16 DE MARÇO DE 1971 647
mara, porém, não esconde que um decreto-lei poderá, assim, ser produto da vontade de apenas a maioria dos componentes do Governo, presentes em Conselho de Ministros, e que, assim, desaparece o poder que cada Ministro tinha de, envolvendo nisso a sua responsabilidade política, vetar os projectos de decretos-leis. E talvez que o novo sistema seja, até por isso, superior ao anterior.
99. O novo regime é agora estendido aos "decretos que aprovem tratados internacionais que versem matéria legislativa". A proposta requer a forma clássica do tratado pura as convenções internacionais que versem matéria legislativa - mas não exige que, para serem ratificados pelo Chefe do Estado, esses tratados sejam previamente aprovados pela Assembleia Nacional, contentando-se, em relação a eles, com a aprovação do Governo (proposta, artigo 109.°, n.° 2.°).
Tem sido prática corrente que a aprovação dos tratados internacionais para ratificação, por parte do Governo (nos termos do actual artigo 109.°, n.° 2), assuma a forma da decreto-lei. A Constituição, porém, nada diz a este respeito. Fala-se agora em decreto, como sendo a forma que revestirá essa aprovação (proposta, artigos 82.°, § 2.°, e 109.°, § 4.°). A proposta no seu articulado não lhe chama decreto-lei; submete-o às mesmas normas em matéria de referenda (proposta, artigo 82.°, § 2.°), mas já não, pelo menos explicitamente, em matéria de promulgação e publicação (proposta, artigo 81.°, n.° 9.°). Afigura-se, entretanto, à Câmara, que tais decretos derem ter um regime idêntico ao dos decretos-leis. No relatório da proposta pressupõe-se que, na generalidade dos casos, esses decretos suo votados em Conselho de Ministros ou então assinados por todos os Ministros, que é justamente o que sucede com os decretos-leis.
100. Uma última observação sobre este parágrafo. Poderá dizer-se que ê tecnicamente deficiente a formulação deste preceito, enquanto se fala na referenda de actos do Governo, que outra coisa não são os decretos a que aí se faz alusão. Teremos, assim, o Governo a subordinar a existência jurídica de actos da sua autoria -os decretos- à prática de um outro acto, igualmente da sua autoria - a referenda. A formulação correcta será aquela em que o acto que se apresenta como carecido de referenda do Governo é um acto da competência do Presidente da República, já que este, como o rei de Inglaterra, can not act alone: o acto de promulgação dos decretos.
Uns tantos Procuradores, em minoria, entendem que não vale a pena alterar o texto proposto. Basta lembrar que não será a primeira vez que o legislador constituinte consagrará este erro técnico: podemos surpreendê-lo, hoje mesmo, pelo menos, no § 1.° do artigo 150.º da Constituição. E o Governo retoma-o, mais uma vez, na redacção que propõe para o § 2.° do artigo 136.°
Mas a maioria da Câmara entende que se deve dar ao preceito, neste ponto, uma formulação correcta.
101. Deverá substituir-se a redacção proposta pela seguinte:
Deve ser referendada por todos os Ministros a promulgação dos decretos-leis e a dos de aprovação de tratados internacionais que versem matéria legislativa, quando vão tiverem sido aprovados em Conselho de Ministros.
Artigo 82.°, § 3.°
102. Trata-se de consagrar explicitamente a prática que, na matéria, vem sendo de há muito seguida e que já o fora, por último, na lei ordinária (Decreto-Lei n.° 48 620, cit., artigo 1.°, n.° 2) - o que não merece objecção.
Artigo 85.° (corpo do artigo)
103. A alteração que se propõe diz exclusivamente respeito ao número dos Deputados, componentes da Assembleia Nacional. Esse número foi inicialmente de 90, passando para 120 em 1945 e para 130 em 1951.
A justificação apresentada pelo Governo para esta proposta de alteração traduz-se em sublinhar que assim se permitirá uma representação mais justa das províncias ultramarinas e de certos círculos metropolitanos.
E, efectivamente, não restam dúvidas, pelo que diz respeito àquelas, de que, em especial Angola e Moçambique, elegem, segundo a lei em vigor, um número de Deputados à Assembleia Nacional em que, de modo nenhum, há equiparação, considerados a sua população, a sua área e o seu desenvolvimento, aos outros círculos, designadamente aos círculos eleitorais metropolitanos 17.
Acresce que, como aumento previsto de componentes da Assembleia Nacional, não se transcende-o nível quantitativo que se pode considerar mais conveniente para que o Parlamento não deixe de ser um colégio adequado ao desempenho das suas atribuições, no âmbito das estruturas constitucionais consagradas entre nós e do espírito que as domina ou inspira - um espírito que não se compadece com um areópago muito numeroso, dividido pelas paixões e pelo tumulto.
A alteração proposta comportará ainda a vantagem de facultar o acesso à Assembleia Nacional de um número mais elevado de colaboradores na discussão dos grandes problemas nacionais, de pessoas que, em cada momento, são politicamente mais representativas nos vários círculos e aspiram naturalmente a poder candidatar-se.
Também não é de desprezar, como justificação para o apoio que esta Câmara dá à proposta neste ponto, que o acréscimo do número dos Deputados irá naturalmente elevar o quorum e aumentar o número das presenças em cada reunião - factor que não deixará de concorrer para o prestígio da Assembleia Nacional e para o avigoramento do valor representativo das suas tomadas de posição.
De qualquer modo, este número de 150 Deputados não se afasta consideràvelmente, para mais ou para menos, dos que, pelas leis anteriores a 1933, foram previstos para os órgãos parlamentares correspondentes a Assembleia Nacional. Bastará recordar que, pela Lei Eleitoral de 3 de Julho de 1913, a Câmara dos Deputados era composta por 163 Deputados.
O aumento dos Deputados que compõem a Assembleia Nacional não suscitará a necessidade de eleição suplementar. Os vinte Deputados previstos a mais mão resultam de vagas que tenham ocorrido na Assembleia Nacional - pelo que se não põe o problema de, conforme o § 3.° do artigo 85.°, fazer funcionar o mecanismo dessa eleição. É neste sentido que este parágrafo se mostra interpretado pelo § 3.° do artigo 1.° do Regimento da Assembleia Nacional: as únicas condições tem que, segundo este preceito, haverá eleição suplementar são as de haiver um certo número de vagas (superior a vinte, nos termos do artigo 2.° do Decreto-Lei n.° 37 570, de 3 de Outubro de 1949)
17 Segundo o artigo 1.° do Decreto-Lei n.° 43 901, de 8 de Setembro de 1961, os círculos de Angola e Moçambique elegem cada um sete Deputados, mais, um apenas do que os que elegem os círculos de Aveiro, Braga, Coimbra, Leiria, Santarém e Viseu, e menos cinco e menos três do que os que elegem, respectivamente, os de Lisboa e do Porto - isto só para referir as anomalias mais gritantes.