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30 DE MARÇO DE 1960 987

atitudes assumidas nas longas e densas discussões havidas na Câmara, entendo dever juntar uma palavra:
Assino, vencido quanto a um ponto que considero essencial, o da imposição de um limite superior par» a área :i .reservar pelos proprietários nas zonas sujeitas á obras de hidráulica agrícola, limite esse que o Governo propunha fosse de 100 ha na base II, § 2.º, alínea d), do projecto. Pois a anulação desta cláusula aparece-me como um total cerceamento prático à política de fixação de colonos; mau dou as razões desta minha convicção.
Existe no País um gravíssimo problema social e económico, que é o das deficiências de estrutura agrária; e olhando particularmente à grande região a lente j a u», esses vícios de estrutura traduzem-se por baixos salários, instabilidade de emprego e elevadíssimo grau de proletarização para os trabalhadores rurais, a par de grande concentração da propriedade, muitas vezes aliada a absentismo ou a formas recentes de capitalismo agrário. Ora se é certo que este problema anda desde Lá decénios a preocupar o pensamento e acção dos Portugueses, só nos nossos dias se tornou evidente -e assim q ensinam os técnicos de agronomia, aliás, fundando-se nas experiências de tantos outro» países- que é problema susceptível de solução, aparecendo como ultrapassadas ns concepções fatalistas da terra pobre e sem água a impôr uma cultura extensiva, portanto com o aludido cortejo de inevitáveis malefícios sociais. Mas ao mesmo tempo que se aponta solução, também se considera indispensável a correspondente aplicação, sob pena de ficar entravado todo o processo de crescimento económico em que o País anda vivamente empenhado. Estes, pois, os pontos básicos do argumento: gravidade e premência da questão social-ecónómica do «agros» latifundiário do Alentejo, possibilidade técnica de a resolver.
Os objectivos a atingir na solução desdobram-se em dois planos: um eminentemente social, o acesso à propriedade pára muitas famílias de assalariados rurais, designadamente de outras regiões do País sujeitas a tremenda pressão, demográfica sobre uma terra pobre e escassa, e outro, mais declaradamente económico, consistindo em criar condições de meio para que possam subsistir propriedades e explorações mais pequenas do que as actuais em razoável nível técnico e com boa produtividade. Sempre será defeituosa a política que atenda apenas ao progresso económico das explorações sem realizar fixação de gente à terra, como aquela outra acção colonizadora que não cuide de dar bases económicas às novos explorações. A hidráulica agrícola surge, assim, inseparável da colonização, tudo se traduzindo, no plano estrutural, por parcelamento da grande propriedade e reconversão cultural assentando na rega.
É altura de olhar às experiências alheias - e não se depara com orientação diferente da que ficou exposta nos países com problemas e condições semelhantes aos nossos. E é também oportuno relembrar a experiência portuguesa: por um lado, magníficas obras de hidráulica, que não foram, todavia, acompanhadas de um esforço paru reajustamento cultural e conduziram, por isso, à consolidação da grande propriedade sobre sistemas monoculturais de arroz e milho, com perigo para o equilíbrio económico de outras regiões, e, por outro lado, louváveis tentativas de colonização, mas erigidas sobre terra escassa e desprovida de um mínimo de aptidões agrícolas. Era esta desconexão que conviria evitar na nova arrancada.
Mas como preencher o duplo objectivo proposto ?
Uma primeira hipótese consistirá em realizar o Estado os aproveitamentos hidroagrícolas apenas em suas obras de engenharia civil, esperando que a água divida as terras segundo «uma lei natural». Ora nem há u certeza de se cumprir essa esperança, até porque sê não trata de nenhuma lei natural, bem podendo unia política de sustentação de preços agrícolas, por exemplo, fazer perdurar u estrutura latifundiária; como não se vê a razão de entregar aos vagares do acaso uma tarefa que se- reputa urgente e necessária quando se conhecem meios concretos para a levar a bom termo. Acresce que o tal jogo da «lei natural» significa a venda ou o arrendamento das terras irrigadas, portanto por bons preços e por vastos lucros para os proprietários dos antigos sequeiros, sem estes haverem contribuído para essa valorização, antes se limitando a aceitar beneficiações realizadas com os dinheiros públicos; há exemplos do caso mesmo entre nós, e vale a pena reparar que a esta nota de injustiça social se acrescenta outra, de ineficiência económica, quando pretenda fundar-se a colonização espontânea nessa terra muito cara para o colono. Em resumo: nem se colhem os benefícios sociais, nem se levam a seu termo as possibilidades económicas criadas com a rega.
A segunda hipótese, que tem sido proposta, corrige um defeito dos que se apontaram: entrega o Estado aos lavradoras, juntamente com as albufeiras e os canais de rega, um plano integral de aproveitamento económico - com culturas e produções taxativamente indicadas, ao mesmo tempo que os mercados assegurados, as fábricas montadas pana consumir os produtos industrializáveis, os preços garantidos, etc. Parece haver aqui certa dose de «socialismo», e não se vê como ficariam preenchidos os objectivos sociais propostos, a menos que do almejado plano constasse o confisco e redistribuição das terras!
Uma terceira solução poderá ser a do parecer da Câmara: efectuar as obras, de engenharia e deixar aos grandes proprietários a faculdade de reservarem para si toda a área que lhes pertence, sem qualquer limite; mas impor determinadas exigências na rentabilidade, abrindo-se o caminho da expropriação quando os indicadores fixados pelo Estado ao bom aproveitamento da terra não fossem atingidos. Foi opinião da Câmara que esta fórmula não diferia, essencialmente, em seus efeitos da outra que a seguir exponho, e que me aparece como a, única autêntica resposta ao problema; mas que se apresentaria. superior a ela na medida em que não levantava resistências, por os proprietários não sentirem directamente posto em causa o seu direito de propriedade, mediante uma expropriação. Ora, com todo o respeito pela opinião da Gamara, e realçando que foi manifestada a maior confiança na eficiência deste método, quer dizer, em que a grande propriedade; uma vez regada, forçosa-