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Sessão de 5 de Março de 1923
Por conseguinte, temos aqui o Sr. alferes Rosa, filho do Sr. general, encarregado dum serviço de espionagem contra os seus camaradas. É êle, publicamente, que o confessa! Ora êste serviço é contrário à dignidade da profissão das armas. A espionagem contra o inimigo está autorizada em todo o mundo, porque tem um carácter moral inteiramente diverso, mas a espionagem contra os próprios amigos, contra aqueles que militam até na mesma causa, no mesmo campo político, como aqui se dava, é manifestamente contrária à dignidade da profissão das armas.
Mas há ainda outro ponto a atender. E que o Sr. alferes Rosa dizia na carta que o seu serviço era de natureza confidencia], e que, assim, não podia dizer ao Sr. tenente Correia quem haviam sido as pessoas que o tinham informado; mas, se êsse serviço ora de natureza confidencial, como é que foi coutá-lo a outras pessoas?
Se o podia contar a outras pessoas, quebrando o sigilo imposto pelo n.º 45.º do artigo 4.º do Regulamento, e assim incorrendo numa infracção disciplinar, também o podia contar ao tenente Correia.
Diz o n.º 45.º do citado artigo:
«Não revelar quaisquer ordens de serviço de carácter confidencial que haja de cumprir ou de que tenha simples conhecimento, nem o santo, senha ou contra-senha, e observar o mais rigoroso sigilo sôbre todos os assuntos de natureza secreta».
Ora o alferes Rosa quebrou êsse sigilo indo contar a terceiros, que por sua vez o contaram ao tenente Correia, aquilo a que dizia ter chegado nas averiguações a que procedera por ordem de seu pai.
Como pretendia depois entrincheirar-se atrás do segredo profissional?
O tenente Sr. Correia, em vista disto, requereu ao Ministério da Guerra que procedesse a um inquérito, castigando-o se, porventura, se provasse que êle tinha conspirado contra o Govêrno, ou, concluindo-se que estava inocento, que se procedesse energicamente contra o alferes Sr. Rosa por infracção de várias disposições do regulamento disciplinar. Êste requerimento nem sequer resposta teve.
O referido tenente continuou a andar transferido de regimento para regimento, até que lhe foi concedida licença para, aos domingos, ir visitar a família ao Pôrto. Foi àquela cidade, mas à quarta ou quinta vez é chamado ao quartel general, e ali dizem-lhe que não pode continuar a ir ao Pôrto, porque o acusam de ser chefe dum movimento revolucionário.
Tornou o tenente Sr. Correia a pedir um inquérito aos seus actos, mas, como anteriormente, até hoje não obteve nenhuma resposta.
Morre-lhe a sogra em Vila Nova de Gaia e êle não pode ir ver o seu cadáver.
Teve uma filha extremamente doente, e êle não a podia ir ver senão furtivamente, como um ladrão. Como um ladrão, êle, que tem o peito coberto de medalhas! E devidas, não ao favoritismo com que tantas são adquiridas, mas a autênticos actos de valor no campo da batalha.
E assim se mata, Sr. Presidente, todo o estímulo ao cumprimento do dever no coração dos homens capazes de bem servir a sua Pátria.
E assim se vai arraigando, Sr. Presidente, a velha convicção, que já penetrou fundo em todos os espíritos, de que neste país só são acarinhados e premiados todos os ladrões e todos os bandalhos, e perseguidos ou esquecidos todos os homens honestos e prestimosos.
Sabe-se o culto, Sr. Presidente, que têm os velhos militares pela sua folha limpa, que é para elos um título de honra, que veneram como quem venera uma relíquia dentro dum sacrário. Manchar a sua folha de matrícula, quando ela se conserva muitos anos sem mácula, é levar o mais profundo desgosto à sua alma. Imagine-se, pois, o estado moral em que ficaria o tenente Correia ao receber, ao fim, de vinte e um anos de serviço com comportamento exemplar, cinco dias de prisão disciplinar por uma futilidade, sem atenção alguma pelos serviços que prestara.
Como êle havia de preguntar a si próprio para que servia ser honesto e brioso nesta Pátria. Para que servia sacrificar-se alguém por ela sendo escravo do dever, como êle o fora, e arriscando a vida, como êle a arriscara, e no momento em que os acomodatícios e traidores eram tantos no campo da batalha.
Êste é um caso.