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24 Diário da Câmara dos Deputados

O Sr. Moura Pinto: — Sr. Presidente: nesta questão do inquilinato que, infelizmente, se deixou agravar, entendo que todos os homens que dalguma maneira têm de exprimir a sua opinião o devem fazer.

Eu encontro-me em circunstâncias especiais, visto que, ocupando em dado momento da nossa política uma determinada posição, procurei arrumar esta questão. Não tive porém tempo de conseguir isso.

Sr. Presidente: em matéria de inquilinato o Estado não tem senão a função de medianeiro.

Nesta questão devemos pôr-nos superiores às paixões que ela possa produzir.

Não devemos ser do partido dos senhorios, nem do partido dos inquilinos.

Sr. Presidente: penso que as circunstâncias da guerra criaram necessidades que forçaram a limitação do direito antigo; mas não penso que essa limitação nos dê, por ora, o direito de criarmos um direito novo.

Só há que criar um direito novo quando com clareza possamos ver se se tratava de uma evolução do direito e não simplesmente de um caso excepcional derivado de circunstâncias também excepcionais.

O direito antigo tem de ter limitações, mas essas limitações têm de ser apenas as justas e necessárias, e procederia de má fé, não seria digno do nome de político, quem quer que fôsse, que ao tratar de restrições, quer dos senhorios, quer dos inquilinos, se pusesse ao lado duma ganância, capaz de todas as malevolências, ou pôr-se ao lado dum patriotismo, duma felonia levada a todos os extremos, assentando a sua moral e carácter em cima destas duas bases, que são fundamentalmente as bases da questão, aquando se azeda, quando é injusta, e que não podem sair dêstes preciosos termos emquanto encontrarem atmosfera, nos meios políticos, propícia para o seu desenvolvimento.

Sr. Presidente: o Estado, dizia eu, tem de ser mediador expectante, espreitando serenamente os acontecimentos, vendo sem que a vista se lhe turve com as perturbações que os variados egoísmos misturam, e escolhendo depois com cuidado e com cautela o que ficar, porque o que ficar é, porventura, um direito a fixar e não seriamos então legisladores se não soubéssemos como é que o Direito faz a sua evolução e quando é que o Direito tem realmente razão de existir ou de se criar.

Por isso uma assemblea legislativa, que nobremente queira tratar desta questão, tem que remover previamente toda a montureira de lixo que uns aos outros atiram às vítimas das circunstâncias criadas pela guerra — e chamo vítimas a senhorios e inquilinos — têm de remover, repito, tudo quanto é, como se diz em Direito, matéria impertinente.

Eu tenho assistido, e, devo dizer, com tristeza, ao espectáculo de ouvir homens cultos, políticos até, e políticos que alguma cousa devem, pelo menos, ao seu país, pelo que dizem ou pelo que afirmam que valem; tenho-os ouvido considerar em conversas, quer elas sejam das ruas, dos comboios ou ante-câmara do Parlamento, a questão pouco mais ou menos neste pé: Então você não sabe a tremenda pouca vergonha que fez noutro dia um senhorio na rua tal?

Fez esta cousa atroz...

E faz-se então uma história, possivelmente verdadeira, e pela qual o senhorio mostra possuir em primeiro lugar ganância, em segundo imaginação e em terceiro crueldade. E vem depois a generalização do comentário:

«São assim todos os senhorios».

Eu não posso queixar-me demasiado daqueles que assim procedem, porque o português, mesmo quando é culto, não procura levar a sua cultura a limites demarcados. Tem uma grande facilidade de generalização e para evitar muitas vezes o trabalho mental; tem sempre o seu caso arrumado e a sua crítica pronta.

Mas se assim é em relação aos senhorios, o mesmo acontece com respeito aos inquilinos de cujo procedimento há sempre quem conta uma história horripilante em que a maldade, a imaginação e o espírito de defesa daquilo que êle julga ser o seu interêsse corre parelhas com os do senhorio.

De forma que antes de tratar duma questão destas vale a pena apontarmos estas circunstâncias para patentear a ne-