muito juizo, se não o governo sabe o que ha de fazer.»
Ainda n'este ponto, permitta-se-me que diga, s. exa. este vê em contradicção comsigo mesmo, pois disse muito claramente que esta camara não tinha feição politica, que devia ser Conservadora. Não é politica?
Pois não é exactamente s. exa. que nos dá a feição politica? (Apoiados.)
Pois a camara dos pares não é politica?
As duas camaras não funccionam conjunctamente?
Não é esta camara, para assim dizer, quem corrige as demasias da camara popular?
Pois não trouxe o governo a esta camara o bill de indemnidade? Não foi a proposta do bill, senão a primeira, uma das primeiras que submetteu ao exame e approvação d'este ramo do poder legislativo?
Pois não é o bill de indemnidade a absolvição politica de todos os actos que o governo praticou dictatorialmente?
Se esta camara não é politica, ou não tem feição politica, escusava o bill de vir aqui.
Esta theoria é nova!
Se esta camara não é uma assembléa politica, então o que é?
Somos apenas uma chancella?
Sr. presidente, ha todavia um ponto que não comprehendi, apasar de ter a s. exa. na conta de uma alta capacidade.
Creia o nobre ministro que isto não é um comprimento, é a expressão exacta do que sinto.
S. exa. parece-me que pretendeu vir aqui paraphrascar as palavras de Fontes.
Quando pediram a Fontes reformas politicas, isto é, quando o partido progressista lhe pedia as reformas politicas, respondia aquelle grandioso vulto da politica contemporanea:
«Tive de percorrer o paiz de norte a sul e ninguem me pediu reformas politicas. Fallaram-me em pontes, em estradas, em melhoramentos materiaes de toda a ordem, mas ninguem me fallou em reformas politicas.»
Sabe v. exa., sr. presidente, o que depois succedeu?
Pouco depois Fontes Pereira de Mello apresentava a sua proposta de reformas politicas.
Aquelle estadista incorrera n'uma contradicção enorme, praticara o erro mais capital de toda a sua vida publica. (Apoiados.)
O chefe do partido regenerador, que era quem representava as idéas conservadoras, não devia apresentar a proposta para as reformas politicas.
Essa missão pertencia ao chefe do partido progressista e, se fosse este quem tivesse tomado a iniciativa da apresentação de uma proposta para reformar alguns artigos da nossa constituição, seria muito possivel que essas reformas ainda hoje existissem. (Apoiados.)
O partido progressista não desapprovou por completo essas reformas, tolerou-as simplesmente, e o resultado é aquelle que estamos presenciando e ainda o que teremos de presenciar. (Apoiados.)
Creia o sr. ministro do reino que no dia em que o governo de que s. exa. actualmente, faz parte, abandonar essas cadeiras, o partido progressista ou qualquer outro, ha de reivindicar os seus direitos, ha de restabelecer as regalias que s. exas. tiraram, e o chefe do estado ha de conceder-lhas, porque não é chefe de um partido, porque não póde negar a uns aquillo que tão prodigamente dispensou a outros. (Apoiados.)
Quando o partido progressista ou outro qualquer, disser ao chefe do estado que é indispensavel proceder a certas reformas, decretar umas determinadas medidas, o soberano ha de concordar com os individuos que então formarem o governo, sejam elles quaes forem.
Fallou-nos o sr. ministro do reino no seu manifesto politico. Pois permitta-me s. exa. que eu diga que tal documento é que não está á altura da sua reconhecida capacidade.
Aqui está o confronto com Fontes.
Disse s. exa. que de todos os pontos do paiz lhe pediram a reforma da lei eleitoral, que exigiram que corrigisse os vicios d'esta lei,, e que lhe indicaram a necessidade da reforma da camara dos pares, e que ninguem fez; opposição aos intuitos que o governo manifestava.
Pois o partido progressista e os homens politicos não disseram alto e bom som que se tocassem na lei eleitoral e na reforma da camara dos pares, à sua abstenção seria plena e completa?
Pois se isto é uma verdade, não contrariou o governo, muito intencionalmente, o partido progressista?
Pois o procedimento do partido progressista não teve origem na declaração franca que elle apresentou? O que disse o partido progressista ao governo?
Disse-lhe que fizesse dictadura, muito embora, em questões de administração, mas que não tocassem em dictadura na reforma da lei eleitoral nem na reforma da camara dos pares, e pozeram logo, clara e nitida, a sua questão de abstenção.
Ouviu o governo estas advertencias?
Não ouviu nada, fechou os ouvidos; mas, se os fechou para não saber ou fingir não saber aquillo que lhe era ponderado, não venha agora dizer que ninguem fez opposição ás suas reformas.
Fizeram opposição, fizeram-n'a da maneira mais solemne, fizeram-na e chegaram a levar a sua abstenção até o conselho d'estado.
Sabe v. exa. qual é a minha opinião a este respeito?
As cousas são o que são.
Esse partido absteve-se, e com elle homens importantes na politica. Consequencia d'essa abstenção, a confusão e este espectaculo; por isso estas leis, que estão sendo votadas, hão de ser, fatalmente, revogadas. Não são os homens que se assentam hoje nas cadeiras do poder, não é o governo, quem soffre com isso; é o paiz quem ha de soffrer as consequencias d'estes desatinos politicos, permitta-se-me que o diga.
Sr. presidente, sinto-me cansado, por conseguinte, vou concluir, acrescentando apenas o seguinte:
O sr. ministro do reino, certamente por um lapso de memoria, disse que as revoluções n'este paiz tinham acabado em 1851. Ora, as revoluções não acabaram n'essa epocha. A ultima revolução foi aquella em que o marechal Saldanha se apresentava, de madrugada, no palacio da Ajuda, e quasi que intimava o rei a demittir o duque de Loulé. Todos sabem como então os factos se passaram, e, portanto, é inutil insistir sobre este ponto.
Ha revolução armada e revolução pacifica. Revolução pacifica é a que se está dando n'este momento por parte do governo.
Disse o sr. ministro do reino: «A opinião publica está comnosco». Ora, é preciso que s. exa. saiba, e isto era a opinião de um homem que n'esta mesma cadeira se assentava antes de mim, que n'este paiz nunca houve revolução que vingasse, sem ser secundada, pela força publica.
Desde que á força, publica não tomar parte, não ha revolução.
Portanto, os actuaes srs. ministros podem dormir socegados, escusam de augmentar a guarda municipal e o corpo de policia, porque, emquanto o exercito não quizer tomar parte em qualquer demonstração, nada haverá de revolução e s. exas. podem dormir descansados, evitando assim as grandes despezas com esse corpo de guardas, aliás bonito,