O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

632 ACTAS DA CÂMARA CORPORATIVA

uma válida repressão criminal, e que ofereça rigorosas garantias de validade e justificação concreta.
Sendo essencialmente excepcional, a prisão preventiva só há-de admitir-se nos casos em que expressa e formalmente venha a ser prevista na lei (em execução, tanto quanto possível vinculada, de uma directriz ou de um preceito constitucional), podendo-se, deste modo, falar aqui de um princípio da legalidade da prisão preventiva.
O legislador ordinário deve regular o assunto de harmonia com o que se pode designar o princípio da subsidariedade, decorrente, de resto, do carácter ou essência excepcional da prisão preventiva. Desse princípio resulta que a prisão preventiva não deverá ser admitida quando puder ser substituída, sem inconvenientes para a prossecução do interesse social atrás enunciado, por providências não detentivas. Não desconhece o nosso direito processual criminal vigente algumas dessas providências, e outras poderão vir a ser criadas. O citado princípio da subsidiariedade da prisão preventiva justifica ainda que, independe, temente de ser ou não substituível por outras providências, ela seja excluída se concretas circunstâncias particulares do acto ou do agente o justificarem (pense-se no que já hoje prescreve, por exemplo, o artigo 293.° do Código de Processo Penal, e pense-se em situações particulares de idade, de saúde e outras).
A admissibilidade da prisão preventiva - deriva isso, ainda, do seu carácter excepcional - deve estar dependente de pressupostos legais objectivos (podendo falar-se, também a este propósito, de um princípio da tipicidade). Ora pode dizer-se que hoje em dia são três os tipos de pressupostos da prisão preventiva que se exigem nas leis. Exige-se, em primeiro lugar, um fundado juízo de imputação do acto ao agente, ante o qual, razoável e objectivamente, ele se possa ter por sujeito de autoria e culpabilidade criminais. Em segundo lugar, não é aceitável a prisão se o delito não tiver uma certa gravidade. Por último, em alternativa ou em cumulação com o anterior tipo de pressuposto, aceita-se ainda a prisão preventiva com o fundamento num interesse processual.
A prisão preventiva em flagrante delito justifica-se ante o primeiro tipo de pressupostos, sendo o segundo tipo irrelevante. Fora de flagrante delito, a prisão preventiva há-de justificar-se ante os três tipos de pressupostos indicados: requer-se uma farte suspeita da prática do crime; a infracção há-de ter uma certo gravidade (segundo a proposta, há-de tratar-se de um crime doloso e há-de corresponder-lhe uma pena de prisão superior a um amo ou tratar-se de caso em que seja aplicável medida de segurança privativa da liberdade); e, por último, impõe-se que subsista um interesse processual.
Nada há, naturalmente, a objectar quanto ao que na proposta de lei se estabelece sobre a legitimidade da prisão preventiva, quando há culpa formada. Verificados os demais pressupostos, a prisão preventiva justifica-se porque a autoria e a culpabilidade do agente se mostram então fortemente indiciadas em factos e circunstâncias concretas. Houve uma instrução processuamente conduzida, portanto com garantias de objectividade e contrôle.
Mas a proposta admite também a prisão sem culpa formada, "havendo forte suspeita dai prática do crime" - e nem se concebe que a não admitisse, dado que a imperatividade e o relevo do interesse social criminal não dispensam essa modalidade da prisão preventiva. A prisão preventiva sem culpa formada é, afinal, no plano do direito comparado, como que o tipo normal da prisão preventiva. De qualquer modo, à prisão sem culpa formada, que passou a ser a regra, não é possível deixar de rodeá-la de garantias de objectividade, de averiguação, de fundamentação e de juízo. Sobre este ponto se porém, a propósito do parágrafo seguinte.

49. Tudo considerado, a Câmara recomenda a adopção do texto proposto pelo Governo para este parágrafo.

Artigo 8.°, § 4.º

50. No parágrafo anterior alude-se aos pressupostos objectivos da prisão preventiva. No parágrafo ora sob análise alude-se às garantias.
O chamado "princípio do título" exige que ninguém possa ser preso preventivamente sem fundamento num mandado ou ordem escrita de autoridade competente de que constem razões legais e factuais justificativas da prisão.
A este princípio admitem-se na legislação comparada excepções só em casos muito particulares, o mais característico dos quais é o "flagrante delito". Nas legislações estrangeiras apontam-se outras excepções, como a "detenção de urgência", a "detenção de segurança" e a "averiguação preliminar", sujeitas a regimes muito especiais.
A proposta subscreve claramente o princípio referido, com a excepção comum e compreensível do flagrante delito. Apenas parece desejável que se analise a genérica referência aos "motivos", exigindo-se tanto a imputação do acto a um delito legal como a enunciação dos factos ou circunstâncias em que se funda a suspeita do seu cometimento. Assim se evitará que se tenham por suficientemente motivadas ordens de prisão que se limitam a referir a autoria ou a suspeita da autoria de um delito, individualizado apenas pela respectiva categoria abstracta ou designação legal.
É sem dúvida da maior importância, em segundo lugar, fixar quais as autoridades competentes para ordenar a prisão preventiva. A proposta de lei não sugere para este problema solução diferente da que se prescreve na actual redacção do § 4.° Efectivamente, tanto vale dizer-se que a prisão poderá ser ordenada pela "autoridade competente" (segundo a lei ordinária) como dizer-se que o poderá ser por ordem "de autoridade judicial ou de outras autoridades expressamente indicadas na lei".
A necessidade de admitir que outras, que não apenas a autoridade judicial, possam ordenar a prisão preventiva resulta especialmente de se não preverem providências sucedâneas dessa que dispensem o mandato judicial, especialmente no domínio dos delitos que atentem contra a segurança e a ordem pública.
Parece, porém, que este desvio ao princípio de que tão importante restrição à liberdade individual antes do julgamento cabe às autoridades judiciais há-de ter uma contrapartida no plano das garantias. Se as autoridades não judiciais podem ordenar por escrito a prisão preventiva fona dos casos de flagrante delito, hão-de essas prisões ser sujeitas a uma reapreciação, a um controle tanto quanto possível exercido por autoridades independentes e distintas das que podem decretar a prisão. Os desvios de uma tal directriz só podem conceber-se como excepcionais ante muito sérias razões, todas referidas a impreteríveis exigências processuais, no específico domínio de segurança e de ordem pública.
Aliás, afigura-se à Câmara que uma reapreciação (jurisdicional) da ordem de prisão preventiva da própria autoridade judicial não é menos necessária; pode o interrogatório preliminar do preso ser suficiente para infirmar os fundamentos que haviam justificado a inicial ordem de prisão, dada por um juiz.