DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 557
por consequencia, de satisfazer esse encargo a dinheiro; ou então, de algum fiador de qualquer individuo ausente que foi recenseado, e que, não podendo apresental-o, teve de satisfazer a fiança. Mas essas quantias hão de necessariamente ser muito diminutas.
Portanto, parece-me isto mais uma mystificação do que outra cousa.
Importa uma duplicação de encargo para o paiz, porque este dinheiro que entra nos cofres publicos para substituir o soldado, deve ser applicado a procurar o substituto, e não a qualquer outro fim, pedindo-se um outro homem. Dar a este dinheiro outra applicação é duplicar este encargo, o que importa uma flagrante injustiça.
Sr. presidente, eu não entrarei nas particularidades d'este projecto, nem se elle será preferivel ao que originariamente foi apresentado pelo sr. Florencio de Sousa Pinto, porque do assumpto nada entendo, mas o que reconheço é que é necessario, para se votar, ter confiança no governo que o executa, sabendo que elle não ha de despender illegalmonte estas sommas, como fez da outra vez este gabinete.
Sr. presidente, eu concluo as observações que tenho a fazer, lamentando que v. exa. tivesse vindo ha pouco em auxilio do sr. presidente do conselho, quando elle requereu para que se lançasse na acta o seu discurso na integra, e a assembléa rejeitou, persuadindo-se que era minha a proposta, e não de s. exa.
O fazer-se a declaração por que eu insistia não era indifferente, era uma declaração essencial; mas eu não quiz ir contra o conselho que v. exa. me dava da presidencia, e por isso não insisti.
O sr. Conde de Cavalleiros: - Sr. presidente, antes de fazer algumas reflexões sobre o projecto em discussão, permitta-me a camara que eu declare, que votei contra a proposta do sr. Vaz Preto, e votei contra, porque entendo que as declarações na acta são um acto espontaneo de quem faz o discurso. A camara póde determinar que se lancem na acta essas declarações, mas n'esse caso só se procede em circumstancias extraordinarias, pois que o facto importa um acto politico que obriga a queda de gabinetes, e não me parece que valesse a pena elevar a questão a essa altura. Por isso votei para que se não lançasse na acta a declaração de s. exa., sobretudo tendo-se prestado a que fosse feita a publicação do discurso por inteiro no Diario. - Esta necessidade de se fazerem, declarações, do que aqui se passa, no Diario do governo, o que prova é o estado de atrazo da publicação das nossas sessões, e os defeitos que reconhecemos e temos notado. Estamos reduzidos unicamente ao testemunho dos espectadores das galerias e a nada mais, porque as sessões do Diario d'esta camara só se. publicam no fim de vinte dias, quando deviam ser distribuidas dois dias depois das respectivas sessões. E assim infelizmente vamos indo, faltando a publicidade tão necessaria nos governos liberaes.
Sr. presidente, eu quizera concorrer para que o governo desse melhor organisação ao exercito, a fim d'este estar preparado para todas as guerras imaginaveis; mas n'este momento não posso dar o meu voto silencioso; porque, o que é facto é que cruelmente foi distrahido o producto das remissões para compra de armas! Cruelmente, digo, porque para as familias que deram o dinheiro é realmente uma crueldade, desde que o governo empregava esse mesmo dinheiro na compra de armas e não no engajamento de soldados, como o devia fazer. O que é certo, porém, é que todos os dias os pobres contribuintes vão continuando a dar o seu dinheiro, emquanto que o governo vae com elle comprando armas!
O digno par, o sr. Vaz Preto, fez ha pouco um requerimento, com referencia á verba estavel das remissões. Não propriamente das remissões, porque estas já não existem, mas existem as quantias das fianças creadas por portaria de 19 de janeiro de 1876. Em virtude d'esta portaria todo aquelle que for ao governo civil dar uma fiança em dinheiro é dispensado de entrar logo no serviço do exercito.
Mas, se o individuo que deve prestar esta fiança, não comparece depois, é condemnado refractario. Eu, sr. presidente, entendo que se não pôde, ou pelo menos que se não deve, considerar refractario o homem que já havia entrado com aquella quantia, que se lhe exigiu, nos cofres do estado, pois de contrario elle soffreria duas penas.
No entanto o que digo é que deve existir em cofre uma porção de dinheiro, não só d'essa proveniencia, como da dos refractarios, que eu calculo que não será inferior a réis 400:000$000, mas que, segundo um documento que se apresentou, se reduz a 42:000$000 réis!
Quer a camara saber mais? Eu leio.
"Em doze annos, até 1852, houve 15:861 remissões e só 4:570 engajamentos! Veiu a faltar 11:291 praças que se pediram depois a mais aos povos, que já as tinham pago. Annualmente remiam-se 1:321 praças e engajavam-se 381, vindo assim a faltar annualmente 940 praças que o povo pagava duplicadamente!"
Isto quando o governo era obrigado a dar conta ás côrtes todos os annos de que tinha dado esse dinheiro o desetino devido. Mas a unica cousa que d'aqui se deprehendo claramente é que o governo deixou de engajar soldados durante doze annos, e gastou-se o capital que os representava, fazendo-se novas exigencias ao povo, que tudo paga. Quer dizer que as remissões annuaes eram 1:321, e os engajamentos 381.
Portanto, faltavam todos os annos 940 recrutas, as quaes se iam pedir ao povo, que já tinha pago o seu tributo!
Todo o dinheiro das remissões, que andava em 24 de fevereiro de 1867 em 2.485:000$000, gastou-se. Foram applicados pelo governo para compra de armas 1:644:000$000 réis!
Oh! Sr. presidente, pois gastam-se 1.644:000$000 réis, o exercito está desarmado!
Quem foram os officiaes, quem os homens de confiança que foram comprar as armas?
Os homens competentes dizem que o exercito está tão mal armado que, a distancia de mil metros, comparando a força explosiva, o nosso exercito ha de ser aniquilado por outro de igual força! E para isto gastam-se 1.644:000$000 réis!
Como posso eu dar um voto de confiança ao governo para que hoje se faça o mesmo?! É impossivel. Ver a infanteria ainda com armas de grande peso e comprimento, com enormes bayonetas, pesando sobre os hombros dos soldados, arruinando-lhes a saude, quando se gastaram réis 1.644:000$000!
Parece incrivel!
Sr. presidente, eu não estou em estado de discutir cousa alguma, apenas poderei, quando der o meu voto, explicar as rasões d'elle, é por isso que não prolongo o debate, e não porque esteja proximo a encerrar-se a sessão, não porque tenha receio que os negocios tenham de voltar á outra camara, isto para mim é me indifferente, procedo como entendo, e voto conforme a minha consciencia me dicta, e não me importo com o resultado.
É o governo que na sua alta sabedoria devia tratar dos negocios mais importantes ha mais tempo, e não os reservar para o fim da sessão, obrigando a haver sessões extraordinarias e a horas extraordinarias.
Antigamente viam-se acabar as sessões com a mesa cercada de pretendentes, ou de pessoas que vinham, proteger os projectos dos seus afilhados; este anno, porém, quem cerca a mesa é o governo! É o governo com estes immensos projectos, com estas continuadas despezas! Mas isto é defeito da sua organisação.
Um governo, que resuscita como este resuscitou, faz reviver as pretensões dos seus amigos nas emprezas e exigencias.
Apparecem os empenhos, apparecem os favores, apparece tudo, porque o governo resuscitou em corpo e alma! E