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1058 ACTAS DA CÂMARA CORPORATIVA N.º 90

e comum de que ainda seja possível dispor do nosso país, e beneficiação de outras já consideradas aptas para a cultura agrícola, acompanhada do melhoramento de pastagens em terrenos comuns (empreendimento este cie grande interesse económico num país tão. carecido de desenvolver a exploração pecuária);
c) Compra, pelo Estado, de terrenos oferecidos u venda para os adicionar às explorações deficitárias.

Analisemos cada um dos referidos meios.

a) Expropriação de terras

70. A possibilidade da expropriação por utilidade particular não repugna à nossa tradição legislativa, pois tem sido consagrada em diversos casos em que se descortina um marcado interesse público subjacente.
A nossa lei vigente prevê algumas hipóteses em que é exactamente o fim de valorização da terra que se tem um vista, quer ao permitir-se a criação de condições de boa exploração agrícola, quer ao facultar-se a extinção de- encargos ou vínculos que oneram a terra. É o que acontece, por exemplo, com o artigo 2309.º do Código Civil, onde se prevê a possibilidade da expropriação por utilidade particular de terrenos encravados e a constituição forçada de servidões de passagem, com o artigo 114.º, § único, do Decreto n.º 5787 - IIII, de 10 de Maio de 1919, em que se faculta a constituição de servidões de aqueduto para condução de águas) com o artigo 2308.º do Código Civil, que prevê a alienação forçada de árvores existentes em terreno alheio, e com outras disposições que admitem a constituição de servidões (de presa e escoamento), a extinção de servidões, de encargos censíticos e enfitênticos, da compropriedade de coisa indivisível, do compáscuo, etc., e que se traduzem, substancialmente, numa verdadeira expropriação de direitos.
E note-se que algumas das disposições legais citadas foram promulgadas numa época em que não era ainda abertamente exaltada entre nós a função social que à propriedade incumbe desempenhar.
71. De resto, a tradição da expropriação por utilidade particular, embora subordinada sempre à existência de um interesse público subjacente, vem de mais longe. Já a Lei de 9 de Julho de 1773, completada pelo alvará de 14 de Outubro do mesmo ano, a par de outras providências destinadas a obstar à excessiva fragmentação da propriedade, previa n possibilidade da expropriação por utilidade particular de terrenos encravados em quintas muradas ou vaiadas ou u elas contíguos, contanto que as quintas valessem, pelo menos, seis vezes mais do que os terrenos a expropriar (l).
Em relação a essa legislação pombalina, o artigo 2309.º do Código Civil, já referido, marca um nítido retrocesso.

72. Demonstrado que a expropriação por utilidade particular não repugna à nossa tradição legislativa, resta acrescentar que o meio de expropriação a que se vem fazendo referência, como instrumento ao serviço da recomposição agrária e, designadamente, da constituição de explorações agrícolas economicamente viáveis, de tipo familiar, não visa em primeira linha a satisfação de um mero interesse particular projectado no pano de fundo do interesse público. A expropriação surge untes como expediente aconselhado por uma imperiosa e inadiável necessidade económica e social que incorpora um interesse público fundamental - sem prejuízo, como é manifesto, do próprio benefício em que a recomposição agrária se traduzirá no seio da região directamente visada.
Em tese não seria lícito, pois, pôr em dúvida a legitimidade do recurso pelo Estado à expropriação por utilidade pública com vista à realização do apontado fim
Nem, de resto, tal meio foi recusado ao Estado noutros países europeus que se lançaram decididamente na realização do emparcelamento.
Assim, na vizinha Espanha, além de outras hipóteses em que lhe é facultada a expropriação de terras (1), o Governo tem o direito de expropriar terrenos situados em zonas submetidas a emparcelamento, com área inferior à da unidade mínima de cultivo e que se adiem arrendados, a fim de serem incluídos na recomposição agrária a efectuar (v. artigo 39.º da lei de 10 de Agosto de 1954).
O mesmo acontece noutros países, tais como a Irlanda, a Dinamarca, a Holanda, a Alemanha, a Suécia, cujos Governos dispõem dos poderes necessários para o apontado fim.
Admitindo provisoriamente que seria de enveredar pelo caminho da expropriação com vista ao melhoramento das dimensões de unidades agrícolas insuficientes, que terras poderiam ser expropriadas?
A expropriação só deveria incidir, naturalmente, solíre aqueles terrenos que não desempenhando no interior do perímetro a emparcelar uma função útil, poderiam ser aplicados na constituição de unidades de cultura ou mesmo de explorações familiares que por toda a Europa se reconhece serem de alto rendimento económico-social. É o caso, por exemplo, de parcelas isoladas, por vezes encravadas, de área inferior à unidade de cultura, pertencentes a proprietários absentistas, muitos deles instalados no ultramar ou no estrangeiro em condições que contra-indicam o seu retorno.

73. Mesmo assim limitada a possibilidade de recurso à expropriação, predominou na Câmara Corporativa a opinião de que não se mostra aconselhável recorrer-se a ela.
As correcções a introduzir na estrutura agrária nacional não devem revestir o carácter de reformas agrárias susceptíveis de concitar a hostilidade daqueles proprietários que não desejam ser privados das pequenas courelas, por via de regra herdadas dos seus maiores, a que têm compreensível amor.
O proprietário absentista, instalado no País ou no estrangeiro, acalenta frequentemente o sonho de poder passar os últimos dias da vida no seu torrão natal. A sua pequena propriedade representa assim um vínculo que ele não veria, sem desgosto ou mesmo revolta, ser destruído. Esse proprietário (modesto operário, pequeno comerciante ou funcionário que se viu forçado a abandonar a sua terra) não é, muitas vezes, um desinteressado da pequena propriedade que teimou em conservar, por vezes com sacrifício, através da vida - como o revela a circunstância de ter renunciado a. aliená-la, não obstante o magro rendimento que normalmente dela aufere. Ora a necessidade de rodear a legislação sobre a reorganização agrária, de um adequado ambiente de compreensão e simpatia aconselha a

(1) A aplicação dos dois citados diplomas foi suspensa, porém, logo em 17 de Julho de 1778. E, porque jamais tal suspensão foi levantada, perdeu-se uma louvável iniciativa destinada a favorecer o emparcelamento da propriedade.

(1) V., por exemplo, os artigos 12.º, alínea c). 14.º o 38.º da lei de 10 de Agosto de 1955.