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378 ACTAS DA CÂMARA CORPORATIVA N.° 38

cialmente, apenas se alargando, quanto àquelas, de harmonia com a evolução das forças armadas, mas pragmaticamente, atendendo às circunstâncias da sua estrutura e funções, sem os pruridos ideológicos que haviam de dominar no século XIX.
Para se evitarem abusos e intromissões renovava-se o preceito de que os militares não podiam ser julgados pêlos civis pelos crimes que cometessem, do mesmo passo que se reafirmava que eles não têm privilégio nas causas cíveis i, como já o não tinham nas questões com a Fazenda, quer nos casos de resistência aos cobradores, quer nos de furto e descaminho em detrimento da mesma Fazenda, cuja competência era dos "juizes fiscais ou de comissão" 2.
É, tal como antes se fizera para as Ordenanças, definiu-se em 1808 a situação forense das milícias, estabelecendo-se que os oficiais gozam das mesmas isenções e honras que competem aos de linha, pelo que gozam do foro militar para todos os delitos, nas graduações superiores a cabo-de-esquadra, e desta para baixo não gozam do foro militar nos crimes comuns senão estando reunidos e em efectivo serviço militar 3.
Era, portanto, este o regime de privilégio do foro, que foi mantido e mandado observar pelo Regulamento para a Organização do Exército, de 21 de Fevereiro de 1816, e vigorou ainda por largo tempo, praticamente até à publicação do nosso primeiro Código de Justiça Militar, apesar da coexistência de certo estado de espírito, de formação jacobina, que ainda em 1835 proclamava "parecer mais sensato que os povos escolham os seus juizes, que ninguém lhos imponha, perpétuos ou temporários", embora logo aconselhando "não escolham os leigos, escolham os sábios e letrados" 4, o que não obstou a que os chamados ajuízes eleitos" fossem abolidos em 1840 sob a acusação de que se inclinavam para seus amigos e eleitores.

17. O brilhante período de reforma e codificação das leis - anunciado pêlos notáveis trabalhos de Melo Freire e de Ferreira Borges e cujas primeiras grandes manifestações foram o Código Comercial de 1833, a Novíssima Reforma Judiciária de 1841 e o Código Administrativo de 1842, para refulgir com o Código Penal de 1852, o Código Civil, do 1H67, o Código de Processo Civil de 1876 e o Código Comercial de 1888 - foi secundado pela publicação do Código de Justiça Militar, de 9 de Abril de 1875.
Neste diploma se fixou ao foro militar competência para conhecer dos crimes ou delitos de toda a natureza perpetrados por militares ou outras pessoas pertencentes ao Exército, salvo os de contrabando ou descaminho, de violação das leis sobre caça e pesca, matas nacionais e viação pública, bem como os delitos comuns praticados pêlos desertores durante a deserção.
Os tribunais militares, em cuja composição entrava sempre um juiz saído do quadro da magistratura judicial, exerciam jurisdição sobro todos os indivíduos por qualquer modo inscritos nos serviços militares, sem exceptuar os guardas municipais e os empregados civis do Exército com graduação militar, ainda que estivessem em hospitais, em prisões ou no asilo de Runa, ou fossem, prisioneiros de guerra ou emigrados políticos, militares, civis e internados em depósitos sujeitos ao regime militar.
Não conheciam de todos os crimes, mas sim apenas dos constantes do código, quando se tratasse de militares fora da efectividade do serviço, a receberem soldo, ou à disposição do Ministério da Guerra, ou na inactividade temporária sem vencimento, a seu pedido, ou de licenciados, ou de empregados em comissões não dependentes do Ministério da Guerra, ou ainda de quaisquer militares licenciados na reserva, quando não estivessem em serviço ou nas revistas ou na instrução.
A comissão parlamentar, que sobre ele deu curto parecer, disse a respeito da competência: "É este um dos assuntos mais importantes de toda a jurisprudência excepcional, porque quanto melhor fixar a esfera dos tribunais de privilégio, tanto menos motivos haverá para conflitos e tanto menos dificuldades para que se realize livre e francamente a acção da justiça contra os indiciados por delitos de excepção".
E foi tudo; vê-se que havia a obsessão dos inúmeros empecilhos que a chicana usava levantar a pretexto dos velhos privilégios.
A oposição não tomou parte no debate parlamentar. Este limitou-se a um torneio oratório sobre a pena de morte, em que tomaram parte Júlio de Vilhena, Barros e Cunha e Fontes Pereira de Melo 1.

18. Depois da reforma penal de 1884 sentiu-se a necessidade de lhe adaptar a justiça militar. Em 1886 foi nomeada uma comissão, composta de oficiais e magistrados, que em Dezembro de 1889 apresentou um projecto, acompanhado de relatório 2.
Só, porém, em 1895 o Ministro da Guerra Pimentel Pinto, em Governo presidido por Hintze Ribeiro, fez decretar novo Código de Justiça Militar, precedido de extenso e cuidado relatório justificativo, em que se diz que 30 Governo não pode encarecer o trabalho da comissão de 1889, por estar assinado por um dos seus membros".
Nesse relatório, em matéria de competência, procura-se justificar a extensão da jurisdição militar a indivíduos civis, invocando-se os precedentes da Lei de 25 de Agosto de 1840, dos Decretos de 17 de Abril de 1844 e 2 de Fevereiro do 1891 e dos títulos III e IV do livro m do código de 1875 e disposições das leis suíça, italiana, belga e francesa, e acrescenta-se: "A verdade é que o acto de sujeitar ao foro militar indivíduos da classe civil, em tempos normais e por crimes atentatórios da disciplina militar e da ordem pública, é necessário e portanto legítimo, e é em razão disso mesmo que em Portugal, como em toda a Europa, constitui por assim dizer direito comum".
Não é o velho princípio de que a necessidade não tem lei, mas a afirmação explícita de que é a necessidade que faz estas leis. E de competência nada mais diz que valha nota, porque este novo código reproduz o estabelecido pelo de 1875, apenas com o acrescentamento dos trabalhadores empregados nas fábricas, arsenais, depósitos e secretarias militares, quando cometam crimes previstos no mesmo código.
No caso de acumulação de crimes civis e militares também reproduz - artigo 295.° - a doutrina do artigo 201.° do código de 1875, que prescrevia:

Quando algum indivíduo sujeito à jurisdição dos tribunais militares for acusado ao mesmo tempo por outro crime da competência dos tribunais ordinários, será por ambos os crimes julgado pela justiça militar.

Esta doutrina é a do artigo 367.° do actual código.
O código de 1895 foi em 1896 sancionado pelo Parlamento, sem alteração nem discussão que aconselhe referência acerca do assunto a apreciar, e publicado com a Lei de 13 de Maio de 1896.

1 Carta Régia de 23 do Fevereiro de 1771 e alvará de 20 de Julho de 1797.
2 Alvarás de 14 do Fevereiro de 1772 e de 18 de Setembro de 1774.
3 Alvará de 20 de Dezembro de 1808, título 5, capítulos 1-3.
4 Diário do Governo de 8 do Julho de 1835.

1 Diário das Sessões, 1875, pp. 852-863.
2 Cit. Revista Militar, 1953, p. 562.