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16 DE DEZEMBRO DE 1963 477

(...)certo se refere à investigação em geral e não à respeitante às técnicas de enxerto. Por seu lado, o artigo 2.º prevê, também simplesmente, a investigação como objectivo da colheita, em absoluto contraste com o artigo 8.º, que, provendo à hipótese de não ter havido autorização para a recolha, por parte de pessoas falecidas em clínicas e institutos universitários, nas instalações não particulares dos hospitais ou em quaisquer estabelecimentos oficiais de assistência, permite a colheita de tecidos ou órgãos, nas condições aí fixadas, apenas para fins terapêuticos.
O contraste verificado entre os artigos 2.º e 3.º, observável já no anteprojecto, deve ser intencional e representa a orientação de restringir as colheitas destinadas a fins científicos aos casos em que o próprio falecido as tenha autorizado.
Diversa parece ser a significação das outras divergências apontadas, nas quais não pode deixar de ver-se certa contradição. Assim, o § 1.º do artigo 1.º exceptua do disposto no corpo desse artigo, para o efeito de as proibir, as colheitas de tecidos e órgãos quando a morte for devida, entre outras hipóteses, a doença infecto-contagiosa, e o § 2.º, como excepção a tal proibição, admite-a para fins de investigação científica, tratando-se, pois, de uma excepção à excepção, parece que o § 2.º pressupõe a regra de as colheitas serem permitidas para quaisquer fins de investigação. Pelo contrário, o corpo desse artigo 1.º admite-as apenas para fins de investigação relacionada com as técnicas de enxerto, e consagra portanto um princípio mais limitado, em regra, do que aquele que se acha implícito no § 2.º.
Consultando-se as fontes do projecto, verifica-se que, na realidade, esta contradição resulta de duas interpolações que, ditadas ambas pelo mesmo intuito - o de ressalvar as colheitas destinadas a fins de investigação -, em conjunto alteraram efectivamente o sentido literal daquele artigo 1.º
Na redacção primitiva, esta disposição referia-se genericamente a «colheitas ... de tecidos ou órgãos que forem considerados necessários para fins terapêuticos ou de investigação científica e que tenham de efectuar-se nas doze horas seguintes ao óbito», e o artigo continha apenas um § único, no qual se proibiam, como hoje no § 1.º, as colheitas no corpo de pessoas falecidas em certas circunstâncias, entre as quais se mencionava o caso das doenças infecto-contagiosas.
Apreciando esse anteprojecto, o Instituto Maternal transcreve o parecer do respectivo médico anátomo-patologista, no qual se fazem sérias reservas sobre as repercussões que ele poderia ter acerca da investigação científica de rotina, e sugeria, até, a introdução de um preceito destinado a obviar às deficiências por ele apontadas (ofício de 26 de Agosto de ]960, referência n.º 7360). O Gabinete do Ministro da Saúde e Assistência declarou, contudo, não ser possível tomarem-se em consideração essas sugestões «por se entender que as mesmas respeitam mais directamente ao diploma, neste momento em preparação, sobre a regulamentação das autópsias» (ofício n º 1819, de 16 de Setembro de 1960).
Outra sorte tiveram os reparos, feitos a respeito do mesmo assunto, das Faculdades de Medicina de Lisboa e do Porto.
A primeira, em parecer datado de 27 de Agosto de 1960, depois de apontar a escassez do lapso de doze horas subsequentes ao óbito, previsto nesse artigo 1.º, produz as considerações que a seguir se transcrevem.

Esta Faculdade lastima que, apesar de no artigo 1.º se fazer referência a fins de investigação científica, todo o projecto tenha sido elaborado no sentido da utilização dos tecidos dos cadáveres humanos para fins terapêuticos.
O artigo 8.º é uma prova desta animação. Por ele se exclui explicitamente a autópsia dos elementos de investigação possíveis ao abrigo do decreto em projecto. A investigação científica, a que se alude incidentalmente no artigo 1.º, pode carecer de autópsia integral antes de doze horas ou, pelo menos, da franca abertura de uma cavidade visceral ou da cavidade craniana.
A esta Faculdade parece, por isso, que o decreto, mesmo com menor número de pormenores, poderia ter uma projecção científica mais lata e servir a ambos os fins citados no corpo do artigo 1.º
É evidente que todos estes comentários, contidos em 4), deixam de ter significação se o artigo 1.º do decreto não fizer referência a fins de investigação científica ou explicitamente se referir a investigação ligada a técnica de enxertos de tecidos humanos.

Por seu lado, no parecer da Faculdade de Medicina do Porto, comunicado ao Gabinete do Ministro da Saúde e Assistência por ofício de 11 de Agosto de 1960, liv. 2-E, n.º 283/60, e elaborado pelo respectivo professor de Oftalmologia, o Prof. Doutor Manuel da Silva Pinto, lêem-se as seguintes considerações.

De acordo com a opinião da Faculdade, continuo convencido do alto interesse científico e didáctico da autópsia clínica, realizada durante o período das 24 horas que se seguem ao óbito dos indivíduos falecidos nos hospitais escolares, cujos cadáveres, pela força do imperativo da lei, não tenham que sofrer autópsias judiciais. Penso, por isso, que o presente diploma legal deveria conter disposições que cedo ou tarde tornassem possível a efectivação das mencionadas autópsias.

E, mais adiante, com referência ao § único do artigo 1.º do anteprojecto, diz-se:
Embora se justifique a proibição das colheitas nos outros casos referenciados, não se compreende a razão por que se proíbe essa colheita em cadáveres de pessoas falecidas por doença infecto-contagiosa.
Com efeito, se o material colhido, como sempre ou quase sempre há-de suceder, não serve para fins terapêuticos, pode tornar-se da mais alta importância para a investigação científica, prevista e consentida no corpo do mesmo artigo.
Como se depreende dos ofícios do Gabinete do Ministro da Saúde e Assistência, respectivamente n.ºs 1822/60 e 1824/60, ambos datados de 16 de Setembro de 1960, os sugestões das duas Faculdades foram atendidas na redacção definitiva do projecto a da primeira pela introdução no corpo do artigo 1.º do inciso «ligada às técnicas de enxerto de tecidos humanos» e a da segunda pela introdução do actual § 2.º do mesmo artigo 1.º
Acontece, todavia, que, tomadas em conjunto, as duas modificações foram contraproducentes. É óbvio que ambas as Faculdades tinham em vista ressalvar a colheita de tecidos e órgãos para fins científicos. Simplesmente, enquanto a Faculdade de Medicina do Porto sugeriu uma excepção directa, a respeito das doenças infecto-contagiosas, a de Lisboa propôs, em alternativa, ou a exclusão de qualquer referência a fins de investigação (evidente-(...)