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488 ACTAS DA CÂMARA CORPORATIVA N.º 51

mérito da harmonia e coerência e assegura, em todos os casos, a subordinação destas operações ao bem comum e à superintendência das entidades especialmente incumbidas de velar por ele nesta matéria.

42. EXECUÇÃO DA COLHEITA - Nesta rubrica podem compreender-se os artigos 13.º e 14.º do texto sugerido, correspondentes aos artigos 8.º e 9.º do projecto.
A doutrina dos dois textos é sensivelmente idêntica e não necessita de justificação pormenorizada.
Cumpre salientar-se, no entanto, que no artigo 13.º do texto sugerido se procurou acentuar a necessidade de as colheitas serem executadas com o respeito devido ao cadáver, querendo-se, com tal exigência, não propriamente limitar as colheitas, mas sim regular-se o modo de as efectuar, trata-se, portanto, de afloramento de uma regra geral, aplicável a todas as intervenções em cadáveres, mas que não deixa de ser oportuno recordar-se aqui.
Para dar satisfação a observações das Faculdades de Medicina de Lisboa e do Porto que pareceram justificados procurou-se também, ao enunciarem-se as limitações impostas na execução das colheitas, esclarecer expressamente que estas podem abranger as mutilações ou dissecações necessárias para verificações indispensáveis à utilização dos tecidos ou órgãos recolhidos.
Finalmente, no § único do mesmo artigo 13.º estabeleceu-se que os elementos de prótese, que poderão usar-se para recompor os cadáveres, devem, em princípio, ser constituídos por matéria consumível conjuntamente com os tecidos do corpo Sabe-se que na prática já tem acontecido que, ao recolher-se a ossada de uma- pessoa falecida anos antes, só encontram, por exemplo, as órbitas preenchidas por olhos de vidro, a surpresa causada por um facto deste género é, necessariamente, muito chocante e dolorosa para a família do defunto, e, estamos certos, não é tecnicamente difícil evitá-la pelo processo que sugerimos e nos parece imposto pela deferência devida à piedade familiar.

43. UTILIZAÇÃO DOS TECIDOS OU ÓRGÃOS RECOLHIDOS - A matéria compreendida nesta rubrica encontra-se regulada, um pouco superficial e dispersamente, nos artigos 10.º e 12.º do projecto, aos quais correspondem os artigos 15.º a 18.º do texto proposto por esta Câmara.
Os princípios estabelecidos nestes últimos preceitos inspiram-se directamente nas disposições do projecto, mas procuram clarificá-las e pô-las de acordo com os princípios fundamentais fixados nos artigos 1.º a 3.º do texto sugerido.
Assim, o artigo 15.º, relativo à requisição de órgãos ou tecidos recolhidos, refere-se apenas aos bancos, e não também aos estabelecimentos onde for executada a colheita, como faz o artigo 10.º do projecto, porque os órgãos recolhidos ou se destinam a aplicação imediata, e não podem ser requisitados por entidades diferentes daquelas que efectuaram a colheita, ou hão-de estar conservados em bancos, e só a estes podem ser solicitados. Também se prevê a requisição para os fins do artigo 1.º, e não apenas para fins terapêuticos, como se lia no artigo 10.º do projecto.
No § 1.º do artigo 15.º do texto sugerido comete-se aos directores dos bancos a satisfação das requisições pela ordem e na quantidade que parecerem equitativas em função do fim a que se destinam os órgãos ou tecidos recolhidos. E um princípio paralelo ao que se estabelece na parte final do § 2.º do artigo 3.º a respeito das próprias colheitas, e constitui mais uma manifestação de que estas intervenções, mesmo quando efectuadas por entidades particulares, são dominadas pelo bem comum.
O § 2.º do artigo 15.º regula a responsabilidade pecuniária pelas despesas da colheita, conservação e distribuição dos órgãos e tecidos recolhidos, em termos semelhantes uns do artigo 10.º do projecto, mas subordinando-se essa responsabilidade a tabelas aprovadas pelo Ministério competente.
No artigo 16.º do texto sugerido regula-se aquela «responsabilidade» dos médicos a que se refere a parte final do artigo 10.º do projecto e que, neste, não se apreende bem se é responsabilidade técnica ou, antes, responsabilidade pecuniária, como acontece no artigo 12.º do projecto. Esclarece-se expressamente que se trata de responsabilidade técnica, e discriminam-se as hipóteses de recolhas efectuadas para aplicação directa e de os tecidos ou órgãos serem requisitados a bancos.
No artigo 17.º estatui-se a regra de sigilo a respeito do destino dos órgãos ou tecidos recolhidos, assim como da respectiva origem, regra essa já justificada na parte final do n.º 37 deste parecer.
O artigo 18.º completa este grupo de disposições, regulando o reembolso, em favor dos médicos de clínica particular, das despesas de colheita, conservação e distribuição, sujeitando-o a tabelas aprovadas pelo Ministro da Saúde e Assistência e exigindo-se que o pagamento se faça mediante nota especificada, visada pelo director do respectivo centro de colheita, assim se procurou evitar abusos ou suspeitas desprestigiantes, fáceis de surgir nesta matéria. Este preceito corresponde ao artigo 12.º do projecto, mas, na redacção dele, fugiu-se a fazer referência ao local da aplicação, nomeadamente ao domicílio, onde parece bastante difícil fazer-se a utilização de enxertos.

44. RESPONSABILIDADE E PENAS - A matéria desta última rubrica acha-se compendiada nos artigos 19.º e 20.º do texto sugerido e corresponde ao disposto no artigo 13.º do projecto.
Neste último preceitua-se que «todas as colheitas praticadas em contravenção do disposto neste diploma sujeitam os infractores às penas e demais responsabilidades estabelecidas para as autópsias realizadas ilegalmente». Esta disposição é também aplicável, por força do § 4.º do artigo 2.º, àqueles que não proporcionem às pessoas que pretendam deduzir oposição à colheita o acesso imediato às entidades a quem se devem dirigir para esse efeito.
Estes preceitos não parecem satisfatórios a esta Câmara.
Antes de mais, é muito vaga aquela referência às «penas e demais responsabilidades estabelecidas para as autópsias realizadas ilegalmente». É possível que o projecto tivesse em vista as disposições que certamente deverão constar de um futuro diploma regulador das autópsias e a cuja próxima publicação se alude em diversos trabalhos preparatórios do projecto. A verdade é, porém, que o que conta são as disposições ora vigentes e, de entre elas, só o artigo 247.º, § 2.º, do Código Penal parece susceptível de incriminar as autópsias ilegais, alias por modo indirecto, pois o que nele se pune são, propriamente, os factos directamente tendentes a quebrantar o respeito devido à memória do morto ou dos mortos, sem violação de túmulo ou de sepultura, é, portanto, um preceito de aplicabilidade duvidosa e cuja interpretação tem, para mais, suscitado divergências na doutrina e na jurisprudência (130).
Por outro lado, é óbvio que «as colheitas praticadas em contravenção do disposto» no diploma em estudo são sus-(...)

(130) Sobre esta questão veja-se o citado parecer n.º 59/59, de 9 de Junho de 1960, da Procuradoria-Geral da República, no Boletim do Ministério da Justiça
n.º 105, de Abril de 1961, pp. 401 e segs.