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SESSÃO N.°. 18 DE 19 DE JUNHO DE 1908 5

E foi por isso que liguei a maior importancia á confissão de S. Exa., que é hoje o chefe de um grande partido, e que não pode calar-se, como nenhum dos outros chefes, porque a Nação, repito, tem o direito de saber a vida que a espera, quando qualquer dos partidos ascenda aos Conselhos da Coroa.

Sr. Presidente: nesta altura do seu discurso, o Sr. Julio de Vilhena começou a revelar nos qual o proposito que o demovia.

S. Exa., que até então se havia desvanecido numa exposição juridica feita com todo o brilho e proficiencia de um cathedratico, começou a revelar-nos quaes os fins politicos da sua brilhante oração.

Ahi vae o primeiro.

Nesta altura do seu discurso, o Sr. Julio de Vilhena, voltado para o Governo que, por sinal, se achava representado pelo illustre homem de Estado, Sr. Campos Henriques, que tenho o prazer de ver deante de mim, dizia:

«E verdade que os partidos politicos apoiam o Governo, mas é preciso que façamos distincção: o Governo tem as suas responsabilidades proprias, das quaes não pode abdicar; essas responsabilidades não são dos partidos, são do Governo».

Depois, successivamente, o Sr. Julio de Vilhena indicava este ou aquelle assunto de administração do qual não tivera conhecimento hoje ou hontem, ou só o tivera por deferencia pessoal de um ou outro Ministro.

Emfim, o Sr. Vilhena desenvolvia com toda a amabilidade da sua palavra parlamentar a demonstração de uma these: que elle, que apoiava a situação, não tinha nada nem com as ideias, nem com os actos da situação.

Não sei se o Sr. Ministro da Justiça começa a comprehender.

O Sr. Vilhena apoia a situação como a apoia o partido progressista, mas faz distincção entre apoio politico e ideias de governo.

Esta distincção entre apoio politico e actos de governo ainda a não expôs o partido progressista; pelo menos outro dia, falando o Digno Par Sr. Beirão, não tive occasião de ouvir d'elle tal distincção, mas ouvi-a hoje ao Digno Par Sr. Vilhena.

Não sei se isto estabelece alguma differença de temperatura no apoio que os dois partidos concedem á situação, mas eu, que sou commentador imparcial do facto, devo dizer que se o ouvi d'aqui (indicando o logar onde se senta o Sr. Vilhena), não o ouvi de lá. (indicando o logar onde se senta o Sr. Beirão}.

O Sr. Vilhena voltava-se para o Sr. Ministro da Justiça e dizia: «apoio o Governo, sim, mas a responsabilidade do Governo, relativamente aos seus actos, pertence ao Governo», e o Sr. Ministro da Justiça, fazendo cara feia (Risos), respondeu: — Apoiado.

Permitta-me V. Exa. A um pequeno parenthesis.

O Sr. Ministro da Justiça dava então uma demonstração de uma verdade que devia existir no seu espirito: é que S. Exa. só tem a lucrar em abandonar por vezes o feitio seráfico da sua tempera.

Estou mesmo certo de que, se o fizer, obterá dentro em breve os melhores resultados.

E, se S. Exa. m'o permitte, até lhe darei um conselho: faça-se mansão. (Riso).

Sr. Presidente: os estrangeiros notam na maneira de falar dos portugueses um grande defeito. Geralmente o orador português engole as ultimas palavras da oração e relativamente a cada palavra engole as ultimas syllabas.

Ora, Sr. Presidente, a lingua portuguesa tem já varios defeitos, não lhe vamos nós acrescentar mais esse.

Façamos, pois, por dizer as orações e as palavras até o fim, para que nos possam ouvir á vontade estrangeiros e nacionaes.

Assim o devemos entender todos, e o Sr. Ministro da Justiça tambem. (Riso).

E não quero fechar este parenthesis sem tambem dar um conselho ao Sr. Ferreira do Amaral.

Peço ao Sr. Ministro da Justiça que lh'o transmitia.

Não sei ao certo se o Sr. Presidente do Conselho está satisfeito com o apoio politico do Sr. Julio Vilhena. Mas afigura-se-me que não, e nesta hypothese quero lembrar a S. Exa. que ha duas maneiras de fazer politica: uma cá dentro, nas salas do Parlamento, e outra lá fora.

Ora o que o Sr. Ferreira do Amaral deve fazer quando o atacarem lá fora é vir queixar-se cá dentro. (Riso).

Entrando agora propriamente na questão dos adeantamentos, eu não posso deixar de admirar a habilidade parlamentar do Sr. Julio Vilhena.

S. Exa. fez a este respeito um escarcéu medonho.

Apresentou á Camara varias soluções do litigio entre a Casa Real e o Thesouro Publico, quando se tratasse da liquidação.

Mas quem ouviu já falar em litigio algum a tal respeito?

Ninguem.

Sr. Presidente: eu sou antigo na Camara, e lembro-me perfeitamente do que se passou ahi por 1887.

Nessa epoca um grupo do partido regenerador entendeu dever estremar-se do partido e formar o que então se chamava a «esquerda dynastica».

Parece que esse grupo tinha qualquer entendimento politico com o então Ministro Fazenda, o grande talento que foi Mariano de Carvalho.

O que é certo é que d'essa esquerda partidaria resultou uma luta das maiores que se tem visto no Parlamento.

Os homens d'esse grupo inventaram um engenhoso meio de combate parlamentar, o qual consistiu em atacar, não o Governo, mas o Arcebispo de Larissa.

Não sei se V. Exa., Sr. Presidente, se lembrará d'esse famoso Arcebispo, de que nunca mais ouvi falar desde que a esquerda dynastica morreu. (Risos).

Quando Mariano de Carvalho não estava entendido com Barros Gomes, a esquerda dynastica dirigia-se ao Ministro dos Negocios Estrangeiros por causa do Arcebispo.

Mas quando Barros Gomes se aproximava de Mariano de Carvalho, o Arcebispo de Larissa descansava.

Durou isto dois annos.

Ora, nesta questão dos adeantamentos, dá-se um facto igual ou pelo menos identico: não se ataca o Governo; ataca se. . . o Arcebispo de Larissa. (Risos).

Mas do que eu ainda não ouvi falar foi no quantitativo dos adeantamentos.

Tambem ainda não ouvi. falar em que a Casa Real se quisesse eximir ao pagamento d'esses adeantamentos; pelo contrario, bem pelo contrario, o Chefe do Estado declarou querer fazer a liquidação.

Mas deixemos isto.

O Digno Par, fazendo voz irónica, dizia que os homens dos partidos não queriam a responsabilidade dos adeantamentos.

Eu entendi perfeitamente o Digno Par nesse assunto, e resolvi por minha parte estabelecer a doutrina que me parece ser verdadeira.

Sr. Presidente: - creio que relativamente a factos de ordem governativa os homens politicos se podem dividir, quanto á responsabilidade d'esses factos, em duas categorias:

1.° Aquelles que teem conhecimento dos factos.

2.ª Aquelles que não teem conhecimento dos factos.

Relativamente a phenomenos, sejam de ordem astronomica, sejam de ordem sociologica, não pode haver duvida em que a classe dos homens que os conhecem se separa, da classe dos que os não conhecem.

Isto não precisa de demonstração.

Encaremos, portanto, o problema nas suas duas partes.

Vejamos na primeira parte a responsabilidade dos homens que tiveram conhecimento dos factos, e na segunda