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4 ANNAES DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

respeito das cartas de El-Rei, na ultima sessão legislativa, e, ferindo esse exemplo, pretendeu basear nelle a sustentação da sua these.

Não, Sr. Presidente, isso não pode ser, nem será: a pessoa do Rei é irresponsavel, a pessoa do Rei é sagrada, nos termos da constituição portuguesa, é verdade; mas os actos do Rei são, necessariamente, discutiveis sob o aspecto politico e por elles responde, como pelos actos do executivo, o Governo que ali está sentado. (Apoiados).

Se Louve hora desastrosa para esta Camara foi aquella em que depois de ter permittido, como devia, a discussão de um diploma que respeitava exclusivamente aos mais importantes problemas politicos da nossa terra, a mesma Camara resolveu, que esse diploma não podia continuar a ser discutido.

O então nosso Presidente, que me impediu de falar, teve commigo attenções especiaes.

Mas o facto politico, o contrasenso parlamentar, ficou tristemente grave nos nossos annaes.

Hoje, no seu discurso, o Sr. Julio de Vilhena disse que a pessoa do Rei é inviolavel e sagrada, e que, por conseguinte, não a discutirá.

Segundo a Constituição portuguesa a pessoa do Rei é inatacavel, não ha duvida; mas os seus actos são inteiramente discutiveis, caem no dominio da discussão parlamentar. Tambem não ha, não pode haver duvida a este respeito.

O Sr. José de Alpoim: — Apoiado.

O Orador: — Não se diminue por este facto o prestigio do Monarcha.

Vejamos o que ainda ha poucos dias se passou na Inglaterra.

O Rei Eduardo resolveu avistar-se com a Familia Imperial da Russia, que elle havia já bastante tempo não visitava.

Levantou-se na camara dos Communs o mais violento debate parlamentar, por o Monarcha se não lazer acompanhar de um representante do Governo.

Sr. Presidente: sabe V. Exa. o que aconteceu?

Venceu o Parlamento, e o Governo voltou atrás, reconsiderou. O Rei Eduardo VII teve de ser acompanhado por um Ministro, como era de obrigação constitucional.

Diga-me agora V. Exa. se ha por esse mundo fora Monarcha mais respeitado, mais venerado e mais querido no seu país que o Rei Eduardo de Inglaterra; e diga-me se por aquelle facto se enfraqueceu ou diminuiu o prestigio da monarchia inglesa.

Taes são os verdadeiros principios constitucionaes, e é bom que d’elles nos não afastemos.

Mas vejamos: a Carta Constitucional não estabelece qualquer desigualdade entre a Camara dos Deputados e a Camara dos Pares no que diz respeito á sua competencia de apreciação e critica.

Tanto uma como outra podem, versar livremente todas as questões de administração e de legislação. A historia constitucional prova bem o que estou dizendo.

O artigo 15.° da Carta Constitucional enumera entre as attribuições das Côrtes a seguinte:

«Na morte do Rei ou vacancia do Throno, instituir exame da administração que acabou, e reformar os abusos nella introduzidos».

E o artigo 139.° diz que as Côrtes Geraes, no principio das suas sessões, examinarão se a Constituição politica do reino tem sido exactamente observada.

Tambem ha um artigo que diz que a iniciativa de qualquer reforma constitucional deve ter origem na Camara dos Senhores Deputados.

Finalmente, segundo o artigo 36.°, pertence aquella mesma Camara dos Senhores Deputados iniciar o exame da administração passada e a reforma dos abusos nella introduzidos.

Ha aqui uma differenciação entre o que pertence á Camara dos Senhores Deputados e o que compete á camara dos Dignos Pares.

Evidentemente que ha, mas tal differenciação não contende de modo nenhum com a nossa liberdade de discussão, e não contende de forma nenhuma com a faculdade de nomearmos commissões de inquerito.

Manifestamente que o direito das duas Camaras, a este respeito, é absolutamente identico.

A Carta Constitucional estabelece mais que é privativa da Camara dos Senhores Deputados a iniciativa sobre impostos, sobre recrutamento e sobre a discussão das propostas do poder executivo.

Nestes casos, sim, estabelece uma precedencia, mas essa precedencia não abrange o caso de que estamos tratando.

Vejamos, porem, como desde a outorga da Carta até agora a Camara electiva tem procedido.

Aquella Camara tem,[sim, assumido a iniciativa das discussões só ore impostos, sobre recrutamento, sobre a reforma da Constituição e sobre as propostas emanadas do poder executivo, mas nunca se preoccupou com o exame dos actos de qualquer administração passada.

Os membros das duas casas do Parlamento usam sempre da maxima liberdade, em qualquer momento das sessões legislativas, para examinar, discutir e apreciar, como melhor entendem, os actos do Governo; mas nunca se cumpriu a disposição do artigo 36.° no seu § 1.°, pelo que respeita ao exame das administrações passadas.

Isto dito, Sr. Presidente, por uma forma simples e breve, resta-me declarar que não posso deixar de votar a proposta do Digno Par Sr. Sebastião Baracho.

Ha apenas um ponto com o qual eu não estou de acordo com S. Exa. É aquelle que se refere aos poderes de prova.

Entendo, Sr. Presidente, que a faculdade de exigir juramento e de inquirir testemunhas não está na alçada de uma Camara ordinaria.

Entendo que, collidindo esse facto com a organização do poder Judicial, só em Côrtes de caracter extraordinario é que o assunto pode ser ventilado.

É esta a unica reserva que eu faço relativamente á proposta do Digno Par Sr. Sebastião Baracho.

Isto dito, Sr. Presidente, abandonemos Coimbra, e o espirito juridico; tratemos d’aquillo que constitue a parte politica do discurso do Digno Par Sr. Vilhena.

S. Exa.. ao entrar nesta parte do seu discurso, fez a declaração de que não tinha uma grande predilecção pelos programmas politicos, e pareceu-me entender que perante quaesquer dificuldades, cuja solução se impusesse em determinado momento, é que os partidos deviam olhar ao criterio que tivessem de adoptar.

Eu direi a V. Exa. que sou desaffecto aos grandes programmas partidarios, mas não o sou, nem o posso ser, á fixação ou affirmação dos principios pelos quaes os partidos politicos se propõem reger-se e governar o país, que tem o direito e até a necessidade de saber como será governado.

É que esses principios indicam a marcha fundamental, os traços geraes da acção partidaria, como, por exemplo, no que respeita a liberdade de cultos, relações do moderador com o legislativo, liberdade de imprensa, emfim, no que respeita a assuntos essenciaes da vida social; é que pela enunciação dos principios de cada agremiação partidaria é que tanto a Nação como o Rei podem conhecer a maneira de sentir e pensar dos partidos.

Que um partido não possa dizer como resolverá, em determinadas circunstancias, quaesquer assuntos especiaes ou imprevistos, de acordo; mas que não sé explique sobre aquillo que é o seu criterio fundamental, a razão da sua existencia, o seu processo de acção e o seu fim politico e civilizador, isso, Sr. Presidente, não posso eu acceitar.