16 DE NOVEMBRO DE 1971 977
apenas a verificação dos requisitos indispensáveis à sua existência concretizada através da aprovação dos estatutos ou regulamentos.
A fl. 372 do Manual de Direito Administrativo, escreveu o Sr. Prof. Doutor Marcelo Caetano:
Enquanto nas corporações económicas os organismos primários têm já carácter representativo de profissões ou de categorias (os grémios, os sindicatos, as Casas do Povo ou dos Pescadores), nas corporações morais e culturais não sucede assim: as associações ou instituições que as compõem não são de per si representativas, são meras associações de utilidade pública agremiando facultativamente núcleos de indivíduos, e só as corporações representam toda a actividade social desenvolvida pelos seus membros.
9 Concluídos os relevantes trabalhos do último período legislativo, outros vão iniciar-se num ritmo que não permite interrupções. A Câmara Corporativa, sob a alta orientação do seu Presidente, uma vez mais irá corresponder, na medida do que lhe couber, ao instante estorço que de todos se reclama nesta era renovada de reconstrução nacional.
O Sr. Henrique Martins de Carvalho: - 1. Cada geração vê apenas um estreito fragmento da história e humanamente tende a considerar o futuro através das suas preocupações do presente. Quando a perspectiva do tempo se confina a um período muito curto, ainda mais difícil se torna examinar, a uma óptica objectiva, a evolução de um país: só nos rápidos da vida individual ou colectiva um ano ou dois podem constituir mais do que um simples período de transição. Olhando-o, logo os homens de formação progressista o consideram tímido e desencorajador, frente à imensidade e à premência dos desafios contemporâneos, tal como os mais conservadores, e exactamente pelas mesmas razões, lhe chamam apressado e cheio de perigos para a Nação. Uns e outros medem-no afinal pelos seus interesses ou desejos pessoais, e não pelos objectivos e pelo alcance das medidas que durante ele foi julgado possível e oportuno tomar.
Crise é às vezes o rótulo aposto por uma geração à sua época, na crença ingénua de os pais e os avós só haverem conhecido felicidade e bem-estar. E o encadeamento dessas pretensas crises, de que a epistemologia da cultura sucessivamente nos dá consciência, confunde-se com o próprio evoluir da Humanidade no caminho de se realizar e redimir. Pela aceleração assimétrica dos desenvolvimentos produzidos, o drama da nossa idade é em grande parte a consequência do conflito, não raro violento, entre estruturas económico-sociais que já são do século XXI, e soluções políticas - a democracia e o socialismo - muito ligadas à problemática do século XIX. Por isso o Pe. Teilhard de Chardin argutamente comentava, que, na sociedade que se avizinha, provável será vermos convergir três tensões principais: o liberalismo, com o seu culto dos direitos fundamentais e a garantia da respectiva aplicação em concreto; o marxismo, com o reconhecimento da importância excepcional das forças económicas em movimento, e o fascismo, com o sentido do valor político das minorias actuantes. E de tudo isto resulta para o Mundo, necessàriamente, um período geral de acentuada e rápida evolução, com a correspondente alteração ou ruptura dos hábitos e estruturas tradicionais.
Muitos se comprazem em apontar os males do nosso tempo. Por mim, confesso que o admiro apaixonadamente: nele o direito ao trabalho e o direito à saúde, tal como a luta contra a fome ou contra o medo e a promoção cultural e social das populações em conjunto, saíram de um simples "elitismo" e entraram nos desígnios expressos e nos programas da política, e da administração. Em consequência, estes objectivos, igualmente válidos perante Deus e perante os homens, passaram a integrar-se no quadro normal das preocupações dos governos, não como utopias longínquas ou mera pregação de teólogos e de moralistas, mas como linhas de força e compromissos de acção para quem aspira por transformar a própria época porque, efectiva e intensamente, a deseja poder viver.
O pensamento carece de cronologias para melhor se balizar. Sem me atrever a antecipar o julgamento do futuro, creio que 1970 será marcado pela morte de quem foi sem dúvida a primeira figura da geração que nos antecedeu. Convidado, como aliás muitos outras pessoas, a fazer um depoimento a seu respeito, comecei por dizer:
Durante alguns anos colaborador de governos presididos pelo Prof. Oliveira Salazar, nunca então fiz o seu elogio. E sabe-se que, tanto antes como depois, divergi com frequência dos seus critérios e discordei das suas decisões.
Tentei depois uma breve análise dessa personalidade riquíssima, e concluí:
Pense-se que o que se pensar da sua obra, não é possível invocar este homem sem que ressoem na nossa memória as grandes frases dos grandes escritores clássicos. Sim, por que foi tal a força da sua personalidade, nos sectores fundamentais da nossa vida colectiva, que "até os olhos que dele fogem o encontram per toda a parte". Quaisquer que hajam sido os seus defeitos, sempre sobre a minha geração se projecta o seu vulto enorme. E sempre Salazar, deslumbrante ou sombrio, no limiar de todo um século está de pé.
Desaparecido da vida política alguém dessa envergadura, os anos subsequentes - em qualquer país - seriam necessàriamente de transição. Mais acentuada, ainda, quando essa fosse também a situação geral. Por isso, não deve surpreender-nos quanto se está passando entre nós. Antes devemos ser capazes de serenamente o escolher para objecto de reflexão.
2. Tem esta Câmara uma composição por idades que não acompanha a da sociedade circundante. Decerto se trata de uma circunstância inevitável, que até lhe aumenta os conhecimentos e a experiência; mas não deixa de a afastar - pelas leis inelutáveis da vida - do conhecimento directo dos movimentos etários mais jovens e das correspondentes aspirações. E, por outro lado, a própria representatividade liga-a a muitos sectores do establishment. Por uma razão ou por outra, o mesmo acontece a todas as câmaras, em todos os momentos ou países. Porém, isso não constitui motivo para se desconhecerem os factos: importa apenas entrar com eles em conta, na autocrítica das nossas próprias opiniões.
Ora, se nos situarmos no momento logo anterior ao actual, e sejam quais forem as opiniões pessoalmente perfilhadas, recordar-nos-emos de que existia uma grande preocupação e se sentiam fortemente várias solicitações generalizadas. A grande preocupação relacionava-se com as condições de paz pública em que se processaria a mudança previsível para breve. As solicitações centravam-se - pelo menos para largos estratos do escol e da opinião pública - em desejos fáceis de sintetizar: maior aceleração do ritmo de crescimento e melhor distribuição per capita do produto nacional; mais agilidade e eficiência no equacionamento e execução das respostas da