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16 DE DEZEMBRO DE 1963 467

mente prevêm a coordenação das respectivas exigências com os direitos da família do defunto, e que o Regulamento da Casa Mortuária do Hospital da Universidade de Coimbra regula o serviço do capelão do Hospital precisamente para o conciliar com as necessidades do estudo universitário.
Daquela outra característica dos direitos para com as pessoas, consistente em a natureza especial deles resultar de serem exercidos por meio de actos executados sobre o próprio ser humano, nem vale a pena falar-se é evidente que só assim podem exercer-se os direitos relativos ao cadáver. Todos os outros direitos que, tendo com aqueles alguma relação, não apresentem essa característica, referem-se directamente ao falecido, e não ao cadáver, como sucede, por exemplo, com o direito de defender a memória do morto.
Finalmente, é manifesto o carácter comunitário do tais direitos. Todos eles pertencera, tipicamente, à comunidade religiosa, ou b familiar, ou a civil, e todos têm em vista o bem comum respectivo. Mesmo os direitos que apresentam fins mais acentuadamente utilitários, como sejam os de investigação judiciária e os de investigação e ensino médicos, têm obviamente em vista o bem comum e só por ele são justificáveis, e é fácil de ver-se que não diferem essencialmente de direitos reconhecidos para com pessoas vivas, as investigações judiciárias são análogas aquelas a que os vivos são obrigados para o esclarecimento de suspeitas de crimes, e verificam-se muitas vezes como simples prolongamento delas, e por igual modo a investigação e o ensino médicos não diferem, na finalidade de interesse geral, daquela a que são submetidos os doentes internados em clínicas escolares - recorde-se, por exemplo, que os estatutos pombalinos da Universidade de Coimbra mandavam que o lente de Prática abrisse, na presença dos discípulos, os cadáveres das pessoas falecidas no Hospital, para averiguar a causa da morte e rectificar o juízo que fizera acerca da doença, a fim de proceder com mais acerto em casos semelhantes, e até aos médicos particulares impunha a assistência a esses estudos quando se tratasse de falecidos fora do hospital.
Em conclusão, podemos pois afirmar que os direitos mais comummente reconhecidos a respeito do cadáver têm natureza e configuração análogas às dos direitos in personam, circunstância pela qual se confirma inteiramente a nossa tese de que o cadáver não é tratado como coisa, mas sim como extensão ou acessório da pessoa

25. SÍNTESE DOS PRINCÍPIOS A QUE DEVEM OBEDECER OS DIREITOS SOBRE o CADÁVER - Examinadas as características dos direitos para com as pessoas, e concluído que o cadáver, assim na natureza como nos direitos a ele relativos, está sujeito a tratamento análogo ao das pessoas, como extensão delas que é, podemos agora fazer breve síntese dos princípios. A que devem obedecer esses direitos sobre o cadáver.
São eles.

a) Destinação a fins intrínsecos esses direitos só se justificam quando concedidos para fins intrínsecos, isto é, quando separada ou simultaneamente tenham fins cuja consecução é necessária para se realizar a personalidade do próprio sujeito passivo e fins cujo cumprimento é devido por esse sujeito passivo ao bem comum da comunidade a que ele pertence ou pertenceu, não são admissíveis, portanto, quando se destinem a proporcionar meras utilidades susceptíveis de serem atingidas por meios sujeitos ao domínio do homem (por exemplo, a colheita de matérias-primas destinadas à indústria) ou tenham fins imorais ou fúteis (por exemplo, aproveitamentos contrários a dignidade e ao pudor ou determinados por mero interesse estético). !») Especificidade. esses direitos devem ser estritamente delimitados pelo fim a que se destinam e só no âmbito deste têm justificação.
c) Ausência de domínio como corolário dos princípios anteriores, o cadáver não pode ser objecto de domínio ou propriedade plena, ao contrário do que acontece com as coisas, as quais estão normalmente afectas, na generalidade das suas utilidades efectivas ou potenciais, aos fins de pessoas determinadas, ninguém, nem mesmo o Estado ou a família, pode, por conseguinte, arrogar-se a «propriedade» do cadáver.
d) Extra comercialidade outro corolário dos princípios anteriores é a impossibilidade de o cadáver ser objecto de comércio, não por ser coisa fora do comercio, mas precisamente por nem sequer sor coisa, nem poder ser objecto do domínio; encontram-se por vezes excepções a este princípio, o que tem feito hesitar a doutrina sobre a natureza jurídica do cadáver, mas, conhecida a identidade profunda entre os direitos sobre este e os direitos para com pessoas, fácil é ver-se que essas excepções (por exemplo, a cessão do cadáver para aproveitamentos terapêuticos ou científicos), tal como a dação de sangue ou leite em vida do dador, representam uma forma de colaboração de uma pessoa, como tal, com outra pessoa, e, portanto, não a disposição de uma coisa, mas sim uma prestação, um serviço susceptível até de ser remunerado, da mesma forma que a cessão, mesmo onerosa, da simples energia muscular do homem constitui um serviço, embora, de um ponto de vista materialista, essa energia pudesse equiparar-se à de um animal ou de uma máquina - em todos estes casos a eventual remuneração não representa o preço de uma coisa, mas a retribuição de um serviço, em cuja apreciação pesam acima de tudo aspectos pessoais.
c) Independência, em princípio, dos vários direitos que recaiam no cadáver sendo coda um deles destinado a fins específicos e a eles limitado, e não podendo existir domínio sobre o cadáver, do qual os demais direitos sejam desmembramento ou oneração, cada um desses direitos aparece, em princípio, independente dos outros
f) Necessidade de hierarquização e coordenação em concreto precisamente porque esses direitos são em princípio independentes uns dos outros, eles têm de ser hierarquizados e coordenados em concreto - todos se dirigem, por hipótese, a fins intrínsecos, mas estes podem ter valor desigual e, mesmo quando de valor inferior ao de outros, podem merecer, em concreto, maior protecção do que outros ou reclamar um mínimo de protecção que satisfaça ao respeito que lhes é devido, daí a necessidade de o regime jurídico do cadáver ter consciência da hierarquia desses fins e de procurar conciliá-los pela melhor forma possível.
g) Subordinação genérica ao respeito devido à pessoa e a outros fins intrínsecos, não basta conciliar-se esses direitos uns com os outros, nem sequer reconhecer-se que o âmbito de cada um deles é