26 DE NOVEMBRO DE 1958 481
Vaticano; de Paris a Veneza, já cardeal, para em cinco anos realizar maravilhosa obra apostólica, num ambiente de acatamento e simpatia gerais, e, finalmente, de Veneza à cátedra pontifical, com a missão de ensinar, governar e santificar a humanidade, em ordem ao seu destino eterno. Foi o último empurrão da Providência.
À curiosidade de tantos sobre a orientação que iria seguir, em posição tão alta, se política se religiosa, cuidou logo João XXIII de responder em poucas palavras e dois gestos. Aos milhares de pessoas que assistiram às cerimónias da sua coroação apareceu, ora de mãos postas a rezar, ora de mão erguida a distribuir bênçãos; e ao falar-lhes revelou como ideal do seu pontificado o mesmo que Jesus Cristo adoptou para si: «eu sou o Bom Pastor». Sem esquecer a elevação pessoal em virtude e em saber, a observação atenta dos acontecimentos e o estudo sério dos problemas de que depende a paz e a humana felicidade neste mundo, as boas relações com os estados e o contacto com as elites ou com as multidões, sua principal e contínua preocupação será a solicitude do bem espiritual das almas, o zelo pastoral, apronto a todas as empresas sagradas, lineares, constantes», para comunicar aos homens a verdade a crer, a lei a observar, o culto a praticar, a palavra, a luz e a vida, no ambiente de Deus. Numa palavra: o Papa dará a primazia ao espiritual, à presença do sobrenatural no humano.
E ninguém verá nesta orientação menos clarividência. A humanidade vive uma era de progresso nos domínios da ciência, da técnica, das condições de existência, e todavia não encontra nele a felicidade a que legitimamente aspira. A paz é precária entre povos, raças e classes, as relações internacionais atormentadas de ameaças, ambições e deslealdades, e na própria vida interna de cada povo não faltam elementos de corrupção e desordem. Significa isto que não basta ao género humano atingir os aspectos técnicos e materiais da civilização, por mais adiantados que se apresentem; são-lhe por igual necessários os valores de carácter espiritual e moral. Assim o exige a natureza humana, e tentativas feitas, no passado e no presente, por correntes laicistas ou materialistas, para os dispensar só agravaram males que porventura pensavam suprimir e condenaram o homem à escravidão da matéria, em vez de lhe trazerem a liberdade, a verdade e o amor. Esta verificação histórica, mesmo independentemente do direito divino, coloca-nos perante a necessidade de uma autoridade espiritual que, acima de todos os interesses terrenos e contingentes e em mundial escala, guarde e distribua aos homens os tesouros de verdade e de graça que á Redenção de Cristo lhes mereceu.
João XXIII desempenha agora esta missão. Dispõe de um mandato divino, exerce um domínio directo, livre e independente de poderes e interesses mundanos. Guiará os homens de boa vontade na unidade e integridade da fé e na observância dos mandamentos, mas respeitará os condicionalismos de ordem política, civil e histórica em que vivem. Crescerá assim, ainda mais, o prestígio do pontificado romano, que o recente tributo universal de respeito e admiração mostrou ser já tão alto.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Sr. António Pereira Caldas de Almeida: - Sr. Presidente: começo por apresentar as minhas mais sinceras homenagens aos antigos e actuais Procuradores à Câmara Corporativa, que, pelo seu trabalho, pela sua sensatez e pela sua inteligência, conseguiram alto prestígio e respeito de que esta Casa indiscutivelmente desfruta no País.
Foram presidentes desta Câmara os Srs. General Eduardo Augusto Marques, Prof. Doutor Domingos Fezas Vital, Prof. Doutor José Gabriel Pinto Coelho, Prof. Doutor Marcelo Caetano, Prof. Doutor João Pinto da Costa Leite (Lumbrales), e é justo que a eles e a V. Ex.ª, Sr. Presidente, considere principalmente dignos da gratidão de todos nós.
A S. Ex.ª o Sr. Presidente da República apresento desta tribuna os meus mais respeitosos cumprimentos e desejo-lhe um mandato de progresso e de paz.
Ao Governo, e em especial ao Sr. Presidente do Conselho, quero exprimir a plena confiança na sua acção e manifestar a esperança de ver em breve completado, renovado e prosseguido o regime instituído em 28 de Maio de 1926.
Pela primeira vez temos nesta Câmara elementos eleitos pelos conselhos das respectivas corporações, e julgo de realçar este facto e de nos congratularmos com ele.
Esperamos que muito em breve, estruturadas as restantes corporações, os seus Procuradores tenham mandato passado pelos seus pares e não seja mais necessário ao Governo nomear para a Câmara representantes dos sectores organizados comparativamente. Esses Procuradores eleitos saberão defender a actividade que representam, sem esquecer o interesse geral da colectividade a que todos pertencemos, e temos a certeza de que o prestígio desta €asa não será diminuído, antes será, se possível, ainda intensificado.
Sr. Presidente: não posso deixar de me referir a alegria e à fé que a instituição das corporações trouxe a todos nós, que vemos assim convenientemente estruturada a nossa organização.
A ideia corporativa é velha de muitos séculos e perfilharam-na e defenderam-na Platão, Aristóteles e S. Tomás de Aquino.
Portugal, por tradição, de há muito é corporativo, e, na verdade, os mais brilhantes períodos da nossa história foram assinalados por um Governo forte e corporações instituídas e fortes também.
Somos dos que julgam que o corporativismo é o sistema que melhor pode servir os Portugueses et dos que aceitam que a sua completa instituição tinha de ser feita com prudência, mas acham que a prudência foi excessiva e perdeu-se muito tempo, que, em vez de ter sido aproveitado na consolidação e fortalecimento do sistema, permitiu que cada um idealizasse um corporativismo sei e que não se saiba bem hoje qual é o corporativismo de todos nós.
Para mim, corporativismo pressupõe um Governo que governe, e por isso seja forte, mas consciente e conhecedor dos problemas que pretende resolver, não vistos por um único sector, mas por todos os interessados na sua resolução.
Por muito competente que seja o departamento oficial que estuda um assunto, por muito aptos que sejam os técnicos que o servem, por muito bem intencionados os que governam, se as actividades directamente interessadas não forem ouvidas e não estiverem organizadas por forma a poderem dar sobre ele uma opinião consciente, a solução encontrada pode não ser a melhor.
Vozes: - Muito bem, muito bem !
O Orador: - Os assuntos devem ser estudados por técnicos, mas têm de sê-lo igualmente por quem os vive, pois ninguém pode estar mais interessado no encontro de uma boa solução do que aqueles cuja prosperidade depende dessa mesma solução.
Vozes: - Muito bem, muito bem !