488 ACTAS DA CÂMARA CORPORATIVA N.º 31
ladas. Seja pela ausência de elementos de informação periódicos e seguros sobre os potenciais de produção e de consumo existentes, seja pela impreparação dos empresários, investiram-se capitais avultadíssimos em unidades produtoras que nada acrescentaram de proveitoso à nossa estrutura económica. E a última legislação sobre condicionamento industrial, autorizando a livre montagem de novas fábricas em muitos sectores de actividade, em nada aperfeiçoou - antes, pelo contrário, piorou em muitos aspectos - o sistema que havia sido estabelecido em 1937.
A legislação mais eficaz de defesa do trabalho nacional data de 1932: é o Decreto n.º 2-2 037. O Decreto n.º 38 504, a circular do Conselho Económico sobre a preferência pelos produtos nacionais nas encomendas dos serviços públicos e outras disposições postas em vigor com idênticas finalidades, embora inspirados nas melhores intenções, são quase totalmente inoperantes. A maioria dos organismos oficiais e particulares, que por elas deveriam ser influenciados, não as observam nem respeitam. E nenhuma penalidade foi prevista, para as infracções frequentíssimas que a ignorância ou as falsas conveniências determinam. Note-se, ainda, que a regulamentação da Lei n.º 2005, de 1945, «e tivesse sido cabalmente cumprida, poderia ter orientado em melhor sentido o desenvolvimento industrial do País. Não sucedeu assim - e só temos de lamentar agora as infelizes consequências desse facto.
Maior é a necessidade, por isso mesmo, de se estabelecer e fazer cumprir firmemente uma orientação geral que crie o indispensável clima de incentivo, restabeleça a confiança e torne seguramente viáveis os empreendimentos industriais de maior vulto ou utilidade reconhecida, mesmo que não explorem exclusivos de fabrico ou não tenham o Estado como participante no capital. Se desejamos seriamente que se instalem no País unidades produtoras com boa técnica na produção e suficiente capacidade de fabrico e que estas iniciativas progridam com benefício geral haverá que garantir, por forma justa e com conhecimento perfeito do seu funcionamento, as condições mínimas indispensáveis à continuidade da sua laboração.
Teremos de compreender, por exemplo, que para a execução de uma unidade num estaleiro naval decorrem, pelo menos, três anos entre o início do projecto e o seu completo acabamento; e só por um planeamento efectuado com antecipação e previsão é possível evitar soluções de continuidade no trabalho, determinantes de desemprego maciço e desagregação de quadros nos centros onde essas empresas se instalarem. Teremos que evitar interpretações erradas na apreciação económica dos valores a comparar - como a que se verificou recentemente num caso que vale a pena mencionar. Certa empresa nacional, de grande vulto e boa técnica de produção, concorreu a uma importante encomenda para o País, oferecendo preços mais baixos do que os contidos nas propostas dos países da O. E. C. E. Pois, assim mesmo, e não obstante ser notório que a sua carteira de encomendas se encontrava reduzida para alimentar o ritmo normal de laboração, a encomenda foi entregue a um país de além da «cortina de ferro», por diferença de valor que não deveria ultrapassar 6 ou 7 por cento, se fosse levada em conta a comparticipação de 50 por cento na diferença de preço que o sector oficial comprador estava disposto a pagar para fixar a encomenda no País. E seria legítimo considerar, também, a importante verba de contribuições sociais que a empresa concorrente portuguesa teria de desembolsar sobre o valor da remuneração da mão-de-obra empregada na execução do referido trabalho. Não podemos acreditar que a diferença de preço obtida com a compra efectuada no estrangeiro e as razões aleatórias do equilíbrio de balança comercial com aquele país da Europa Oriental constituíssem vantagens suficientes para compensar o significado económico e social do desemprego de 600 ou 700 operários que a empresa nacional batida no concurso teve de dispensar, bem como a dispersão parcial dos quadros especializados que, pelo mesmo motivo, se verificou. E a perda de quadros é capital vivo da produção, que só muito lenta e dificilmente se pode reconstituir.
Se houvesse necessidade de valores de contrapartida comercial a importar do país que beneficiou da atribuição da encomenda não faltariam, sem dúvida, os equipamentos, artigos de consumo ou outros produtos a encomendar, sem prejuízo tão grave para a economia nacional.
No capítulo da exportação há que estudar, por outro lado, as facilidades a conceder a alguns sectores produtivos dotados de técnica e possibilidades comerciais para a colocação dos seus artefactos nos mercados externos. Para alguns deles bastaria, por exemplo, que lhes fossem fornecidas as matérias-primas nacionais ... aos mesmos preços, e sem mais taxas nem encargos, pêlos, quais são fornecidas a indústrias estrangeiras concorrentes.
Não pode duvidar-se de que os vários sectores industriais portugueses que utilizamos açúcar como matéria-prima básica ocupariam posições interessantes na nossa exportação visto disporem, também, do cacau e das frutas de produção nacional desde que pudessem comprar o açúcar à cotação internacional vigente, que é inferior em cerca de dois terços ao preço por que são obrigados a adquiri-lo. Com tal garantia, de interesse económico incontestável, não haveria quebra de receitas para o Estado, ainda que continuasse ,a vigorar o sistema actualmente adoptado para o mercado interno.
Mas há mais alguns aspectos que não posso deixar de apontar nesta oportunidade. Para contornar a política de liberalização, que impõe formais compromissos, as compras do Estado, e de organismos dele dependentes são efectuadas, em vários países, com prioridade para a produção interna. Para esse efeito, os concursos são abertos pelo sistema de consultas particulares às entidades fornecedoras ou produtoras, furtando-se assim às obrigações internacionais que os concursos correntes implicariam.
Não se pratica entre nós este género de concursos preferenciais, que permitem superar os condicionalismos dos compromissos da liberalização e fixar nos próprios países interessados a execução de encomendas de manifesta importância económica.
Outro aspecto a considerar é o da isenção de direitos na importação de materiais destinados a realizações de especial importância. Em vários países recorre-se a tais isenções para facilitar empreendimentos de reconhecido interesse público. Mas os privilégios assim estabelecidos não excluem a participação das actividades nacionais na medida em que elas podem preencher alguns capítulos dos fornecimentos desejados e cessam imediatamente com a execução das encomendas definidas na concessão das isenções.
Entre nós, pelo contrário, têm-se visto isenções de direitos para empreendimentos de grande vulto que não levam em conta as possibilidades de potencial produtor já existentes no País ou a conveniência de o criar para futuras realizações; e, por outro lado, as isenções subsistem para além das exigências imediatas, mantêm-se indefinidamente e comprometem por forma definitiva a viabilidade das indústrias que deveriam cobrir essas necessidades.
Com esta orientação compromete-se irremediavelmente a expansão produtora nacional em certos sectores